No Espírito Santo, na medida em que o ressaibo e a ressaca eleitoral se espraiam e fenecem, é tempo de olhar para frente e buscar os significados políticos dos resultados das eleições de 2014. Paulo Hartung (PMDB) derrotou Renato Casagrande (PSB) e ganhou nas urnas legitimidade para exercer aquele que vai ser o seu terceiro mandato como governador do Espírito Santo.
Nas últimas duas ou três semanas da Campanha para governador, o crescimento de Renato Casagrande e de Roberto Carlos (PT), e a ligeira queda de Paulo Hartung, não foram, ao fim e ao cabo, suficientes para levar as eleições para um segundo turno. Na hora “H” da decisão final, os indecisos e os chamados “infiéis” resolveram liquidar a fatura no primeiro turno, a favor de Paulo Hartung. Esta foi a vontade soberana de Sua Excia o Eleitor. Ganhou a democracia, depois de acirrada disputa.
Sobretudo, e este parece ser o primeiro significado relevante das eleições para governador no Espírito Santo, ganhou a democracia também porque a vitória legítima e inconteste de Paulo Harung lhe confere uma maioria, mas não uma supremacia. Com efeito, considerados os votos totais, Paulo Hartung teve 47,45% e Renato Casagrande teve 34,93 %, enquanto que a alienação eleitoral (abstenções + brancos + nulos) chegou a 30,1% . A distribuição dos votos totais e a alienação eleitoral relevante conferem ao governador eleito uma incontestável maioria , mas não uma supremacia. Em 2006, Hartung foi reeleito com 56,76% dos votos totais e 77,27% dos votos válidos.
Politicamente, portanto, Paulo Hartung governará com circunstâncias políticas de governo de coalizão, mas não em circunstâncias de união ou unanimidade – ou, de resto, do chamado consenso-de-todos-com-todos. Vislumbrando esta realidade, ele já se antecipou e anunciou que não será candidato à reeleição. Com isto, ele não impede a fila de andar para a sua sucessão, mas ao mesmo tempo mantém sob sua articulação e iniciativa estratégica as expectativas de poder. Politicamente, uma iniciativa genial.
Resta observar para onde vai Renato Casagrande e, também, para onde vão os atores políticos e forças políticas que se aliaram à ele nas eleições. Terá Casagrande respaldo institucional, fôlego político, e liderança que resultem em capital político, capital social e capital simbólico para ter atuação e efeito pertinente no processo político capixaba? Se ele retornar apenas às “fronteiras” do seu PSB, ele poderá encolher politicamente. Só o tempo dirá. Isto só poderá ficar mais claro depois do segundo turno das eleições presidências e depois da passagem do comando do executivo estadual.
Falando ainda de circunstâncias, Hartung deverá governar em ambiente de ciclo virtuoso da economia capixaba e de ciclo virtuoso nas condições fiscais do Tesouro Estadual. Salvo algum revés na questão dos royalties. O Espírito Santo já está perto da produção de 500 mil barris de petróleo/dia e esta curva de produção deverá ainda permanecer em alta até aproximadamente 2022, o que confere dinamismo à economia regional e aumento das receitas de royalties e participação especial do governo estadual.
Na seara fiscal, não havendo revés na questão dos royalties, o estoque da dívida está situado em margens ainda saudáveis do ponto de vista fiscal. Quanto ao fluxo de caixa, as contratações de pessoal – novo custeio – , principalmente nas áreas de segurança, educação e saúde, impactaram e vão impactar o fluxo. Esta é uma escolha fiscal que o novo governo vai ter que fazer, para entregar os serviços e projetos debatidos na Campanha. O caminho, já apontado pela equipe de transição, será o do escrutínio da qualidade dos gastos e o manejo das receitas atuais e futuras ( royalties e participação especial e o ICMS dos novos projetos). O caminho, também, é levar o governo a ingressar ,literalmente, na Era Digital: governo digital.
Restará saber, no final de outubro, quem vai ganhar as eleições presidenciais. Hartung alinhou-se à candidatura de Aécio Neves. Se Aécio vencer, as relações federativas deverão ser muito boas. Isto é importante para um estado como o Espírito Santo. Se, ao contrário, Dilma vencer, Hartung também poderá ter boas relações federativas- superado, lá na frente, o ressaibo eleitoral.
Agora, até dezembro, a tarefa do governador eleito é, como de praxe, fazer a transição e montar a sua equipe de governo. Nesta montagem, surgirão as primeiras pistas e evidências de como o novo governo vai articular uma coalizão de governo e de poder, tendo presente as novas circunstâncias regionais e nacionais e a nova correlação de forças sociais, políticas e econômicas.
E tendo presente, ainda, e em termos mais gerais e estruturais, que no Espírito Santo há algo de novo na sociedade e na política. Mas que, também no Espírito Santo, o aforismo de Gramsci está presente: o velho está morrendo, mas o novo não nasceu ainda…