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Vigilantes da Ufes espancam estudantes em saída de festa

Na madrugada da última sexta-feira (11), vigilantes da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), algemaram, chutaram e socaram o estudante do quarto período do curso de Audiovisual Ronan Aguiar de Freitas. Jorrou sangue pelo nariz; o rosto e os braços incharam.  A amiga, a estudante do segundo período de Geografia, Bruna Ribeira, ao tentar protegê-lo, teve blusa e sutiã arrancados, a costela chutada e os cabelos puxados. 
 
Os acusados pela agressão são funcionários da Plantão, empresa terceirizada responsável pela segurança patrimonial da universidade. 
 
Uma festa acontecia sexta-feira no espaço do sindicato dos trabalhadores da Ufes (Sintufes), no campus de Goiabeiras, em Vitória. Com amigos, Ronan chegou às duas da manhã. Os portões da Ufes ainda estavam abertos. No entanto, em função da hora, a festa minguava, muitas pessoas já deixavam o Sintufes. Pouco depois Ronan também resolveu ir embora.
 
Ele e os amigos tomaram a direção do acesso central, em frente ao posto de gasolina da Rua da Lama. Mas se depararam com ele já fechado, assim como os demais acessos. As pessoas então ou escalavam as grades ou passavam por buracos nelas abertos. Ainda havia muita gente dentro da Ufes. 
 
Mas no acesso central, onde estava Ronan, um grupo forçava o portão para derrubá-lo. Conseguiram e Ronan passou. Mas voltou com um amigo, de novo, para buscar um terceiro que ficara para trás: neste momento os guardas avançaram. Ronan correu para fora da Ufes, mas os guardas foram atrás. Ronan foi pego na calçada. O amigo que o acompanhava conseguiu escapar.
 
A ação foi tão rápida quanto violenta. Os vigilantes nem se deram ao trabalho de devolver o estudante às dependências da Ufes: operaram o serviço ali mesmo, em plena Avenida Fernando Ferrari. 
 
Um vigilante veio por trás de Ronan e o imobilizou, segurando com as duas mãos um cassetete em posição horizontal e pressionando-o contra o peito da vítima. Ronan reconheceu o guardinha: era um dos supervisores de segurança da Ufes, a quem os estudantes chamam de “supervisor Diego” –  “conhecido como Diego, né, porque a gente não sabe o nome verdadeiro, eles não usam identificação”. 
 
Ronan reconheceu ainda outro supervisor de segurança que participou das sevícias: o “supervisor Bruno”.
 
Ronan foi logo algemado. Mas daí em diante a memória é turva, ele não lembra quantos guardas o cercaram. “Depois eu só lembro de ter tomado várias porradas. Quando eu lembro de novo eu já estava em pé, algemado, sangrando”. Ele acha que só cessaram a tortura porque viram sangue jorrando de seu nariz. Só aí ele levado para dentro de Ufes e posto, ainda algemado, ao lado de um carro da Plantão.
 
Pouco antes, próximo ao viaduto, Bruna Ribeiro também já ia embora. Estava do lado de fora da Ufes quando ouviu alguém lhe gritando: “Socorro, o Ronan tá apanhando, tão batendo nele!”. Era o amigo que conseguira escapar dos guardas. Saíram em disparada, desesperados, em direção ao portão central. 
 
Quando chegou, deu com Ronan algemado, perto dos guardas. Viu também o rosto inchado do colega e a roupa imunda de sangue. “Havia mais de 10 guardas, com certeza”, afirma. 
 
De repente os vigilantes pegaram o detido e fizeram menção de encaminhá-lo, algemado, para algum lugar que os estudantes até agora desconhecem. Talvez para uma delegacia, conjeturam. Aí Bruna se agarrou ao amigo. “A única coisa que eu pude fazer na hora”. Quando agarrou, o supervisor Diego puxou sua blusa: esta e o sutião foram arrancados na hora, desguarnecendo-a de seus trajes superiores. Bruna e Ronan caíram no chão.
 
Segundo os estudantes, não é a primeira vez que os vigilantes da Plantão agem com violência. Bruna conhece o “supervisor Diego” e seus métodos de outros carnavais: a ocupação da Ufes em 2012 por moradia estudantil. Ronan e ela recordam quando eles e os demais ocupantes foram expulsos a base de pancadas. Os vigilantes ainda quebraram as barracas.
 
Ainda no chão, ela tentou o diálogo: “Diego o que você tá fazendo, o que tá acontecendo?”. A resposta do supervisor foi um chute em sua costela. Os guardas mandavam ela soltar Ronan. Bruna não soltava. Ante o estorvo, o supervisor recorreu a outro expediente: puxar o cabelo da moça. Ela resistiu. 
 
Quando os guardas finalmente se afastaram, os dois se levantaram. Aí já se tinha se formado um grupo em torno do tumulto, formado por estudantes que deixavam a festa e terceirizados. Os estudantes vociferavam contra os guardas; estes voltaram a insistir, puxavam Ronan, os amigos tentavam protegê-lo. Na confusão, um guarda jogou um estudante no chão, deu-lhe uma forte pancada na cabeça, que provocou sangramento. 
 
Bruna continuava agarrada a Ronan. Eles caíram de novo, mas alguém, que ela não recorda quem, os chamou – “Vamos embora rápido”. Eles aproveitaram a chance e escaparam. 
 
Foram para a casa de um amigo – mesmo com Ronan algemado. Bruna conseguiu cobrir o colo com uma blusa que lhe deram. Sua roupa, não sabe que fim levou. Ela ficou com a marca de um pé nas costas, marcas nos braços e arranhões na área dos olhos.
 
Um dos primeiros golpes desferidos em Ronan pegou o nariz. Uma vez em casa, a memória se fez mais nítida: ele conta que ficou todo dolorido, o nariz latejando, doendo muito. O rosto inchou. Naquele puxa daqui-puxa dali em torno dele, as algemas pressionaram os braços, que também terminaram com inchamentos. Lembra-se de escoriações nos braços e joelhos. A blusa, manchada de sangue. Só dormiu graças após um relaxante muscular. As algemas foram serradas.
 
Ronan não procurou a direção da universidade. Procurou o movimento estudantil, a Adufes (Associação dos Docentes da Ufes) e o Sintufes. “É onde a gente tem alguma forma de dialogar, algum respaldo, porque nas instâncias administrativas geralmente o que eles fazem é inverter o processo: a gente fala que tomou um chute no rosto e eles falam que a gente deu uma narigada no pé do cara”. 
 
Ele já experimentou essa inversão de fatores. Na ocupação por moradia estudantil, os guardas não economizaram na violência para expulsar os estudantes, como dito acima. Mas quem respondeu processo na Polícia Federal não foi a terceirizada. 
 
“Eles invertem tudo”, diz um abismado Ronan. Ele reconhece o dano patrimonial do portão quebrado – que, apesar de tudo, não foi ele que causou. Difícil é reconhecer tamanha violência. Sobretudo no principal núcleo de formação intelectual do Espírito Santo.

Em assembleia estudantil realizada na noite dessa terça-feira (16), os estudantes da Ufes formaram uma comissão para tratar do assunto. A comissão ficou responsável por redigir uma nota de repúdio, organizar um ato, que ainda não tem data nem formato. Os estudantes ainda tiraram uma posição pelo fim das terceirizadas na Ufes e pela contratação de servidores para fazer a segurança (as estratégias para tal estão sendo traçadas, já que depende de lei federal). Eles querem também que a segurança seja gerida pela própria comunidade acadêmica. 

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