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​Ocupação Chico Prego marca retomada na luta por moradia

Retrospectiva 2021: déficit de moradia e despejos prosseguem, mas novas ocupações acontecem no Estado

Uma escola abandonada há oito anos no bairro Romão, em Vitória, marcou uma retomada de novas ocupações na luta por moradia na capital. Com articulação a partir do Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLN) e outras entidades, cerca de 50 pessoas, incluindo crianças e idosos, que vinham de outras ocupações mas não tiveram solução à sua falta de moradia, ocuparam a partir de setembro a antiga Escola Municipal de Ensino Fundamental Irmã Jacinta Soares de Souza Lima.

Além de marcar um retorno de ocupações após o início da pandemia, que dificultou esse tipo de ação, a nova Ocupação Chico Prego também teve em poucos meses uma intensa atividade mobilizando ocupantes e sociedade civil, marcando um novo momento do movimento de luta por moradia. Em poucos meses, houve mutirões de limpeza, atividades infantis, torneio de futebol, construção de horta comunitária, e outras ações

Apesar da publicação da Lei 14.216/21, que impede despejos até 31 de dezembro deste ano, a Ocupação Chico Prego foi ameaçada de reintegração de posse após ação da prefeitura de Vitória. Porém, as famílias seguem até o momento e puderam ter uma festa de natal com Papai Noel e tudo.

Vitor Taveira

Campanha mapeia famílias ameaçadas de despejo

Apesar de seguir a pandemia, muitas famílias sem teto continuaram ameaçadas de despejo durante o ano de 2021 no Espírito Santo, conforme apontaram levantamentos da Campanha Despejo Zero ES e da Defensoria Pública do Espírito Santo (DPES). Um deles, divulgado em julho, apontou que 640 famílias, ou cerca de 1,9 mil pessoas, estavam nesta situação de iminente despejo.

Em novembro, um novo relatório somou seis novos casos do tipo no Estado, num levantamento que inclui áreas urbanas e rurais, sendo que mais de 70% dos casos registrados foram em regiões urbanizadas, tendo Serra, Vitória e Vila Velha como municípios com maior número de denúncias do tipo.

Luta por moradia em Vila Velha

Local histórico da luta por moradia no Espírito Santo, a região da Grande Terra Vermelha, na Região 5 de Vila Velha, também vem sendo palco de novas reivindicações. Século Diário mostrou como é a vida de moradores no Vale da Conquista, que quer se tornar um novo bairro no município.

Durante o ano, também foram realizadas reivindicações de ocupantes de áreas em Barramares, cujas famílias pediam acesso a programas sociais, e também de acampados da Ocupação Vila Esperança, que chegaram a protestar em frente à Prefeitura Municipal de Vila Velha.

Foto Leitor

Programas habitacionais na geladeira

Em entrevista ao Século Diário, a professora de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Estado (Ufes), Clara Miranda, apontou desafios colocados em relação à questão da moradia no Estado, especialmente em Vitória, onde considerou que os programas habitacionais foram “colocados na geladeira”.

A principal conquista do último ciclo de ocupações, que foi o edifício do IAPI, no Centro da capital, que tinha sido aprovado para ser transformado em moradia por meio do Programa Minha Casa, Minha Vida Entidades, acabou naufragando junto com o sonho de cerca de 100 famílias de ter acesso a um lar. Isso se deu sobretudo por conta de mudanças do governo federal, ao suspender a destinação de recursos para a faixa 1 do programa, justamente a que atende as populações mais empobrecidas.

Por outro lado, o outro prédio que virou símbolo dessa luta, o edifício Santa Cecília, avançou em 2021 nas obras de reestruturação feitas pela Prefeitura Municipal de Vitória (PMV) para abrigar 35 famílias. Segundo a PMV, mais de 90% da obra já foi concluída.

Em julho, a prefeitura assinou um termo de cooperação com a Faesa, para um projeto de extensão desenvolvido por professores e alunos da instituição para mapear imóveis ociosos no Centro da cidade, onde a existência de centenas imóveis vazios e muitas pessoas sem teto escancaram as contradições da cidade, conforme denunciado pela associação de moradores do bairro e outras entidades da sociedade civil.

Antiga ocupação no Edifício Santa Cecília, que passou por obras e será destinado à moradia popular.  Foto: Leonardo Sá

Reformas também reduzem déficit de moradia

Além da criação de novas moradias populares, outra questão que vem crescendo no Espírito Santo e no Brasil é o debate e ação em relação à chamada Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (Athis), que atua promovendo reformas e assessoria de profissionais para melhorias de habitações precárias existentes, sobretudos nos bairros periféricos.

Uma das entidades que vem levantando a questão no Espírito Santo é a Onze8, com atuação principalmente no Território do Bem, conjunto de bairros em Vitória, onde foram reformadas casas e comércios em parceria com organizações comunitárias e empresas privadas no Projeto Saúde Habitacional. Porém, também se reivindica que a questão seja implementada como política pública.

Além disso, uma novidade iniciada este ano a partir da parceria comunitária com a Ufes, foi a criação da primeira wikihouse de habitação no Brasil, a partir de um modelo de casa pré-moldada e tecnologia de código aberto, que poderia ser replicada. A moradia será destinada a Seu Manoel, morador de Consolação que vivia em condições precárias. O projeto teve dificuldade em obter recursos para ser concluído, mas no dia 15 de dezembro foi assinado termo de compromisso com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Espírito Santo (CAU/ES), que permitirá retomar a construção em janeiro de 2022.

Projeto Saúde Habitacional

Projetos discutem ocupação e construção das cidades

Durante o ano, também aconteceram projetos e pesquisas que ajudaram a visibilizar e entender melhor as questões colocadas ao longo da história que levam à atual situação das cidades.

Um deles é o projeto Morares, desenvolvido pelo historiador Igor Vitorino, que resgata a história das comunidades periféricas da Grande Vitória, a maioria construídas a partir da ocupação e articulação inicial das próprios moradores, para só depois receber algum tipo de suporte do poder público.

Em Vitória, algumas dessas comunidades passaram a construir alianças e parcerias nos últimos anos em torno do conceito do Território do Bem, conjunto de nove bairros que buscam superar o estigma em torno da violência, fortalecer a articulação comunitária e mudar a visão que se tem dos locais dentro e fora deles. Entre outros desafios, os moradores estão lutando para oficializar este nome para a região junto à PMV.

Outra pesquisa, do geógrafo Vanderson Moreira Silva Alves, mostra a contribuição da população negra na construção da cidade de Vitória, algo sistematicamente apagado pela historiografia oficial.

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