Fique à vontade para duvidar, mas uma viagem de ônibus que pode ser feita em 20 minutos – com sorte, até em 15 – consumiu mais de uma hora na noite dessa quinta-feira (6). Por quê?
Quem trabalha na região central de Vitória e mora na zona sul tem à disposição pelo menos quatro linhas municipais: 031, 031A, 211 e 212. Para os meros mortais, tais são as linhas. A 290 não conta por seu caráter – autoexplicativo – seletivo. As duas primeiras saem de São Benedito, cruzam a Reta da Penha e para depois pegar a orla; as restantes cruzam majoritariamente a orla. O destino final das quatro são os bairros e morros do Maciço Central.
Em princípio, contemplariam quem se desloca entre as regiões central e sul da ilha. Mas o início da noite dessa quinta mostrou que alguma coisa ainda está muito errada com o sistema municipal de transporte de Vitória. A reportagem esperou um ônibus municipal no ponto do Palácio do Café, na Enseada do Suá, e testemunhou apenas um 211 entre as 18h05 e as 19h05. Repetindo: em uma hora, apenas um 211 recolheu passageiros entre Jardim Camburi e o Palácio do Café – a partir da Avenida Leitão da Silva, bom destacar, outras linhas atendem a orla.
Há ou não há algo errado com os ônibus de Vitória? Nessa quinta, retenções por toda a cidade atravancaram o trânsito e desarranjaram a programação dos ônibus municipais e do Transcol. Passageiros se acumulavam nos pontos. Mas era visível a diferença no atendimento do sistema estadual em relação ao municipal: linhas demoravam, mas eram compensadas por dois ou três veículos que vinham um após o outro, sinal de que, apesar dos pesares, há um planejamento mínimo no Sistema Transcol.
Planejamento, contudo, não verificado no sistema municipal.
Após 20 minutos, um 214 passou direto – a linha só vai até Bento Ferreira. Mais vinte minutos e eis que surge um 211 (Jardim Camburi/Santo André). Estava lotado da porta dianteira à porta traseira. Ainda assim, um enxame de pessoas se formou ao redor da porta de embarque. Em vão. Poucos conseguiram subir. No ponto, outros passageiros até fizeram menção de tentar a sorte, mas desistiram e se resignaram a esperar.
Os ônibus de Vitória reapareceram exatamente uma hora depois. Um 211 mais uma vez lotado, um 031 e um 031A, estes oferecendo uma viagem digna. E uma viagem que, entre chegar no ponto e subir no ônibus, dura quando muito 20 minutos, consumiu desta vez pouco mais de um hora – a referência, aqui, é o ponto do Palácio do Café e o da Rua Alda Maria Lyra Vicentini (atrás da Faculdade de Música do Espírito Santo), a partir de onde retenções de maior ou menor grau na Avenida Jerônimo Monteiro típicas do horário em tela podem fazer oscilar o tempo de viagem.
Um desarranjo deplorável no serviço municipal de transporte público em pleno período eleitoral é um recado e tanto para Luciano Rezende (PPS) e Amaro Neto (SD), que disputam a Prefeitura de Vitória. As propostas de governo do atual prefeito, que tenta a reeleição, e do deputado estadual não oferecem soluções convincentes para melhorar a mobilidade de Vitória.
Luciano e Amaro prometem a integração dos sistemas de transporte metropolitano e municipal. Como integrar se a recente licitação do Transcol não previu integração com os ônibus de Vitória e Vila Velha, que têm sistemas próprios? Como integrar com a crise nas finanças públicas que atinge os cofres estadual e municipal – pelo menos é o que tanto deploram o governador Paulo Hartung (PMDB) e o atual prefeito de Vitória?
Especialmente no último ano, desde a malograda implantação do Integra Vitória, em setembro de 2015, a gestão de transporte público de Luciano Rezende se mostra lamentável. Mas o recado serve para Amaro também: as quatro linhas referidas na matéria atendem bairros em que o candidato superou largamente o prefeito, como São Benedito, Santo André, Santo Antônio, Ilha do Príncipe e Morro do Pinto.
Se é um ajuste sorrateiramente executado, em face de um quadro econômico adverso, que deteriorou o serviço municipal de transporte de Vitória, com que recursos Luciano e Amaro querem integração com o Transcol? É um mistério que nem o candidato da Ilha do Boi, nem o da Ilha do Príncipe, elucidou.