Trabalhadores de quiosques demolidos na Vila Rubim narram abordagem violenta da gestão de Pazolini
A aporofobia, o ódio aos pobres, e a política higienista são as explicações apontadas para a ação autoritária da gestão do prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) contra os trabalhadores da Praça Manoel Rosindo Silva, na Vila Rubim, ocorrida na madrugada dessa terça-feira (11).
Por volta da meia-noite, contam os trabalhadores, tratores da prefeitura chegaram ao local, acompanhados da polícia, derrubando os quiosques, o banheiro que os atendia e um muro onde havia um painel em homenagem ao defensor dos direitos humanos Lula Rocha, falecido em fevereiro de 2021, deixando um legado de luta e coragem na defesa do povo preto e periférico do Espírito Santo.
Até então, a última informação de que eles dispunham havia sido transmitida no último dia 5, dando conta de que os comerciantes que ocupavam os boxes 1 a 12 tinham 72 horas para retirarem seus pertences para uma “intervenção” da prefeitura no local. “Ninguém tinha falado em demolição, nada disso”, afirma o presidente da Associação de Comerciantes da Vila Rubim, Rubens da Silva Ferreira.
Ele conta que as primeiras barracas instaladas na praça eram de madeiras, mas em 2007, na primeira gestão de João Coser (PT), foram feitos os boxes atuais. “Nós pagamos todo mês a taxa para a prefeitura, que agora é de R$ 74,30. Pagamos energia, vigilância. Da nossa parte, estamos em dia. Para eles virem e fazerem isso com a gente? Temos nossas contas para pagar, nossas famílias para sustentar, e estamos aqui de braços cruzados”, relata.
Tudo começou em dezembro, quando alguns funcionários da Companhia de Desenvolvimento, Turismo e Inovação de Vitória (CDTIV) foram na praça anunciando um novo cadastro dos comerciantes, pois o antigo estava defasado. “Perguntavam quais estavam ativos, com o que cada um trabalhava”. No dia 5 de janeiro, continua Rubens, os servidores chegaram com uma notificação, dando 30 dias para desocupação dos boxes.
“Mas no papel não falava nada sobre para onde a gente iria, nem o que seria feito na praça, ou se íriamos retornar para lá depois. Perguntamos para a moça que entregou as notificações, e ela disse que não podia dizer mais nada, que era para a gente ir na prefeitura. Daí eu até falei: ‘se você que é da prefeitura não quer me dizer, então é porque não é coisa boa’. Eu só sei que no mesmo dia, mais tarde, eles voltaram lá e recolheram as notificações de todo mundo. A gente só conseguiu guardar uma, escondido, para ter uma prova, né, do que eles estavam querendo fazer com a gente”.
Em março, ele relata que foi até a sede da Companhia de Desenvolvimento, em Goiabeiras, buscando informações sobre o projeto que a prefeitura tinha para o comércio da Praça Manoel Rosindo Silva. “O rapaz que me atendeu disse para a gente ter paciência e que logo resolveriam a situação, mas que poderia ter uma notícia positiva ou negativa para nós, que era para a gente ficar preparado”.
A surpresa com que os trabalhadores viram a demolição dos boxes é carregada de medo e indignação. “Estamos até agora sem saber o que vai ser feito com a gente, porque o pessoal que saiu não tem nem para onde ir. Por terceiros soubemos que vai ter demolição de todos os 48 boxes aqui, sem a gente saber para onde vai”.
‘Pazolini não gosta de preto e pobre’
Artista plástico que pintou, junto com o também artista plástico Starley, o painel em homenagem a Lula Rocha no muro próximo à Praça Manoel Rosindo Silva, Luhan Gaba se solidariza com o sofrimento dos trabalhadores expulsos. “São várias camadas de violência. Primeiro, contra os trabalhadores, destruindo o local de trabalho deles sem diálogo. É um absurdo, mas não surpreende, infelizmente, porque a gente sabe que o prefeito Pazolini não gosta de preto nem de pobre. A gente não sabe qual o projeto deles ali, mas seja o que for, o pontapé inicial não foi nada bom”, lamenta.
Quando soube de uma “intervenção” que a prefeitura planejava fazer ali, ele conta que a primeira coisa que pensou foi que iriam retirar a homenagem. “Imaginava uma intervenção estética, de repintar os painéis, porque deve incomodar muito, o Lula não era bem-vindo pela administração. Mas não imaginei que seria tão drástico. É uma visão muito higienista, preconceituosa, parece uma retaliação, tudo muito estranho”.
O vereador André Moreira (Psol) concorda com a pecha de higienista e aporofóbica da administração de Pazolini na Capital. “É uma gestão que não consegue entender a dinâmica da economia popular de Vitória. Isso está muito marcado nesse fato, mas também na Curva da Jurema. Lá nós conseguimos ajudar, mas aqui, quando soubemos, já estava tudo no chão. É uma violência muito grande, física e simbólica. Agora eles, ao que tudo indica, vão ter que trabalhar de forma irregular, nas ruas, onde podem sofrer mais violência”, pontua.
O vereador afirma que seu gabinete continua acompanhando o caso, que vai ouvir as pessoas prejudicadas e pedir informação na prefeitura. “O mínimo que deveria ter acontecido, era uma negociação para troca de espaço. É uma higienização que ataca trabalhadores mais humildes”.
A alegação que circula extraoficialmente, de que o objetivo era retirar usuários de drogas do local, pondera André Moreira, também não se sustenta, pois é ineficiente e discriminatória. “Ao invés de fazer uma abordagem social e sanitária das pessoas naquela situação, só piorou o problema. Continua com o problema das drogas, seja ali ou em outro local da cidade, e cria um problema para os trabalhadores, que perderam seu local de trabalho, e que não são atendidos por qualquer programa de empregabilidade”.