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Com apenas 26 anos, benzedeira quer estimular outros jovens à prática

Véia do Patuá elabora “jornada para resgatar saberes ancestrais, potencializar rezas e o bendizer”

Leonardo Sá

Quando se pensa em benzedeiras, normalmente vem à mente a imagem de uma mulher mais velha. A dificuldade de encontrar jovens, de fato, é uma realidade, tanto que, ao procurá-las para esta matéria, Século Diário encontrou somente uma, Yasmin Ferreira, também conhecida como Véia do Patuá. Ela, não em vão, tem se empenhado em engajar a juventude nessa prática, para que a tradição permaneça firme e forte no Espírito Santo.

Com 26 anos de idade, Véia do Patuá realiza grupos de meditação abertos ao público, nos quais auxilia as pessoas a buscarem “autoconhecimento, se curar”. O autoconhecimento, defende, é necessário para se tornar “ferramenta de cura para a sociedade de forma ampla, mudar a vibração de uma sociedade doente, marcada pela ansiedade, depressão e crise de pânico, necessitando do aumento do poder de cura coletivo das pessoas”. 

É nesses espaços de meditação, que ela almeja encontrar jovens para participar de um grupo que pretende formar até julho, quando acontecerá “uma jornada para vivenciar o resgate dos saberes ancestrais, potencializar rezas e atividade do bendizer”, explica.

Leonardo Sá

Véia do Patuá detalha que benzimento “são palavras que saem da boca consagrada da benzedeira, que manipula a energia do universo, do fogo, da terra, do ar, da água; um canal, uma ponte entre o plano físico e o espiritual. É o poder da palavra que sai do coração, a chave para se comunicar com a espiritualidade, auxiliando o outro a passar pelos desafios da vida”.

O grupo de meditação acontece todas segundas e quartas, às 19h, no Estúdio Corpo e Mente Sã, em Vale Encantado, Vila Velha. Véia do Patuá afirma que viu nessa atividade uma forma de manter viva a tradição do benzimento por ser um espaço que está sendo procurado por jovens, já que, principalmente a juventude, “está muito desequilibrada emocionalmente e espiritualmente”, realidade que atribui à correria e produtividade impostas pelo sistema.

Ela afirma que a sociedade impõe que as pessoas vibrem “para o normal, e não para o natural”. O normal, aponta, é a competitividade, aquilo que é determinado pelo sistema; já o natural, “o sentido de comunidade, um outro ritmo de vida”. 

A ideia com a meditação e, posteriormente, com os grupos a serem formados por jovens que queiram praticar o benzimento, não é criar um curso para o bendizer, e sim, “proporcionar vivência, acordar o propósito que tem no DNA das pessoas, pois todo mundo tem uma herança espiritual, muitos têm o propósito de vida de benzer, mas não têm contato com quem ensine”.

Leonardo Sá

Somado ao estímulo à competitividade e à produtividade, Véia do Patuá relata que a tradição do bendizer reduziu muito e não passou para a juventude devido ao preconceito, já que muitas benzedeiras foram para igrejas, tanto católicas quanto evangélicas, onde o benzimento era mal visto, não passando para frente esse saber.

A jovem benzedeira é uma exceção à regra. Desde cedo teve acesso a esse tipo de conhecimento. Ela recorda que no terreiro de Umbanda que frequentava na infância, a mãe de santo era benzedeira. A jovem frequentava a casa dessa senhora, pois brincava com a neta dela. Véia do Patuá recorda que participava do terreiro desde pequena, por ter mediunidade muito forte e precisar de auxílio espiritual para equilibrá-la.

“Na Umbanda se faz muito favor para os mais velhos, muitos deles me pediam para buscar ervas. Criança tem energia, é curiosa, pedir esses favores é uma forma dos mais velhos ensinarem aos pequenos”, diz, destacando que sua mãe também é umbandista, sua avó era parteira e seu avô benzedeiro. Isso mostra que a prática do bendizer, embora seja majoritariamente feminina, não é restrita às mulheres, por isso, informa a Véia do Patuá, os homens também são bem-vindos nas atividades e nos grupos de potencialização das rezas que serão formados.
Ainda em relação à infância, a benzedeira rememora que buscava ervas para fazer remédios para as pessoas, o que ocupava parte do seu tempo. Foi essa ocupação que gerou o apelido de Véia do Patuá, colocado pela sua mãe. “Às vezes ela me pedia para ir à padaria, por exemplo, e eu dizia para esperar um pouco, pois iria pegar uma erva para fazer remédio para alguém. Aí ela falava: ‘essa menina parece a Véia do Patuá”, recorda. 

A jovem benzedeira explica que Véia vem de ancestral, de raiz; e Patuá é uma tecnologia ancestral, um amuleto de proteção.

Véia do Patuá realiza atividades de benzimento em Campo Grande, Cariacica, todas sextas-feiras, das 13h às 20h, no Estúdio de Danças Manoela Jácome. Não se cobra pelo benzimento, mas as pessoas podem levar alimento ou itens de higiene pessoal para serem doados a quem precisa.

As ações de benzimento para o público em geral começaram a ser divulgadas há cinco anos, devido à grande procura das pessoas. Antes disso, ela fazia para um público mais restrito, de pessoas de sua convivência. Para chegar a isso, em sua trajetória, buscou o autoconhecimento e as ferramentas de cura por meio das plantas, dedicando-se, hoje, também a atividades como o reiki, cura xamânica, aromaterapia e yoga.

Nesse processo, Véia do Patuá exalta o auxílio de seus mentores espirituais: Pai João de Aruanda, Maria Preta e Cabocla Jurema, que transmitem conhecimentos. Esta última a ensina sobre as “ervas, a magia da floresta, como rezar para entrar nas matas, conversar com as plantas, a magia do reino vegetal”. Ela também salienta que é incentivada por Benedita, uma ancestral que pede para que passe seus conhecimentos para frente.
O fato de morar no litoral foi importante. Ainda criança, a jovem benzedeira frequentava a praia de Itaparica, em Vila Velha. “O mar tem um ancoramento espiritual muito forte. Tem as entidades do mar, e Iemanjá, mãe de todas cabeças. Ela é a orixá que ajudou a me curar. O litoral é um ponto de força”, ensina.

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