Nada justifica o uso da pandemia do coronavírus para construir plataformas políticas no Estado
Por se tratar de uma pandemia, com dimensões assustadoras, é natural que o avanço do novo coronavírus tenha se transformado em motivo de preocupação de todos. Busca-se a cura dos enfermos, reduzindo o número de mortes, visando também a garantia da proteção em eventuais investidas futuras.
O que não se justifica, sob qualquer hipótese, é o aproveitamento dessa fase de emergência para outras finalidades, entre elas a construção de plataformas políticas, cujos resultados poderão agravar ainda mais o atual cenário catastrófico que já vitimou perto de 80 mil pessoas no País e mais de duas mil no Espírito Santo.
Apesar da situação, podem ser observados fatos que por si só representam um tratamento inadequado para barrar o ataque do vírus. A começar pela ausência de um ministro da Saúde conhecedor da área e não um general, que por mais de dois meses ocupa o cargo. Some-se a esse quadro, irregular do ponto de vista administrativo, o descaso do presidente da República, Jair Bolsonaro, na forma de encarar a doença e, o que é pior, atuar como propagandista de medicamentos com cloroquina, apesar das recomendações contrárias de gabaritados especialistas e da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Esse estímulo do presidente ao uso do medicamento funcionou como rastilho de pólvora e formou grande contingente de seguidores em estados e municípios, sendo um dos exemplos mais significativos a Assembleia Legislativa do Estado. Nesta semana, o tema voltou a ocupar grande parte do tempo dos parlamentares, com destaque para o deputado bolsonarista Carlos Von (Avante).
Ignorando o decoro, voltou suas baterias contra o secretário de Estado da Saúde, Nésio Fernandes, exibindo um já conhecido perfil xenófobo. Ressaltou em sua fala que o secretário veio “lá do Tocantins” e está contribuindo para aumentar o número de mortes pela Covid-19 por não autorizar o uso da cloroquina, que ele defende e estimula, mesmo não sendo da área médica. Discurso semelhante ao já propagado inúmeras vezes pelo Capitão Assumção (Patri), com eco de outros parlamentares em plenário.
Fatos como esse, gerados na politização de uma área que deveria merecer tratamento diferenciado, principalmente na situação em que o País e o Estado se encontram, demonstram o despreparo para lidar com temas diretamente relacionados ao bem-estar das comunidades. A visão política equivocada, focada apenas em questões meramente político-eleitoreiras, particularizando o que é universal, é sempre desastrosa.
Em se tratando da Assembleia, vale registrar que as abordagens em torno do novo coronavírus têm se mantido nesse nível, com exceções, claro! Até mesmo quando o tratamento aparenta ser mais educado, se concentra na esfera política e não na busca de soluções do problema, confirmando que a principal preocupação é a ampliação de cacifes eleitorais, em especial neste ano. Afinal, faltam pouco mais quatro meses para a disputa deste ano.