Na entrevista a seguir, publicada em 10 maio de 2008, Jairo Maia, que foi sepultado na tarde dessa sexta-feira (29) no Cemitério Jardim da Paz, na Serra, faz um balanço de seus 50 anos de rádio. Conta passagens pitorescas da sua carreira, desde que se arriscou como locutor da ZYL-9, em Cachoeiro de Itapemirim, até os dias que antecederam o meio século de trabalho dedicado ao rádio.
O radialista, que morreu aos 77 anos, não esconde na entrevista sua mágoa com a Rede Gazeta, na qual trabalhou por 20 anos. O gigante do rádio, que se emocinou diversas vezes durante a entrevista, faz um desabafo. Ele se dizia profundamente magoado com o não reconhecimento por parte da Rede Gazeta que não publicou uma única nota em um de seus veículos para homenagear o aniversário de 47 anos do Programa Jairo Matos. “Na véspera, eu cheguei a procurar o Abdo Chequer [diretor de Jornalismo da TV Gazeta] para pedir uma nota sobre os meus 47 anos de rádio [diz com a voz embargada], mas ele não quis dar a nota. Eu estou há quase 20 anos ali dentro [da Gazeta]. Nunca faltei com minha responsabilidade, nunca houve nada que desabonasse a minha conduta, mas infelizmente…”
Acompanhe a entrevista a seguir e rememore os 50 anos de carreira do gigante da comunicação Jairo Maia.
(“A palavra é metade de quem a pronuncia e metade de quem a ouve.” Michel de Montaigne)
Ele tem 72 anos, é casado há 37 e tem dois filhos advogados. Fenômeno de audiência na freqüência AM no Espírito Santo, seu programa completou no dia 1º de maio – não casualmente para ele, no Dia do Trabalho – 47 anos de rádio. De profissão mesmo ele já tem mais de meio século, completa 51 anos de carreira em 2008. Nascido em Bom Jesus do Norte, começou sua carreira, inicialmente como locutor, na rádio ZYL-9, em Cachoeiro de Itapemirim. “Eu lembro que no começo o José Américo me corrigia muito, principalmente na pronúncia de palavras em inglês”. Já em Vitória, começou trabalhando com direitos autorais. Orgulha-se de mostrar a assinatura de Lamartine Babo (1904 – 1963) – compositor carioca consagrado autor de marchinhas de carnaval e hinos de clube de futebol – na sua Carteira de Trabalho, que na época era tesoureiro da Ordem dos Músicos. Em 1961, já começava a dominar as ondas do dial na Rádio Espírito Santo. Depois passou pela Rádio Vitória, Capixaba, retornou à Espírito Santo e há 19 anos, completados no último dia 8 de maio, está na Gazeta. Mais uma pista: ele foi o primeiro radialista capixaba a receber ligações telefônicas no ar. A inovação fez o serviço da Companhia Telefônica do Espírito Santo entrar em parafuso. “É que o resultado do jogo do bicho também saia às duas e meia e o número de ligações aumentava muito por causa do programa. Eu já recebia uma quantidade enorme de ligações, as linhas da cidade não agüentavam o tráfego e entravam em colapso. Ninguém conseguia usar o telefone nesse horário. Era uma loucura”.
Embora os leitores, obviamente, já saibam de quem estamos falando, a introdução da entrevista tenta parodiar um quadro de sucesso do Programa Jairo Maia (PJM) intitulado “Personagem Oculto”. No quadro, o radialista costuma descrever um personagem da história que está sendo homenageado naquele dia para que o ouvinte mate a charada e descubra quem é o personagem oculto.
Esses e outros quadros criados por Jairo Maia nestes 51 anos de carreira transformaram o produtor e radialista em um fenômeno de audiência no Espírito Santo. Seu nome, como ele mesmo admite, virou sinônimo de rádio. Com 60 mil ouvintes por minuto, segundo dados do Ibope, o PJM faz parte do dia-a-dia de milhares de capixabas. Com o foco na prestação de serviços, o PJM construiu, ao logo de todos esses anos, uma vigorosa rede de solidariedade entre os ouvintes. Às segundas e sextas-feiras, quando um quadro do programa é dedicado à solidariedade, pode-se conseguir de cadeira de rodas a colchão d'água, passando por muletas, camas e até computadores. “Eu leio as cartas, que são carregadas de emoção e os ouvintes ficam sensibilizados. Já tive caso de ouvinte que vendeu um objeto da sua própria casa para fazer uma doação a uma outra ouvinte”.
A fidelidade do ouvinte é algo que ainda hoje emociona o próprio radialista. Ele guarda com muito cuidado todas as cartas que recebe dos ouvintes. Cartas como as de Ewerton Soares ou de Maria Salomão que há mais de 30 anos colaboram com o programa. Jairo Maia explica que 80% do programa são feitos pelos ouvintes que lhe enviam religiosamente material para produzir os quadros do programa.
Século Diário: – Quando o senhor começou a fazer rádio?
Jairo Maia: – Eu comecei a fazer rádio em 1957, em Cachoeiro de Itapemirim, na antiga ZYL-9, do José Américo, tio do também radialista José Roberto Mignone. Comecei como locutor cobrindo as folgas de fim de semana de outros profissionais. Eu lembro que no começo o José Américo me corrigia muito, principalmente na pronúncia de palavras em inglês. Eu não me incomodava de trabalhar nos fins de semana, sempre gostei muito do que faço.
– Como surgiu a ideia de criar o Programa Jairo Maia (PJM)?
– Nessa época, em 1961, eu já estava em Vitória. Trabalhava com direitos autorais na Ordem dos Músicos do Brasil, inclusive veja aqui [exibe o registro da Carteira de Trabalho], quem assina minha carteira é o Lamartine Babo, aquele compositor famoso de hinos de clubes de futebol. Ele era o tesoureiro da Ordem. Um dia estava na Rádio Espírito Santo, numa visita de trabalho para receber direitos autorais, quando o Duarte Júnior me chamou para oferecer um espaço na rádio para eu montar um programa no período da tarde. Inclusive a escolha do nome do programa foi curiosa. Não foi por uma questão de vaidade ou de ego que o programa foi batizado com o meu nome. Na verdade, ficamos pensando qual nome colocaríamos no programa: as melhores da tarde, as campeãs da tarde etc. Até que um colega da rádio chegou e disse: 'Bota Jairo Maia mesmo, se não colar, muda'. Parece que colou.
– O programa de cara foi um sucesso ou demorou um pouco para engrenar?
– O PJM começava às três horas da tarde e foi o pioneiro aqui no Espírito Santo em receber telefonemas no ar. Com a boa aceitação do programa resolveram me puxar para o horário das duas e meia, foi quando houve um problema com a Companhia Telefônica do Espírito Santo por causa do resultado do jogo do bicho.
– Jogo do bicho, como assim?
– É que o resultado do jogo do bicho também saía às duas e meia e o número de ligações aumentava muito por causa do programa. Eu já recebia uma quantidade enorme de ligações, as linhas da cidade não agüentavam o tráfego e entravam em colapso. Ninguém conseguia usar o telefone nesse horário. Era uma loucura. Tanto é que um dia um dos diretores da Companhia Telefônica esteve na rádio para dar uma entrevista e fez um apelo para que mudássemos o horário do programa para o bem da telefonia.
– Depois de um período de quatro ou cinco anos na Rádio Espírito Santo o senhor foi para a Rádio Vitória, não foi isso?
– Exato. Eu lembro que quem me dirigia nessa época na Rádio Vitória era o Danilo Bastos, marido da Dercy Gonçalves. Ele era diretor dos Diários Associados, que incluía a rádio e a televisão. Depois passei pela Capixaba, rádio que acabei comprando logo depois. Inclusive, esse foi um dos piores negócios que fiz.
– Por que a compra da Capixaba não deu certo?
– Porque já nessa época, e hoje ainda é assim, o rádio só tinha uma boa audiência pela manhã, das nove ao meio-dia. O período da tarde para o rádio sempre foi um horário morto, ingrato, ninguém queria. Sem o anunciante fica difícil. É igual na TV, o horário da tarde não vale nada. Eles ficam reprisando um monte de programas velhos. O valor dos comerciais nesse horário é preço de banana podre. Por que o padre Marcelo Rossi entrou na Rádio Gazeta às nove horas? Porque ao meio-dia, lá no Rio de Janeiro, ele perdeu para um programa policial da Tupi. Depois de quatro anos que fiquei com a Capixaba resolvi vendê-la e voltar para a Rádio Espírito Santo. Fiquei mais um tempo por lá e em seguida fui para a Gazeta, onde estou até hoje. No dia 8 de maio completo 19 anos de Gazeta. Hoje (quinta-feira) é dia 8? Pronto, então estou completando hoje 19 anos de Gazeta.
– O senhor conquistou a liderança de audiência com muita rapidez na Gazeta. Nessa época o JPM já era bem conhecido?
– Demorou um pouquinho ainda porque a Gazeta não era conhecida. As pessoas não sabiam nem onde a rádio ficava. Havia um terreno na frente da Gazeta onde sempre era montado um circo, que era bem mais conhecido que a própria rádio. Quando as pessoas me perguntavam a localização da Gazeta, eu respondia que ficava atrás do elefante. O nome Jairo Maia nesta época já era bastante conhecido. Para onde eu ia a audiência me acompanhava. Tanto é que o ex-governador Albuíno Azeredo, à época, estava dando uma entrevista na Gazeta e disse no ar: 'Gostaria de mandar um bom dia para os ouvintes do PJM da Rádio Espírito Santo'. O ex-governador não sabia em que rádio ele estava, mas sabia que estava no PJM. Nas pesquisas Recall se pergunta ao ouvinte: 'Que rádio você está ouvindo? Eles respondem: 'Estou ouvindo Jairo Maia'. Meu nome já se tornou sinônimo de rádio. E quero deixar bem claro que não é por vaidade da minha parte, mas as coisas simplesmente foram acontecendo à custa de muito trabalho.
– O senhor costuma dizer que 80% do seu programa são feitos pelo ouvinte. Como funciona essa co-produção?
– Eu não produzo quase nada, quem produz são os ouvintes. Criei o formato do programa, que tem hoje treze seções: Pensamento do Dia, Sabatina, o Quebra-cuca, Simpatia, Horóscopo, Solidariedade, Corrente de Oração pela Família e assim por diante. Meu trabalho é fazer a triagem de todo esse material que recebo diariamente dos ouvintes. Não jogo nada fora. Não tenho coragem. O material que não é selecionado é guardado em pastas. Eu fico todos os dias atrás do computador montando o programa.
– A maioria do material chega pela Internet?
– Não. O ouvinte do PJM, geralmente, não usa Internet. É uma pessoa mais humilde. O material chega por telefone, por cartas e até pessoalmente – algumas pessoas vão ao estúdio para entregá-lo. Eu tenho um ouvinte, o Eriwelton Soares, que me envia recortes de revistas com notícias interessantes há mais de 30 anos [pega as cartas para me mostrar]. Veja só, são dezenas de recortes com as mais variadas notícias, pensamentos, curiosidades. Assim como o Eriwelton, eu tenho outros ouvintes que me mandam materiais há décadas. Esse ouvinte de Anchieta, o Fernando Matos Ramalhette, que nem conheço, me enviou esse material [exibe um grosso caderno impresso] com mais de dois mil pensamentos. Constantemente eu utilizo um dos pensamentos enviados pelo Fernando no programa.
– O senhor sempre faz questão de dar o crédito ao ouvinte e eles ficam muito satisfeitos com esse reconhecimento. Inclusive, soube que uma ouvinte que é portadora de deficiência física ficou muito comovida quando o senhor leu pela primeira vez o “quebra-cuca” que ela havia enviado ao programa.
– Você está se referindo a Maria Salomão. Ela é outra ouvinte que também colabora há mais de 30 anos. Tenho muita estima por ela por causa de sua força de superação. Você a conhece?
– Não.
– Pois estão, ela é toda atrofiada a ponto de não conseguir nem escrever. Uma outra pessoa escreve as cartas para ela. Eu fui criando um elo muito forte com meus ouvintes e eles comigo. É como se fôssemos todos de uma grande família. Existe uma relação de afeto entre os ouvintes. Por isso o programa tem esse apelo solidário, essa rede de ajuda mútua que foi sendo construída ao longo do tempo. Por exemplo, uma vez eu fiz uma campanha em comemoração ao Dias das Mães e disse que presentearia com uma TV a mãe mais velha e também a que tivesse mais filhos. Quando fui entregar a televisão a essa mãe que tinha o maior número de filhos, me deparei com uma situação muito difícil. Ela era extremamente pobre e morava num barraco caiando aos pedaços. A energia elétrica era 'gato'. Não havia um único móvel para eu colocar a televisão. Decidi fazer uma outra campanha para ajudar essa senhora. Consegui fazer uma permuta com uma loja de materiais de construção e fiz uma casa de alvenaria para ela. Ela, logicamente, ficou feliz da vida. Ganhou a televisão e uma casa. Esse tipo de coisa nos deixa bastante realizados. E você sabe que não sou metido em política. Nunca fui e nunca vou ser candidato a nada.
– O senhor parece ter aversão à política. O senhor já foi muito assediado para entrar para a política?
– Já cansaram de insistir com essa ideia, mas eu nunca quis. Eu prefiro fazer política independente no rádio, sem ter compromisso com políticos ou partidos. Não acredito na política e nos políticos.
O senhor sempre gostou de ouvir rádio?
– Sim. Você está vendo esse fio preto ali na parede? Pois bem, ele está ligado a uma antena lá no topo do prédio, no décimo terceiro andar, isso me permite que eu sintonize rádios de todo o Brasil. Eu gosto de saber o que os outros estão fazendo. Copiar os bons não é defeito, é virtude. Por exemplo, o 'Quebra-cuca' foi inspirado num quadro do Waldir Vieira, da Rádio Globo. Esse programa era veiculado domingo pela manhã. Eu pagava um extra à minha empregada para ela ouvir o programa e passar as informações para mim.
– O sucesso alcançado nesses mais de 50 anos de profissão, em parte, pode ser atribuído a esse formato assertivo do programa. Agora, quais são as qualidades que Jairo Maia tem que o difere de outros radialistas?
– Acho que em primeiro lugar está o carisma. Sempre fui considerado carismático. Em segundo, está a minha preocupação em colocar o ouvinte sempre em primeiro plano. O ouvinte tem de ser visto como um elo. Sempre dei muito valor ao ouvinte. Quando é necessário brigo por ele. O PJM é um programa de prestação de serviço que sempre lutou e luta pelos interesses do povo. Por exemplo, minha esposa morava em Alto de Argolas antes de nos casarmos, e a rua dela não tinha calçamento. Eu comecei então a fazer um apelo ao então prefeito de Vila Velha, Hugo Antonio Ronconi (1967 a 1969 – teve sua administração interrompida e foi cassado), para que ele tomasse providências em relação ao problema. Cada vez que eu fazia a reivindicação no ar e não era atendido, ia dando uma graduação ao prefeito. Começou assim: Hugo Ronconi Pedra 90, Hugo Ronconi Pedra 89, 88, 87 e assim por diante. Acho que ele chegou a receber zero. Venci o prefeito pelo cansaço e ele acabou calçando a rua.
– A credibilidade sempre permitiu que o senhor usasse o programa como um palanque para atender às reivindicações populares?
– A credibilidade conquistada pelo programa é algo muito forte. As pessoas acreditam no que eu digo porque sou verdadeiro. Os ouvintes costumam chegar na farmácia e perguntar: 'O senhor tem aquele remédio que o Jairo Maia está anunciando?'
– O senhor deve ter uma preocupação em anunciar somente os produtos que considera confiáveis?
– Com certeza. Uma vez anunciei um café que não teve boa aceitação. Um ouvinte me ligou e disse: 'Senhor Jairo, não fala mais desse café não porque ele é muito ruim'. Imediatamente tirei o anúncio do ar, porque, afinal, é meu nome que está em jogo.
– Um outro aspecto que chama a atenção no programa, como o senhor já disse, é essa rede de solidariedade que foi criada entre os ouvintes. A ajuda mútua é muito comum, não é?
– Segunda e sexta são os dias reservados à solidariedade. Conseguimos de tudo: cadeira de rodas, muletas, colchão d'água, guarda-roupas, cama, enfim, de tudo um pouco. Eu leio as cartas, que são carregadas de emoção, e os ouvintes ficam sensibilizados. Já tive caso de ouvinte que vendeu um objeto da sua própria casa para fazer uma doação a uma outra ouvinte.
– Como o senhor encaminha as demandas, por exemplo, de melhorias que chegam da comunidade?
– Eu tenho uma secretária eletrônica para receber as reivindicações. O ouvinte liga e tem um minuto para deixar sua reclamação. Depois eu ponho reclamante e reclamado no ar para tentarmos um acordo.
– Muitos políticos devem tentar usar o programa para se promover?
– Isso realmente acontece muito, mas como eu não gosto de políticos vou afastando um a um. Políticos para mim são todos farinha do mesmo saco. São falsos, oportunistas e não cumprem com a palavra. Quero distância deles. Uma vez me convidaram para participar de uma reunião do PL. Eles queriam que eu me filiasse ao partido. Num dado momento da reunião, um dos membros do partido me disse o seguinte: 'Se o senhor entrar para a política, em um ano conquista a sua independência'. Respondi: se a coisa é por ai, estou fora. E não voltei mais.
– O senhor conseguiu conquistar um bom padrão de vida com o rádio. Nessa área, são raros casos como o do senhor. Como o senhor avalia a profissão de radialista com relação aos ganhos financeiros hoje?
– O problema é que o pessoal não quer trabalhar. Eu sempre me dediquei muito, criando quadros, pesquisando, ouvindo outras rádios. Hoje o radialista está acomodado àquela fórmula pronta: vamos ouvir e acabar de ouvir. 'Que música você quer ouvir hoje? Ah, Meu Pequeno Cachoeiro, de Roberto Carlos. Vamos ouvir'. Isso é bem mais fácil. Eles não querem sentar no computador e ficar quebrando a cabeça para produzir um programa. Cada um ganha o que merece.
– Há cerca de dois anos o PJM tinha três horas de duração, agora, com o programa do padre Marcelo Rossi, foi reduzido em uma hora. Dá para fazer o programa do jeito que o senhor gosta em duas horas?
– Não. Essa mudança na grade, com a inserção do programa do padre Marcelo das 9 às 10 horas, atrapalhou muito o meu programa. Eu precisava de mais tempo. Na época, muitos ouvintes reclamaram. Recebi diversas cartas que questionavam por que o programa do padre Marcelo não foi colocado em um outro horário. Mas, infelizmente, é assim que as coisas foram decidias pela direção da rádio. Não sou funcionário da Gazeta. Tenho um contrato com a Gazeta de prestação de serviço. Essa alteração na programação realmente me deixou muito chateado. Antes eu podia levar ao programa médicos, advogados para fazer entrevistas. Hoje não posso mais fazer isso. Esse tempo mais curto não me permite. Eu só continuo na Gazeta por falta de opção. Isso desestimula a gente.
– O senhor pensa em mudar de rádio?
– Não adianta. Não há outra melhor. Eu estou na Gazeta porque ganho bem e não tenho para onde ir.
– O senhor já pensou em parar?
– É difícil responder a essa pergunta. O que me deixa desmotivado às vezes é a rotina, como acontece com qualquer outra profissão. Todos os dias eu tenho que sentar na frente do computador para montar o programa. Às vezes fico um pouco desanimado porque o ouvinte não se interessa muito por cultura. Gostaria que o programa tivesse um cunho mais educativo. Mas o ouvinte está atrás de entretenimento. Se eu pergunto o nome das três capitais que estão situadas em ilha eu recebo cinco telefonemas. Agora se eu perguntar o que começa com a letra B, termina com a letra A e no meio da palavra tem um C, e para usar a mulher precisa abrir as pernas (bicicleta), temos que tirar o telefone do gancho. É isso que eu lamento no rádio, as pessoas são resistentes quando o assunto é educação. Mesmo assim, eu não penso em parar porque o programa é uma terapia para mim. Eu me envolvo. Você entende?
– O senhor tem alguma frustração nesses 50 anos de carreira?
– Posso dizer que sim. Essa rádio que ouvimos hoje, chamada CBN, poderia ser minha. A pessoa que comprou me ofereceu, mas na época não ouvi o conselho da minha mulher e dispensei o negócio.
– Talvez tenha pesado aquela experiência negativa da Rádio Capixaba?
– Justamente. À época eu fiquei com receio de fechar o negócio. Eu até cheguei a mandar uma proposta de R$ 250 mil, mas havia outras maiores. Um sujeito de Goiás ofereceu R$ 800 mil e levou. Depois ele não agüentou e veio me oferecer, só que ele queria mais R$ 200 mil de ágio. Eu me arrependo de não ter feito o negócio. Com a rádio, poderia ser dono de mim mesmo. A Gazeta trouxe muita gente que não entende de rádio, mas acha que você está ganhando muito, e não que nós estamos ganhando muito. Essa visão me desestimula mais a cada dia que passa. Para você ter uma idéia, o PJM completou 47 anos de rádio no último dia 1º de maio. A Gazeta não deu uma única nota. Não há consideração.
– Inclusive achei estranho não encontrar nada na Gazeta. Quer dizer que não houve nenhuma homenagem por parte da Rede Gazeta?
– Não. Na véspera, eu cheguei a procurar o Abdo Chequer (diretor de Jornalismo da TV Gazeta) para pedir uma nota sobre os meus 47 anos de rádio [diz com a voz embargada], mas ele não quis dar a nota. Eu estou há quase 20 anos ali dentro. Nunca faltei com minha responsabilidade, nunca houve nada que desabonasse a minha conduta. Toda a promoção do programa depende do meu esforço. A empresa não me dá nada. Agora mesmo mandei fazer as camisetas comemorativas dos 47 anos do programa. Fiz tudo sozinho, não recebi nenhum apoio.
– Essa falta de reconhecimento deve ter deixado o senhor muito magoado…
– Profundamente. Sinceramente eu não esperava. Provavelmente só irão valorizar o meu trabalho quando eu sair de lá.
– Nem toda a audiência que o senhor arrasta para a Gazeta é valorizada?
– Eles não enxergam dessa forma. Só querem saber quanto eu estou ganhando. Inclusive, com a entrada do padre Marcelo, minha participação diminuiu, porque houve uma redução no tempo do programa. Para eles é um bom negócio, porque o programa do padre Marcelo tem ótima audiência e não custa nada para a empresa.
– Eles devem saber que para aonde o senhor for a sua audiência vai junto.
– Exatamente. Sem preciosismo, é difícil encontrar um profissional à minha altura para me substituir. Como eu disse, ninguém quer produzir nada hoje em dia. Minha vontade era fazer rádio em São Paulo, mas hoje fica difícil para eu fazer essa mudança na minha vida.