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A banalização da morte

A morte de Birna Brjansdottir chocou a Islândia. Nesse fim de semana, mais de 700 voluntários se somaram às equipes de buscas à procura do corpo da jovem de 20 anos, desaparecida desde 14 de janeiro. O mutirão funcionou. O corpo de Birna foi encontrado numa praia. A polícia suspeita que a jovem tenha sido assassinada. Dois suspeitos foram presos. 
 
O pequeno país de 330 mil habitantes praticamente parou para acompanhar o caso. Mas qual o motivo de tanta comoção? Birna era alguma celebridade?; havia um grande escândalo por trás do caso?; seria um crime passional? Não, nada disso. As pessoas estavam perplexas porque naquele país crimes violentos contra a vida ainda chocam as pessoas. 
 
A morte de Birna foi noticiada pelo New York Times e tantos outros jornais importantes mundo afora justamente pelo quase ineditismo do fato. A morte da jovem choca os islandeses porque nas últimas duas décadas foram assassinadas, em média, duas pessoas por ano na ilha. Em 20 anos, 40 homicídios. 
 
Nós, brasileiros, é que deveríamos nos chocar com a notícia. Deveríamos nos chocar porque os crimes violentos estão se tornando cada vez mais banais no Brasil. Tem gente que cruza com um corpo logo pela manhã a caminho do trabalho e já acha isso normal; outros que nem se interessam mais pelas notícias policiais dos jornais que de tão recorrentes parecem até repetidas.
 
O Espírito Santo, que sempre frequentou o topo dos rankings de homicídios nas últimas duas décadas, foi banalizando os crimes de assassinatos ao longo dos anos.
 
Há menos de 10 dias, o secretário de Segurança André Garcia comemorava a redução das taxas de homicídios no Estado que, segundo ele, caíram 15% em relação a 2015: 1. 181 mortes contra 1.391. Depois de dar a devida pujança aos resultados, frisando que o Espírito Santo caiu da segunda para décima primeira posição no ranking nacional de homicídios, Garcia acrescentou: “Os índices alcançados ao longo desses sete anos mostram que com o esforço, integração e comprometimento de todos os servidores da área da Segurança Pública iremos colocar o Espírito Santo entre os estados mais seguros do Brasil e consequentemente cair de posição”.
 
É lamentável que gestores de Segurança Pública, como é o caso de Garcia e da maioria dos colegas que respondem pelas pastas em seus Estados, estejam tão divorciados da realidade. Quando o secretário considera um resultado positivo “apenas” 1.181 assassinatos, ele está, sem perceber, ajudando a banalizar as mortes violentas. 
 
Ora, 1.181 homicídios significam uma média superior a três assassinatos por dia. Isso quer dizer que se o Espírito Santo seguir no meio do ranking de homicídios nos próximos 20 anos, considerando esse mesmo número de mortes de 2016, iremos assistir, nesse período, a quase 24 mil assassinatos.
 
Só lembrando o dado: nas últimas duas décadas, em média, 40 pessoas foram assassinadas na Islândia. Não temos a pretensão de transformar o Espírito Santo ou qualquer outro estado brasileiro na Islândia, mas é preciso continuar se indignando com os crimes contra a vida. 
 
Seria mais didático para a sociedade se o secretário de Segurança, ao fazer o balanço anual dos homicídios, deixasse o Power Point de lado e encarasse a realidade feia como ela é. A sociedade precisa se indignar toda vez que uma pessoa tem a vida abreviada pela violência. Sorte dos islandeses que ainda não perderam de vista esse senso de humanidade. 

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