Trânsito, som alto e falta de diálogo são queixas de comunidades sobre a P12
Diversão para uns, transtorno para outros. O verão de Guarapari, no litoral sul do Espírito Santo, traz há anos essa marca. Um dos locais em que isso se registra é no extremo sul do município, na divisa com Anchieta. Moradores do entorno pretendem entrar com uma ação no Ministério Público Estadual (MPES) contra a casa de shows Parador P12, franquia de Florianópolis instalada em Guarapari. As queixas são similares às registradas dois anos atrás em Século Diário: som alto, caos no trânsito e falta de diálogo da empresa com as comunidades.
Localizada na Rodovia do Sol, às margens da Lagoa Mãe-Bá, a casa de shows anunciou ter capacidade para até 15 mil pessoas na época de sua inauguração, com estacionamento privado para até 600 veículos. Nesta temporada, estão entre as atrações Jorge e Mateus, Alok, Dilsinho, Wesley Safadão e Leo Santana.
De um lado da P12, está Porto Grande, bairro de Guarapari com cerca de 400 moradores, a poucos metros do empreendimento. Do outro lado, está Mãe-Bá, bairro ao norte de Anchieta, cuja população é bem maior e também reclama dos impactos. A presidente da Associação Comunitária de Porto Grande, Cely Ravena, relata que as comunidades sofrem com os mesmos problemas e pretendem entrar com ações judiciais em conjunto.
“O impacto mais nítido é o congestionamento na rodovia, que é nosso acesso mais próximo para chegar a Guarapari, onde estão o PA [Pronto Atendimento] que usamos e o Hifa [Hospital Materno Infantil Francisco de Assis], que é o único hospital mais próximo que tem pediatria. Isso pode colocar em risco até a vida de nossas crianças”, alega Thiago Garcia, presidente da Associação Comunitária do Bairro Mãe-Bá. Os engarrafamentos duram horas durante o período de chegada do público, que pode ser à tarde ou à noite, a depender do evento, e podem voltar no final dos eventos, quando moradores se deparam com trânsito parado até entre 8h e 9h.
Outra queixa é sobre o impacto sonoro na região, que registra comunidades pequenas e pouco ambientadas com grandes ruídos, além de estarem cercadas por um ecossistema de grande biodiversidade entre o mar e uma grande lagoa. “Nos verões anteriores não havia tanto barulho como agora. Tem entrado dentro da casa dos moradores, os vizinhos estão reclamando muito”, relata Cely. “Nosso bairro é bem tranquilo, não tem bagunça, não tem festa constantemente”, conta Thiago. Com a vinda da P12, ele relata que o som tem incomodado moradores, em alguns shows, especialmente os de música eletrônica.
A líder comunitária diz que vem tentando contato desde novembro passado com a empresa, mas os responsáveis não vem atendendo ou respondendo às tentativas de contato. Segundo ela, em verões anteriores, a única ação da P12 foi a destinação das doações de alimentos não-perecíveis levados pelo público para pagar a chamada “meia entrada social”. Mesmo assim, por conta do volume, a comunidade precisava alugar um caminhão ou conseguir emprestado para trazer as doações e destinar para as pessoas mais necessitadas. Porém, a partir deste verão, as doações são destinadas diretamente à Prefeitura de Guarapari, que as redistribuem pelo município, sem priorizar as comunidades que sofrem os impactos do estabelecimento, como aponta Cely Ravena.
Há ainda outra questão que os dois líderes comunitários vêm cobrando da Parador P12, mas sem conseguir retorno. A preocupação gira em torno da destinação dos resíduos gerados durante os eventos. “Só pedimos respostas. Outras empresas que se instalaram na região chamam a comunidade e nos mostram para onde vão os resíduos que elas geram. Queremos esclarecimento sobre para onde vão os rejeitos, como estão sendo destinados, para poder tranquilizar nossas comunidades, pois as crianças tomam banho e pessoas vivem da pesca na lagoa”, externa Thiago sobre as preocupações dos moradores.
A insegurança é outra questão relatava por Cely Ravani, devido à circulação de várias pessoas de fora nas proximidades e dentro da comunidade
De acordo com eles, as comunidades têm boas relações com outras empresas que impactam em seus territórios, que costumam apoiar iniciativas e projetos comunitários que estão em curso ou vão iniciar, voltados para esporte e lazer de jovens, pesca, formação profissional e outras questões de interesse da comunidade.
“Porto Grande é uma comunidade tranquila, tem seu modo de vida, as pessoas saem para trabalhar no comércio, na indústria, alguns vivem do comércio dentro da própria comunidade. Os empresários vêm, arrecadam lucro com shows, vão embora, e a comunidade não recebe nenhuma mitigação”.
Thiago acredita que, por atrair muitos visitantes, o empreendimento do entretenimento poderia também contribuir para dar visibilidade e divulgação às comunidades do entorno. “Descrevo a comunidade de Mãe-Bá como paradisíaca, rodeada por lagoa e mar, um lugar muito tranquilo, em que as pessoas convivem bem umas com as outras. Nosso lazer é andar de caiaque na lagoa, ir às falésias da praia”, relata. “Não queremos criar problema nem conflito entre comunidade e empresa. Mas precisamos que abram as portas para que nos escutem. Senão ficamos apenas com a parte ruim de ter esse empreendimento ao nosso lado”.
Thiago Garcia diz que na gestão anterior da associação havia um diálogo por conta de uma amizade do antigo líder com pessoas da P12. Mas com a troca de gestão, esses diálogos cessaram e a empresa não tem respondido às solicitações da associação.
Cely apela também para as autoridades locais, que também têm responsabilidades e podem contribuir para ao menos amenizar os impactos nas comunidades atingidas. “Pedimos também ao novo prefeito [Rodrigo Borges – Republicanos] que possa intervir junto com a comunidade e fazer a intermediação com a P12 para que a comunidade não fique desamparada nesses dias de eventos”.
A reportagem de Século Diário tentou contato com a Parador P12 Guarapari, mas não teve retorno até o fechamento desta edição.