Os moradores e proprietários do Condomínio Vale do Luar, em Guarapari, estão revoltados com a continuidade da cobrança dos boletos de taxa de condomínio e a execução judicial do pagamento.
As medidas estão sendo tomadas pela Associação Residencial Vale do Luar, que alega ser a síndica do empreendimento, mas que não tem, entre os seus associados, os condôminos que estão sendo cobrados.
O mais grave é que a cobrança dos boletos foi suspensa liminarmente pela Justiça em setembro último, no âmbito da ação civil pública (nº 0003810-91.2018.8.08.0021) impetrada pela Associação Nacional das Donas de Casas e Defesa dos Consumidores, em maio de 2018.
A decisão é para que a Associação do Residencial Vale do Luar cesse imediatamente “qualquer cobrança relacionada a qualquer espécie de taxa, inclusive eventuais taxas extras decorrentes de serviços prestados” aos proprietários não associados.
Em seu despacho, a juíza Marcia Pereira Rangel, da 2ª Vara Cível de Guarapari, afirma ter se baseado em entendimento firmado pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ) em ações semelhantes, e na conclusão de processo administrativo impetrado no Instituto Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon), que multou a associação pelo mesmo motivo da cobrança indevida.
Dos 583 proprietários do condomínio, dezenas deles estão depositando em juízo um valor mensal de R$ 59,31, definido em cálculo feito por uma perícia técnica, contrapondo os R$ 190,00 em média que têm sido imposta aos condôminos.
“É justo pagarmos uma taxa ao condomínio, mas não a essa associação. Essa cobrança é ilegal e ilegítima”, argumenta a proprietária e moradora Edna Mara Ferreira, uma das que tiveram o não pagamento executado na Justiça pela Associação Residencial Vale do Luar.
“Tenho 65 anos e nem sabia que existia ‘execução de cobrança’. E por causa de uma associação que eu nem faço parte dela, passei por esse constrangimento de um oficial de justiça vir na minha casa”, desabafa.
O mais revoltante, conta Edna Mara, é que as condições físicas do condomínio também não são satisfatórias. “Não terminaram as obras. As ruas estão cheias de buracos, a energia elétrica é fraca, monofásica. Não tem tratamento de esgoto e a água não é fornecida pela Companhia Espírito-Santense de Saneamento (Cesan), mas por uma empresa particular”, expõe.
Processos e irregularidades
Além da Associação do Residencial, o próprio empreendimento, Loteamento Vale do Luar, acumula várias denúncias de irregularidades, que suscitaram processos contra os proprietários da Imobiliária Garantia e a G&C Construtora, responsáveis pela comercialização dos lotes, respectivamente Carlos Augusto de Azevedo e José Geraldo Lázaro Sibien.
A ação da Associação das Donas de Casa tem valor de R$ 200 mil e refere-se à “conduta ilegal da requerida, consubstanciada na imposição de cobrança, aos não associados, de taxas cobradas pelos serviços e obras supostamente prestados pela mesma”.
Já contra as empresas, a ação civil pública é de R$ 5 milhões, com pedido de indenizações individuais de R$ 50 mil, por crime de propaganda enganosa. Na peça, a associação alega que, contrariamente ao que é anunciado nos materiais publicitários, o “condomínio fechado” não existe. Nem em documentação nem na prática. “O ‘Vale do Luar’ não está registrado em cartório ou perante a prefeitura”.
Histórico
Na busca de soluções para os problemas, os consumidores enganados pelas duas empresas também já procuraram o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) e a Comissão de Defesa do Consumidor da Assembleia Legislativa, o que gerou a realização de uma audiência pública em 2015.
A situação é de extrema gravidade, pois “além dos problemas dos consumidores, de iluminação pública, de ligação clandestina de água, irregularidade do condomínio e no registro perante o RGI, verifica-se que estão sendo comercializados uma quantidade grande de lotes, com potencial de prejudicar centenas de famílias, conforme listagem do MP [Ministério Público]”, argumenta a associação, enfatizando que o loteamento já possui dezenas de moradias construídas e muitos moradores.
Na lista de irregularidades, estão também: ausência de licenças, terraplenagem executada sem recomposição de cobertura vegetal, ausência de estação de tratamento de água e intervenções danosas em duas nascentes de água.
Citando uma afirmação da Procuradoria Geral do Estado (PGE) feita no inquérito policial de Guarapari, a associação diz que o loteamento está sobre a zona de amortecimento do Parque Paulo Cesar Vinha e na Área de Proteção Ambiental (APA) Setiba, e, “por inexistir rede de coleta de esgoto o afastamento das águas servidas das residências já ocupadas se dá através de seu lançamento em áreas de alagados e pela utilização de fossas ‘negras’ e de fossas sépticas”.