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CPI dos Táxis: relatório final aponta enriquecimento ilícito de permissionários, sonegação fiscal e caixa dois

O relatório final da CPI do Táxi da Câmara de Vitória aponta enriquecimento ilícito por permissionários do serviço municipal de táxi, operado por sublocação de permissões através de concessão de procurações para administração das placas. Também aponta sonegação fiscal e formação de caixa dois. A CPI, encerrada em setembro, pede a revogação das permissões sublocadas e a proibição, por lei, do uso de procuração para administrar permissões.  
 
“No caso das procurações outorgadas a terceiros, da sublocação das permissões e cobrança de diárias, resta evidente que realmente ocorre, por parte de alguns permissionários, o enriquecimento ilícito com ganho financeiro particular por meio de usufruto da concessão pública, o que deve ser, de imediato, estancado pelo Poder Executivo, revogando todas as permissões que infringem a lei municipal”, diz o texto do relator, Serjão Magalhães (PSB), citando a lei municipal que dispõe sobre a execução do serviço e determina a revogação em caso de sublocação.
 
Além de Serjão, os vereadores Reinaldo Bolão (PT), vice-presidente, e Devanir Ferreira (PRB), presidente, completam a comissão. A CPI dos Táxis começou ofuscada pela CPI da Máfia dos Guinchos, na Assembleia Legislativa, que já assumira a dianteira da investigação das denúncias, mas também sob a desconfiança de que Devanir poderia resguardar o prefeito Luciano Rezende (PPS), que buscava a reeleição, e o líder do governo na Câmara, o ex-taxista Rogerinho Pinheiro (PHS), de eventuais constrangimentos. Devanir e Rogerinho acabaram não sendo reeleitos.
 
O relatório indica que foi exatamente o que aconteceu: o texto é duro com os permissionários, mas poupa a Prefeitura de Vitória. O prefeito Luciano Rezende ficou resguardado de qualquer responsabilidade pela condução do serviço municipal de táxi e da licitação para novas placas de táxi.
 
O relatório trata as controvérsias da licitação de maneira superficial. Embora tenha ouvido membros da comissão de licitação, um advogado de taxistas que questionaram o certame no Tribunal de Contas do Estado (TCE) e recebido inúmeras denúncias de fraudes no processo, A CPI se limitou a encaminhar o relatório ao Ministério Público Estadual (MPES) para que o órgão tome medidas cabíveis contra as supostas irregularidades da licitação que concedeu 108 novas placas.
 
O edital foi elaborado quando Max da Mata comandava a Secretaria de Transportes, Trânsito e Infraestrutura Urbana (Setran). O vereador reeleito pelo PDT chegou a ser convocado pela CPI, mas não compareceu. O relatório não levanta qualquer suspeição sobre Max da Mata, nem sobre o prefeito Luciano Rezende, na condução da licitação.
 
Iniciada em março, após graves denúncias de irregularidades em contratos de permissão de táxi e na licitação para novas placas, publicadas em série de reportagens de Século Diário, a CPI do Táxi realizou 18 reuniões e 46 oitivas, que endossaram as denúncias apontadas nas matérias. As apurações de Século Diário apontam a formação de frotas particulares de táxi com a conivência da Setran, que seria o núcleo de proteção e sistematização do lucrativo mercado de táxi da Capital. 
 
O caso mais exemplar é a frota de cerca de 60 veículos que seria comandada por Carlos Agne, Josias Siqueira e Ataíde Mateus, apontados por taxistas como os grandes gestores de placas em Vitória, que movimentariam pelo menos R$ 250 a R$ 300 mil por mês. O esquema é sustentado por diárias pagas por defensores aos administradores que podem chegar a R$ 300.   
 
O relatório final retoma os casos emblemáticos que expuseram o uso do serviço de táxi como fonte particular de lucro por um grupo restrito de administradores de placas, como o da permissionária Kariza Amorim. Ouvida na sessão de 21 de julho, Kariza afirmou à comissão que nunca dirigiu um táxi, nunca foi fiscalizada pela Prefeitura de Vitória e não conhecia a legislação municipal sobre táxi. Kariza fez procuração da permissão para o taxista Valdir Jorge Souza, um dos grandes gestores de placa de Vitória.
 
Outro exemplo evocado no relatório é o de um engenheiro da Petrobrás que, acuado pelas denúncias de irregularidades no serviço, resolveu abriu mão da permissão que administrava e transferi-la para um defensor. O táxi estava registrado em nome da esposa dele, que depôs na sessão de 11 de julho. A renda bruta mensal do táxi chegava a R$ 6 mil, segundo o antigo defensor que ganhou a permissão.
 
São dois exemplos de uso dos táxis como fonte de renda por dois grupos sociais distintos, no entanto, semelhantes no usufruto do esquema. No caso de Kariza, o grupo dos grandes gestores de placas de táxi, caso de Valdir, que, segundo sindicância da própria prefeitura, administrava 11 procurações. Por outro lado, o caso do engenheiro revela um grupo socialmente privilegiado – engenheiros, advogados, médicos, funcionários públicos – que, em princípio, poderia dispensar uma permissão de táxi, mas não o fazem justamente para tê-la como boa e segura fonte de renda. 
 
O relatório final também demonstra preocupação com a sonegação fiscal e formação de caixa dois no esquema dos táxis de Vitória. O montante de cerca de R$ 300 mil em espécie produzido pelas frotas particulares dos principais gestores de placa da cidade tem destino desconhecido.
 
O depoimento de Wellithon Pacheco Calixto é sintomático nesse sentido. Na sessão de 31 de maio, o permissionário afirmou que apenas ofereceu o nome para o registro da permissão e que, há dois anos, a placa está alugada para um homem chamado “Ataíde” a R$ 1.750 mensais por procuração – tudo indica que seja Ataíde Mateus. O verdadeiro dono da placa é Rivan Freitas Lopes, cunhado de Wellithon, que mora há dois anos em Belo Horizonte e para quem vai o dinheiro do aluguel. Wellithon não ganha nada. 
 
A CPI também ouviu Nestor Deoclécio Figueiro, um dos 15 permissionários que, segundo um conjunto de documentos obtidos por Século Diário, delegou procuração de táxi a Valdir Jorge Souza. Em depoimento prestado em 14 de junho, ele disse que passou o documento ao taxista por comodidade e que não recebe valores de Valdir, ou seja, não aluga a permissão a ele, informação que não convenceu os membros da CPI. Segundo Figueiró, a renda bruta mensal da permissão chega a R$ 7,8 mil. 
 
“Como esses recebimentos não são oficiais, certamente, evidencia-se o esquema milionário de sonegação fiscal e constituição de “caixa 2”, o que pode ser a fonte alimentadora de todo o sistema criminoso”, diz o relatório. 
 
O relatório também cita os resultados da auditoria instaurada pela Controladoria Geral do Município (CGM) em 2014 e da Comissão Provisória de Sindicância instaurada em 2015, cujos resultados também levantaram indícios de fraudes, como a utilização irregular de procurações, permissionários que não trabalham, fiscalização precário da Setran sobre o trabalho dos permissionários e taxistas com inúmeras procurações.  
 
A isenção de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) também é alvo do relatório. Os vereadores propõem uma análise da legislação e requisitos exigidos para a qualificação como taxista. Para a CPI, a licitação deixou evidente que os contemplados são pessoas de nível médio e superior, portanto, capacitadas para pagar o imposto.
 
Entre outros encaminhamentos, o relatório é finalizado com uma reiteração de indicação de Devanir para instalação de uma base da Guarda Municipal no Aeroporto de Vitória. Ponto mais lucrativo de Vitória, o Aeroporto é local de constantes rixas entre taxistas locais e de outros municípios. 
 
Mas o relatório final também poupa a Associação Permissionários Táxi Aeroporto (Apta), cuja atuação é controversa, como mostraram as investigações da própria CPI. Oitivas demonstraram que corridas lucrativas são encaminhadas para os veículos dos diretores da entidade e que a entidade oferece aos passageiros apenas preços tabelados, omitindo o taxímetro.

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