Cancelamento de auxílio a pescadores atingidos pelo crime da Samarco/Vale-BHP é inaceitável e exige atitude severa das instituições
As repetidas barreiras erguidas pela Fundação Renova junto às comunidades capixabas só vêm confirmar que a Vale sempre foi sinônimo de problema e descaso, como mostra a história da mineradora, que ostenta o título de maior poluidora do Estado e também integra a lista das maiores do mundo. Depois do crime da Samarco, em 2015, a situação se agravou em decorrência da falta de responsabilidade e até mesmo empatia em relação aos atingidos, por atos marcados pela má-fé e omissão.
O mais recente desses problemas é o cancelamento do auxílio emergencial a várias famílias de pescadores, cerca de 7 mil, em plena pandemia do coronavírus, e que já perderam as fontes de renda por causa da destruição da bacia do Rio Doce pela lama de mineração da barragem de Mariana (MG), da falta de cumprimento de acordos e de ausência da Fundação na reparação e indenização às comunidades.Nessa quarta-feira (1º), vários trechos da ferrovia Vitória-Minas, que margeia o rio, foram bloqueados famílias e movimentos sociais, em protesto contra a decisão de cancelamento do auxílio emergencial pela Fundação Renova para os atingidos pelo crime socioambiental da Samarco/Vale-BHP.
O ato de cancelamento foi concretizado de forma unilateral, sem a participação dos atingidos pelo rompimento da barragem, cuja situação é extremamente difícil para os pescadores, levando em conta os níveis de contaminação do rio, o que torna o resultado do trabalho impróprio para consumo. Sem ele, não há renda. Também não foram comunicados os entes de governança e órgãos jurídicos que acompanham o caso, como o Ministério Público Federal e Defensoria Pública da União.
Adotar essa medida é ignorar a tragédia social do crime, agravada com a pandemia do coronavírus, mais rigorosa justamente nas camadas vulneráveis da população. É preciso destacar, nesse contexto, que, mesmo em períodos considerados normais, essas pessoas já enfrentam sérios problemas, resultante das deformações das políticas públicas, que os coloca para além da margem da sociedade, em termos de emprego e renda.
A Fundação Renova, criada para conduzir processos decorrentes do rompimento da barragem de Mariana, deixa a desejar desde o início de sua atuação. Vê-se, a cada decisão adotada, que se trata de mais um mecanismo das chamadas relações comunitárias, por meio da qual as empresas empregam artifícios para amaciar seus avanços no setor produtivo. Invariavelmente, deixam marcas profundas no campo social, afetando o dia a dia das comunidades, como acontece constantemente na região da foz do Rio Doce, no norte do Espírito Santo.
Objeto de críticas e protestos, inclusive com pedido de prisão de seus diretores, a Renova ocupa mais uma vez o noticiário, comprovando que sua atuação nem de longe está votada às comunidades. Como sempre, parece agir como se os atingidos nada importassem. Uma visão totalmente distorcida e inaceitável, que exige uma atitude mais severa das instituições encarregadas de promover a justiça.