Com as revoluções norte-americana, francesa e russa surgem uma nova face dos direitos humanos, que se pretendia extensiva à humanidade segundo as respectivas declarações de direitos. Mas já sinalizavam para construções que ampliavam direitos de determinadas classes ou segmentos sociais. Esses direitos não nasciam prontos e acabados.
Um exemplo é o direito ao voto como conquista da sociedade, que no Brasil passou por várias fases; na primeira eleição, em 1824, o voto era censitário, excluindo as mulheres, os escravos os libertos não nascidos no Brasil e os que não atingiam uma renda mínima. Portanto um reduzidíssimo número de pessoas que exercia naquela época o direito de voto.
As mulheres conquistaram o direito de voto somente em 1932. Os analfabetos, os adolescentes, os cabos, sodados e os marinheiros depois da nova constituição. Até hoje ainda existem as dificuldades para assegurar o voto dos presos provisórios. É bom lembrar que temos no Brasil quase 700 mil presos no sistema prisional e que a metade é de provisórios.
Mesmo a conquista do voto, não foi linear nem contínua, pois no período da ditadura civil militar implantada em 1964, durante muitas eleições, o voto universal foi suprimido. Os prefeitos das capitais e das áreas definidas pelo regime como áreas de segurança, além dos governadores dos Estados, que passaram a ser homologados pelas Assembleias Legislativas de maneira mais autoritária e restritiva, as escolha do ditador presidente “escolhido” entre os marechais e generais e depois “proclamado” presidente pelo Congresso Nacional.
No final da era dos marechais e generais-presidentes, a escolha do presidente Tancredo Neves ainda foi indireta, pelo Colégio Eleitoral, sem o voto da cidadania.
A liberdade e a democracia são a luz e o oxigênio dos movimentos sociais e dos direitos humanos. O calor da democracia faz emergir os movimentos de direitos humanos e estes dão formato e a amplitude da democracia em cada país.
As ditaduras são incompatíveis com os direitos humanos. O que não significa que nas democracias esses direitos não sejam ameaçados pelos conservadores e os pensamentos de direita.
Na década de 1960, quando se discutia um projeto nacional de desenvolvimento para o Brasil, muitos segmentos e grupos sociais integravam essas lutas. As mulheres, os negros, os povos indígenas, a juventude e de maneira periférica os LGBT estavam presentes nas lutas pelas reformas de base. Mas nem sempre eram compreendidos e aceitos, pois exigiam o reconhecimento e espaços próprios.
Durante 21 anos de repressão política da ditadura militar esses movimentos não deixaram de existir e nem deixaram de se manifestar, ainda que timidamente, criando espaços nas igrejas, nos sindicatos, nos ambientes culturais e na política nos períodos eleitorais. Eram atuantes sem visibilidade, mas encaminhavam abaixo-assinados, faziam campanhas para candidatos de oposição e alguns se engajavam em organizações de esquerda.
Estiveram presentes na campanha da anistia; nas oposições sindicais; nas associações de moradores; nas “Diretas Já”; na Constituinte de 1988, estiveram nas ruas coletando assinaturas para emendas populares percorrendo os corredores e gabinetes dos Parlamentares; e no“Fora Collor”. Nestes curtos 30 anos de democracia, participaram com bandeiras próprias da Constituinte e das eleições indicando ou apoiando candidaturas para os legislativos e executivos, num rico processo de aprendizagem.
Foram protagonistas e majoritariamente estiveram participando da campanha do operário metalúrgico Lula, da campanha da mulher Dilma Rousseff.
Hoje há sinais de que estamos vivenciando um momento delicado, uma nova etapa, um teste de fogo para os movimentos sociais. Como assegurar e fazer avançar seus direitos, como se inserir de maneira robusta na luta pela democracia e pela a ampliação das liberdades no Brasil.
Querem reduzir as conquistas trabalhistas, tentam criminalizar os movimentos sociais, investem na redução da maioridade penal, atacam Estatuto da Criança e do Adolescente, afrouxam o Estatuto do Desarmamento, investem contra os direitos e garantias sobre as terras indígenas e quilombolas. Defendem um Estatuto da Família que é um retrocesso contra os direitos da população LGBT.
As manifestações de xenofobias, homofobias e de intolerância religiosas têm crescido muito, assim como ódio à política e a defesa do retorno da ditadura, os atentados a bombas à sede do instituo Lula e a sede do PT, as ameaças e agressões nas redes e nas ruas e nos locais de lazer, não são fatos isolados.
O ódio e a intolerância presentes no dia a dia nas redes e nas ruas expressam e sinalizam para os riscos que a democracia e os direitos humanos estão correndo. O diálogo deve ser fortalecido, pois permite o contraditório, permite que sejamos capazes de conhecer o trágico passado recente e permite também encontrar saídas dentro da legalidade, da democracia e do fortalecimento e da democratizaçãodas instituições.
“A cadela do fascismo está sempre no cio”, como dizia Bertoldt Brecht.