Gandini presidiu reunião sobre as obras em atraso e a desistência do contrato de duplicação da BR- 101
A Eco101 deve levar 14 anos para duplicar apenas 70 dos 385,9 km previstos no contrato de duplicação da BR-101. A informação chamou atenção dos deputados e convidados presentes à reunião extraordinária da Comissão Especial de Fiscalização das BRs-101, 262 e Rodovia do Sol da Assembleia Legislativa, realizada na tarde dessa quarta-feira (22).
Presidida por Fabrício Gandini (Cidadania), a Comissão recebeu a informação de Roberto Amorim Junior, diretor-superintendente da EcoRodovias, grupo que representa a Eco101. Segundo ele, a previsão é de que somente mais 7,7 Km serão duplicados em até quatro anos, período máximo que irá durar a transição até que uma nova empresa assuma o contrato, do qual a concessionária desistiu em julho de 2022, após dez anos de recorrentes problemas e atrasos no cronograma de obras.
O pequeno trecho se soma aos pouco mais de 60 km já duplicados, o que foi considerado um absurdo pelos parlamentares. “A BR-101 é uma máquina de matar. Comemoramos lá atrás [a concessão para a iniciativa privada] porque achávamos que iríamos interromper isso. Infelizmente, 10 anos depois, e com perspectiva de serem até 14 anos após a concessionária Eco101 ter iniciado o contrato, a empresa vai ter duplicado somente 70 quilômetros da rodovia de um total de 385,9 Kms”, declarou Gandini.
“A sociedade capixaba não pode esperar mais pelo total cumprimento das metas de duplicação”, ressaltou o presidente da comissão. “Toda semana tem um vídeo com a dinâmica das mortes acontecendo. Pelo descuido das pessoas, mas também mortes que seriam evitadas se a rodovia tivesse sido duplicada no prazo legal. Não podemos esperar por mais quatro anos para não fazerem nada, sendo que ficaram dez anos e não duplicaram. Alegaram que não poderiam duplicar o trecho norte. Mas o trecho sul está todo licenciado. Por que não foi duplicado?”, questionou.
Gandini defendeu uma ação forte do governo federal para retirar a empresa que não cumpriu o contrato e fazer com urgência uma nova licitação. Dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF) apontam que, em 2022, 155 pessoas morreram na rodovia. Nos três primeiros meses deste ano, já foram 50 mortos.
A licitação, argumentou, precisa começar pela parte que já está licenciada. “O trecho sul foi todo licenciado. Até João Neiva foi licenciado. Se conseguirmos incluir um trecho que chega perto de Linhares e duplicar, tirando áreas de conflitos com a questão ambiental, terá um avanço significativo na preservação das vidas”.
Posição compartilhada pelo deputado Alcântaro Filho (Republicanos), que propôs a duplicação imediata dos trechos mais perigosos. “Ou o governo prioriza uma nova licitação avaliando a viabilidade, em todos os setores, de se tirar esses trechos onde se tem controvérsia para fazer a duplicação nos que já estão pacificados e licenciados, ou então, se for perdurar essa proposta de quatro anos [de transição até novo contrato], que seja reavaliada uma duplicação pelo menos nos trechos críticos entre João Neiva e Serra, é um dos trechos mais perigosos do Brasil”, sugeriu o deputado de Aracruz.
Amarrar as três BRs em um único contrato, como anunciado pelo governo federal, é um erro, sublinhou Gandini, ainda mais considerando-se que a 101 concentra 70% de todo o fluxo de veículos que passa por rodovias federais que atravessam o Estado.
“A política é a arte do possível. Se não dá para duplicar tudo, tiramos do contrato a Reserva de Sooretama, a Flona de Goytacazes, e duplicamos onde dá, mas não vamos esperar mais quatro anos vendo as pessoas morrerem. As vidas importam!”, reforçou Gandini.
Maciço florestal
A questão ambiental foi bem pontuada pelo biólogo e professor da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Aureo Banhos, um dos cientistas que defende, desde o início da concessão, a necessidade de desviar a BR do maciço florestal – o maior do país em Mata Atlântica de Tabuleiro -, composto pela Reserva Biológica de Sooretama e a Reserva Natural da Vale, entre os municípios de Sooretama e Linhares, no norte do Estado.
A não concessão da licença ambiental para as obras nesse trecho não pode ser usada como causa do atraso do cronograma de obras, conforme vem alegando a concessionária. “Os problemas passam por mau planejamento e não pela presença da floresta. Não havia nenhum desvio previsto, não foram feitas audiências públicas no tempo correto. Quando houve audiência em Linhares, os moradores disseram que não querem rodovia duplicada dentro da cidade. Se fizerem em São Mateus, talvez seja dito isso também, assim como em Sooretama”, contextualizou.
Ao longo desses dez anos de acompanhamento do caso, Aureo e demais cientistas sempre expuseram a impossibilidade técnica e legal de uma obra dessa magnitude ao lado de áreas tão ambientalmente sensíveis como o maciço florestal em Sooretama. Igualmente impossível é levar o desvio para o lado leste de Sooretama, pois trata-se de uma região marcada por alagados e restingas que, além da necessidade de conservação ambiental, também caracterizam um complicador para as obras.
“A solução é o desvio a oeste”, afirmou o acadêmico. A região, explicou, tem uma demanda de investimentos em infraestruturas para atender à produção agrícola local e não apresenta os atributos ambientais que inviabilizam o licenciamento, ao contrário, é caracterizada por baixa cobertura florestal e solos degradados.
O diretor-superintendente da EcoRodovias apresentou aos deputados a proposta que está em discussão para as atividades de transição da devolução da concessão da rodovia BR-101 até 2025, depois do encerramento do contrato.Segundo ele, a empresa executa “uma das menores tarifas do País, e que está adequada às entregas realizadas pela concessionária”. Motoristas de moto pagam R$ 2,45 e os de automóveis têm tarifa de R$ 4,90, na praça de São Mateus,.
Roberto Amorim Júnior garantiu que, nesse período de transição, os equipamentos de apoio, como ambulâncias e guinchos, não serão retirados. Sobre as obras realizadas, disse que foram realizadas restaurações de postos de pedágios, cumpridos 62 quilômetros de trechos duplicados, construídos nove viadutos, 19 passarelas e reformadas sete praças de pedágios. A Eco101 assumiu os radares do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e, atualmente, são 114 radares fixos em operação, além de 10 radares móveis.
A desistência da concessão foi solicitada pela Eco101 à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) no dia 15 de julho de 2022. O contrato foi iniciado em 2013 e tinha previsão de ser concluído em 2038. No início de dezembro, a ANTT aceitou a rescisão contratual.
Em nota, a Eco101 alegou “complexidade do contrato, marcado por fatores como dificuldades para obtenção do licenciamento ambiental e financiamentos; demora nos processos de desapropriações e desocupações; decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de alterar o contrato de concessão; não pedagiamento da BR-116; não conclusão do Contorno do Mestre Álvaro e o agravamento do cenário econômico tornaram a continuidade do contrato inviável”.
O técnico em regulação de serviços da ANTT, Alexandre Presto, esclareceu que o contrato de concessão com a Eco101 continua em vigor, pois ainda não foi assinado o seu cancelamento e tampouco o termo aditivo. Por esta razão, o órgão federal cobra o cumprimento dos compromissos contratuais, que continuam em vigor.