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A invasão do Capitólio e a derrota de Trump

O país americano foi chamado de república bananeira

Após o evento do Capitólio, um dos mais trágicos e patéticos da História política recente dos Estados Unidos da América, Donald Trump passa a ver membros de sua própria fileira abandonado o barco, que agora parece estar sendo comandado por um leproso na direção de um iceberg.

Aliados históricos romperam diretamente ou se afastaram, o país americano foi chamado de república bananeira, uma recapitulação de republiquetas dominadas pela United Fruit Company, como Guatemala e Honduras. A ruptura se deu entre membros de seu governo e congressistas do Partido Republicano.


As cenas grotescas de depredação e invasão do Capitólio causaram vergonha a uma grande maioria da população norte-americana, e o mundo, em choque, noticiou algo inusitado em terras americanas, uma ação mambembe de fanáticos, entre neonazistas, proud boys, e toda uma gama de idiotas e bestas-feras que não têm nada na cabeça e agem por uma cegueira que é contemporânea e que anda junta com diversas teorias da conspiração de QAnon e afins.

No influxo de um discurso incendiário de Trump, as coisas começaram a se complicar, em que o presidente insistia na sua tese que era um misto de delírio e arrogância, acusando sem provas as eleições de terem sido fraudulentas, isto pela razão de Biden ter sido eleito com votos duplicados e que precisava se fazer uma recontagem, pois no contexto de uma pandemia, com votos tendo sido feitos pelo correio, Trump se arvorou como vítima de uma fraude eleitoral.

Após o episódio histórico trágico desta invasão e depredação do Capitólio, muitos se levantaram para pedir a destituição de Trump por impeachment e até a invocação da 25ª emenda à Constituição. A reação tardia de hostes republicanas chega num momento em que a divisão do partido já está feita e pode se tornar cada vez mais crônica.

Trump, contudo, divulga um vídeo admitindo, finalmente, a sua derrota, mas o estrago já estava feito. Esta sua tentativa de virar a mesa pode arruinar o seu futuro político, seu projeto de se candidatar em 2024 pode ter acabado de virar pó, um cálculo desastroso produzido por alguém arrogante e que se debate em convulsão antes de admitir que desta vez foi derrotado.

Outro efeito de sua derrota retumbante é agora o seu isolamento político com as defecções republicanas e dentro de seu governo e de seu gabinete, um enfraquecimento que se dá de maneira vertiginosa, reforçando o desastre deste seu cálculo político extremado e inconsequente.

Neste seu périplo para reverter o resultado da eleição de 3 de novembro, Trump viu seu vice-presidente Mike Pence e o líder do Senado, Mitch McConnell, dois dos aliados mais leais que Trump tinha no Partido Republicano, e ainda o senador da Carolina do Sul, Lindsey Graham, virando as costas para um líder político que perdeu o senso de medida e o senso de realidade, numa movimentação que foi uma mistura tóxica de insensatez e a causa desta, a sua arrogância.

Esta ruptura política se evidenciou na sessão conjunta do Congresso para certificar a vitória do democrata Joe Biden. E Trump levantou mais uma ideia delirante de que seu vice, Mike Pence, tinha poder de mudar unilateralmente o resultado da eleição, e Pence respondeu que não tinha autoridade para tal. Outra defecção notória foi do ex-procurador geral, William Barr, com declarações que reprovaram os gestos de Trump. Muitas demissões se seguiram na esfera do governo Trump, o barco começou a dar água.

Das renúncias, as mais notáveis foram as de dois membros do gabinete: a secretária de Transporte, Elaine Chao, e a secretária de Educação, Betsy DeVos. Chao explicou sua renúncia com estas palavras: “Ontem, nosso país experimentou um evento traumático e totalmente evitável, no qual partidários do presidente invadiram uma multidão no Capitólio após uma marcha na qual Trump se dirigiu a eles.” Chao foi o primeiro membro do gabinete a renunciar. Para se ter uma noção da proporção do estrago, William Barr, por exemplo, era uma das pessoas mais próximas de Trump.

No entanto, Trump ainda tem apoiadores na população, tem o apoio de sua família, e de figuras como Rudy Giuliani ou Roger Stone, a quem concedeu recentemente o perdão presidencial. Em relação ao processo de certificação dos votos do Colégio Eleitoral, a tese da fraude defendida por Trump tem o crédito de 100 membros da Câmara dos Deputados e cerca de uma dezena de senadores.

Ted Cruz e Josh Hawley, que são potenciais presidenciáveis para 2024, contestaram os resultados do Arizona e da Pensilvânia, respectivamente. Seis senadores apoiaram a iniciativa de Cruz e sete de Hawley, mas o apoio foi muito maior para ambos os casos na Câmara dos Representantes.

Trump ainda teve que passar pela situação patética de ser um chefe de Estado que teve a sua conta de Twitter banida e ter sido excluído também do Facebook e do Instagram, o que é algo desproporcional, pois um governante ter que ser banido de uma rede social é algo sem precedentes e mais um exemplo do ridículo em que Trump caiu.

Por sua vez, a citada cisão dentro do Partido Republicano, tem na figura de McConnell uma possível liderança para tirar a influência de Trump no partido. E ainda temos Mitt Romney, senador de Utah, uma das primeiras vozes republicanas a se levantar contra Trump, único senador republicano que apoiou uma ação de impeachment em fevereiro de 2020. Romney que também pode ser uma liderança republicana anti-Trump.

Estes republicanos, contudo, serão desafiados por aqueles que querem se beneficiar do capital político trumpista e deste seu eleitorado, e desta cisão pode até surgir um terceiro partido, algo sem precedentes na História partidária norte-americana, que sempre foi uma gangorra dominada por democratas e republicanos.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog : http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

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