Moradores da Rua Sete de Setembro, um dos pontos mais movimentados do Centro de Vitória, acordaram assustados na manhã desta quarta-feira (15). Uma casa de dois andares desabou completamente entre as 5h e 6h. O imóvel já foi de uso residencial e comercial mas encontrava-se vazio há cerca de uma década, com uma pequena faixa que constava o telefone para aluguel.
O ocorrido acende o alerta para moradores e entidades atuantes no bairro, que nos últimos anos vêm desenvolvendo uma campanha alertando sobre os problemas e perigos dos imóveis abandonados no Centro. A condição precária do imóvel que desabou era evidente para quem o observava, e o próprio Corpo de Bombeiros afirmou que a causa da queda do edifício pode ter sido a falta de conservação.
Foto: Tiago Dantas Fernandes
Produtora cultural e diretora da Associação de Moradores do Centro de Vitória, Stael Magescki, estava nas proximidades do local na noite anterior, até horas antes do ocorrido, e avalia que poderia ter ocorrido uma tragédia maior. Como não havia moradores nem movimento na rua, a possibilidade de haver vítimas foi considerada baixa pelos bombeiros, embora ainda falte retirar todos os escombros. Localizado justamente numa rua de pedestres ocupadas pelo movimento de bares, o local em frente à casa agora em ruínas costuma ser ocupados por mesas e cadeiras usadas pelos clientes. Na noite anterior, um grupo de amigos comemoravam aniversário com cerca de 5 mesas e mais de 20 pessoas há menos de dois metros da parede do imóvel, conforme registros dos participantes.
Interessada no espaço, Stael chegou a visitar duas vezes o local em 2018, entrando no imóvel. Notou uma estrutura muito deteriorada, que demandaria além do valor alto de mercado por sua localização, uma reforma bastante robusta e custosa, o que afastava possíveis compradores e prolongava a deterioração. “A casa devia ter uns 80 anos de existência. Há uma questão de identidade do Centro Histórico, que o define como tal, que está se perdendo, nossa história e patrimônio estão desmoronando”, lamenta. A edificação remetia a um tipo de construção antigo, mas não possui caráter de tombamento. Nas redes sociais moradores lembram saudosos de haver jantado no antigo restaurante que ali funcionava ou jogado sinuca no antigo bar, alguns guardavam esperança de que o local fosse algum dia recuperado e voltasse a ter uma utilidade dentro do bairro.
No ano passado, entre outras atividades, as entidades do Centro e a Defensoria Pública Estadual realizaram a Campanha Função Social da Propriedade, buscando sensibilizar a população moradora e usuária do bairro e cobrando o poder público sobre a importância de criar instrumentos para ocupar os imóveis vazios por muitos anos. Mais de 100 deles foram mapeados e fotografados num mutirão de moradores que marcou o encerramento da campanha.
Entre as medidas defendidas esteve a implantação do IPTU Progressivo para imóveis em desuso, aumentando a tributação gradualmente como forma de pressionar os proprietários a darem uso ao local ou permitirem uma desapropriação para melhor destinação pelo poder público. Embora esteja prevista no Estatuto das Cidades e no Plano Diretor Urbano municipal, a iniciativa não é implantada por falta de definição dos valores de tributação pela Prefeitura Municipal de Vitória. Uma tentativa de legislar sobre a questão por meio de um projeto de lei da Câmara de Vereadores de Vitória acabou sendo barrado após pressão da indústria da construção civil.
Os problemas dos imóveis em desuso na região apontados pelos moradores são diversos, como o fato dos locais poderem se tornar foco de doenças e reprodução de vetores, a questão da segurança, por poder servir para abrigar criminosos, o dano econômico pela não utilização para circulação de riquezas sejam comércios ou moradores, além da questão social que envolve o déficit de moradia de muitas pessoas e famílias enquanto há edifício abandonados.
Stael Magesck lamenta que a situação do prédio que desabou não seja única no bairro. Lembra por exemplo da Avenida Jerônimo Monteiro, uma das principais vias do Centro, onde há desde prédios totalmente abandonados há anos até alguns parcialmente vazios, tendo o térreo ocupado por lojas. “A avenida é um cartão de visitas mal visto. Alguém aluga a parte de baixo, mas quem cuida da parte de cima? É preciso entender que toda estrutura do prédio precisa ser cuidada, por segurança e por defesa do patrimônio histórico”, alerta.