Basta uma passadela no post em que a Prefeitura de Vitória comunica o cancelamento do Integra Vitória em sua página oficial no Facebook para sentir o nível de indignação dos moradores com o projeto. “Eleições estão chegando quem vai fazer alterações somos nós”, disse um. “Desintegrou nossa cidade”, disse outro. “Vai fazer suas compras e voltá do supermercado com um monte de sacolas e pega um ônibus mais vazio e depois tem que integrar em outro super lotado,que VC não pode nem entra…”, escreveu mais uma.
E por aí foi. Nem a notícia da suspensão arrefeceu a fúria das pessoas com o Integra Vitória.
Dois dias após o secretário municipal de Transportes Josivaldo Andrade ter asseverado aos jornais a impossibilidade do retorno do velho sistema de transporte, a Prefeitura de Vitória praticamente revogou o Integra Vitória. De 18 linhas, restaram apenas cinco, uma profunda desidratação do projeto original. A alteração vale, por tempo indeterminado, a partir desta segunda-feira (19).
O anúncio foi feito na tarde desta quinta-feira (15) pelo prefeito Luciano Rezende (PPS) em coletiva de imprensa. Em quase duas semanas de operação, o projeto de integração dos ônibus municipais da prefeitura sofreu com críticas ininterruptas, protestos nas ruas e gente desancando prefeitura e prefeito no Facebook.
“Continuaremos ouvindo a população, dentro do conceito de gestão compartilhada, para avaliar a eficiência do sistema. Nossa referência é e será sempre a avaliação final do usuário”, disse o prefeito. Apesar de evocar mais uma vez o discurso da gestão compartilhada, que ampara seu modelo de administração, a história da implantação do Integra Vitória foi um misto de improviso e arbitrariedade.
O dia 5 de outubro, primeiro dia útil de Integra Vitória, foi uma baderna. Desinformação, superlotação, atraso foram reclamações recorrentes, contrariando as informações propaladas pela própria prefeitura que desde agosto os moradores estavam sendo orientados sobre a mudança. Micro-ônibus que atendiam os bairros carentes de Vitória foram extintos de forma sumária. A cidade sentiu o sumiço repentino de 19 linhas.
A população de baixo poder aquisitivo foi a que mais sofreu com as alterações. Se olharmos o mapa de Vitória, podemos constatar cristalinamente que a indignação partiu sobretudo de bairros que circundam o Maciço Central, ou seja, os bairros carentes da cidade.
Moradores de Itararé, Centro, Jesus de Nazaré, Caratoíra, Morro do Moscoso, Santo Antônio, Jaburu, Bela Vista, Santa Tereza, Morro do Quadro, Tabuazeiro, Bairro da Penha, Bonfim, Resistência, Joana D’arc, Santa Martha, São Cristóvão, entre outros bairros, se levantaram contra o projeto. Mas a insatisfação também veio de Jardim Camburi, Jardim da Penha e até de usuários do 214, muitas vezes tida como a linha dos abastados da ilha.
O sistema não era impecável, como qualquer sistema de transporte público brasileiro não o é. Mas atendia minimamente bem o idoso que queria ir comodamente a uma consulta no hospital, ao estudante que se dirigia para mais um dia de aula ou à dona de casa que voltava do supermercado com mãos e braços tomados de sacolas. O Integra Vitória ignorou essa cultura.
A prefeitura também não ofereceu razões técnicas para a implantação do novo sistema. Uma questão vagava no ar: qual a porcentagem dos usuários que precisa realizar duas viagens? Apenas uma Pesquisa Origem e Destino Domiciliar, que é um estudo custoso, poderia oferecer tal resposta. O Integra Vitória se mostrou uma remodelação arbitrária da estrutura de um sistema de certa forma consagrado entre a população.
Assim, com quase duas semanas, o projeto não contemplou os desejos de viagem da maioria dos usuários. A Ilha do Príncipe, por duas vezes, a segunda reunindo lideranças comunitárias de outros bairros, e o Jaburu, foram para as ruas manifestar esse inapelável fato. A impressão mais palpável sobre o Integra Vitória era que o sistema se tratava de um projeto de redução de custos para os empresários de transporte. E sem melhoria em igual proporção do serviço oferecido aos usuários.
Tanto protesto e falta de diálogo provocou a marcação para esta sexta-feira (16), na Câmara de Vitória, de uma audiência pública para discutir o sistema, e uma reunião entre lideranças comunitárias, Prefeitura de Vitória e Ministério Público Estadual (MPES), realizada nesta quinta-feira (15), com o mesmo fim. A audiência pública, especialmente, poderia comprometer seriamente a imagem do prefeito com críticas furiosas não só ao projeto, como ao discurso da mudança.
Luciano Rezende segue perseguindo um projeto de envergadura para entregar à cidade e fazer uma vistosa vitrine para a disputa à reeleição nas eleições de 2016. A do Integra Vitória já se mostra severamente avariada. Nasceu com o cancelamento do Sistema BRT pelo governo do Estado para reordenar o padrão de mobilidade urbana na cidade.
Agora, o projeto se resume às linhas 022 (Conquista/Mata da Praia), 026 (Bairro República/Jardim Camburi), 032 (Praia do Canto/Ilha do Boi), 038 (Bairro Universitário/Mario Cypreste) e 044 (Resistência/Shopping Vitória). Vitória, como muitos queriam, “desintegrou”.