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As parcerias para o desenvolvimento do Estado

O governo estadual acaba de lançar em um evento concorrido, o “Programa de Concessões e Parcerias do Espírito Santo”. A iniciativa veio em boa hora, perante a aguda necessidade de se ter investimentos estruturais que elevem o nível de desenvolvimento econômico do Estado.

Em dois artigos que se complementam faço, inicialmente, uma abordagem sobre a realidade econômica do Estado e, em seguida, abordarei as alternativas de ações conjuntas entre o Estado e municípios de um lado, e os parceiros privados, de outro. Lista-se, ao final, sugestões para o deslanche de investimentos, tomando como referência o programa apresentado pelo governo estadual.

Espírito Santo, duas realidades que se chocam: uma situação fiscal saudável e uma economia travada

O ES vive atualmente uma situação peculiar, com duas realidades distintas: de um lado, uma situação fiscal-financeira das contas estaduais com padrão invejável de gestão e resultados totalmente distintos dos demais estados brasileiros. De outro lado, um pífio desempenho econômico, o qual apresentou nos últimos anos resultados deficientes e com alta oscilação, derivada tanto da crise nacional e do comportamento da economia mundial, como também sendo fruto da própria estrutura de sua economia. 

No polo positivo tem-se a situação fiscal-financeira do Estado. Ela é um destaque que pesa muito para a atração de investidores. Pelo 7º ano consecutivo o ES mantém a nota A em termos de suas finanças públicas, segundo classificação da Secretaria do Tesouro Nacional. A decisão de se constituir um fundo soberano com a proteção de um montante expressivo de recursos públicos para a construção de bases sólidas no futuro é um fator auspicioso, especialmente nestes tempos bicudos de crise que vivemos, e é compreensível o entusiasmo do governador Casagrande ao falar sobre o tema. 

Entretanto, no âmbito da dinâmica econômica, o ES sofre impactos fortes derivados dos desdobramentos conjunturais ocorridos no País e no mundo nos últimos anos. O Estado é um dos que possuem elevado grau de abertura econômica, ou seja, tem um nível de vinculação com a economia externa muito alto. 

A abrupta queda dos preços das commoditties – especialmente o petróleo e o minério de ferro – impactou diretamente no desempenho econômico estadual. Soma-se a este dado, a paralisação das atividades da Samarco em novembro de 2015, a alteração na incidência tributária sobre as importações feita pelo Senado em 2013, atingindo frontalmente o Fundap (modalidade de incentivo em vigor desde início dos anos 1970 e que era um pilar para o complexo importador do Estado) e os reflexos da forte seca que atingiu o centro e o norte.

Como consequência, o resultado do desempenho da economia estadual nesta segunda década do século XXI é muito ruim, ficando até mesmo aquém dos baixos índices de crescimento da economia nacional. Os dados mostram que a participação da economia capixaba no todo nacional minguou de 2,4% em 2011 para 1,7% em 2017. Em 2018 esta diferença é atenuada, com o desempenho econômico estadual superior ao nacional (2,4% versus 1,1%). No corrente ano a recuperação verificada continua sendo modesta, tal como ocorre no restante do País.

A situação salutar das finanças públicas estaduais foi conquistada com a contenção do investimento público e este fator acabou por também pressionar para baixo o desempenho da economia estadual. No quadriênio 2015-2018, a taxa de investimento anual média do Estado em comparação com a sua Receita Corrente Líquida foi de apenas 5,8%; no quadriênio anterior, de 2011-2014, este percentual foi de 13,1%. Completa o quadro delicado da dinâmica econômica estadual as profundas dificuldades que os municípios enfrentam para cumprir suas obrigações legais. As fortes quedas nas transferências federais e estaduais espremeram as gestões municipais, não sobrando espaço para os investimentos que as localidades tanto precisam. 

Diante deste quadro de duas situações tão díspares, o foco principal que deveria unificar todas as lideranças políticas, empresariais, de trabalhadores e das corporações seria o de se marchar em direção a uma diminuição da dependência do Estado junto às ações federais.  É evidente que o desenho federativo brasileiro restringe demasiadamente a autonomia de estados e municípios. Mesmo ciente das amarras impostas às autoridades locais para governarem com mais desenvoltura, a busca de uma menor dependência federal não deve ser colocada em 2º plano, pois há espaços a serem ocupados como, por exemplo, a administração do porto público de Vitória, dentre outras possibilidades. Aqui, vale realçar o movimento que os estados do Nordeste fazem para atuarem em conjunto com vistas à implantação de projetos econômicos e sociais.    

A realidade atual da economia brasileira e sua forma de inserção na economia mundial determinam uma inexorável necessidade de se fortalecer a atuação dos governos subnacionais nas diferentes economias regionais do País. As manifestações belicosas e erráticas de autoridades federais no trato de questões internacionais de primeira importância para o País inibem a disposição de investidores e afetam os fluxos turísticos e de intercâmbios sociais e educacionais. Nestas circunstâncias, a atuação transparente somada à sensatez e a um estilo sóbrio e objetivo de lideranças estaduais é fundamental para o Estado demonstrar os seus diferenciais positivos e retomar sua trilha de crescimento com justiça social.  

Por isso mesmo, será frustrante se os anúncios de iniciativas há muito esperadas não venham a ser seguidos por eventos concretos que repercutam diretamente nas iniciativas do setor privado. 

O Estado tem muito atrativos para a realização de investimentos, mas também tem gargalos reais que não podem ser escamoteados. As deficiências logísticas do Estado com o restante do País e mesmo a integração entre suas próprias regiões são notórias. Há vários anos anuncia-se avanços para a duplicação de rodovias e a extensão ferroviária para o sul, de forma a integrar o Estado com uma mancha econômica maior e mais diversificada. Porém, os tempos passam e pouco acontece. O mesmo pode-se dizer da falta de um porto moderno e estruturado para cargas gerais. Este aspecto, inclusive, foi reconhecido no evento pelo próprio governador como sendo o ponto mais deficiente de nossa base econômica. Já passa da hora de se ter uma solução para este imbróglio, tal como se deu de forma exitosa para o aeroporto. 

Assim, o esforço de atrair parceiros para deslanchar projetos de infraestrutura e de prestação de serviços à coletividade é indispensável. A favorável situação fiscal permite ao Estado desenhar alternativas de atuação conjunta com os parceiros privados e, com isso, alavancar projetos estruturantes, tanto para infraestrutura econômica como para as políticas sociais. O lema, nesta dimensão deve ser o de se “fazer mais com menos”, com priorização naqueles investimentos que tenham maior impacto na geração de emprego e na geração de benefícios sociais. 

Enfim, estes são os parâmetros mais gerais que estão associados ao esforço de recolocar a economia capixaba em uma trilha de desenvolvimento. 

Na sequência deste primeiro texto, faço, no segundo artigo, um registro de sugestões a serem consideradas para que as proposições anunciadas pelo governo estadual se tornem realidade. 


Guilherme Narciso de Lacerda. Professor do Departamento de Economia da Ufes (aposentado). Mestre e Doutor em Economia (USP e Unicamp)

 

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