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Crime no supermercado

Por último desmonta também a pilha da massa de tomate, juntando sangue com sangue, terror com pavor.

Um dia normal na rotina de um grande supermercado, na hora de maior movimento, com as freguesas se esbarrando na correria de sempre. Gente se empurrando nas borboletas, brigando pelo último carrinho ainda disponível. O que me intriga é se pela manhã somente as mulheres frequentam os supermercados, e se só elas esbarram umas nas outras na pressa de levar os filhos para a escola ou ao dentista. Nesse específico supermercado, a hora matinal era das mulheres. 

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O vozerio, o atropelo na pressa de chegar primeiro na fila do queijo e da carne. O supermercado é um luxo, com as latas de azeite empilhadas em cilindros perfeitos, combinando com os vidros de massa de tomate sempre perto dos pacotes de macarrão. Como irmãos siameses. A freguesa de blusa azul fala com a freguesa de saia azul, que não conhece e nunca viu, Você já usou essa marca? Não conheço. O rótulo em espanhol, será que não fabricamos mais o sabão em pó? E o sabão de coco, onde se meteu?
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As atendentes atendem sem pressa nos balcões, afinal o pagamento é o mesmo, não importa se sorriem ou se choram, se gastam dois minutos ou duas horas. As atendentes nos caixas, de aparência entediada, trabalham de cara feia – conferindo, digitando, registrando. Recebe o cartão de crédito e o avalia de acordo com a aparência do freguês – Recusado! Vê esse outro aqui. Recusado! Então vou levar só o arroz e a margarina. Refaz todo o processo. Meia hora para achar na bolsa duas notas minguadas de 10,00. E ainda tem troco. Se errar pra mais, vai ser descontado no salário. Se errar pra menos, fica pro patrão.
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O tempo é curto, o estacionamento é pago, a lavadeira pega a roupa às onze. Xi, esqueci da cebola. A mulher de vermelho foi quem viu o corpo – o grito de pavor ecoou pelos corredores bem encerados, pelas prateleiras bem arrumadas, enfeitiçando as freguesas com embalagens chamativas. Como o tiro que assusta a boiada, de repente o belo supermercado colorido e asseado vira um pandemônio. A música sertaneja ecoando pelas alas repletas de carrinhos transbordantes e repetida pela centésima vez, é desligada. Com a gritaria generalizada ninguém ouve nada.
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O gerente chega afobado e ainda abotoando as calças – estava no banheiro e nem teve tempo de lavar as mãos. O que está acontecendo aqui? A mulher de vermelho se apressa em explicar, já imaginando sua foto na primeira página dos jornais. Olha lá! Mas ninguém quer olhar. O antes alegre supermercado de repente vira o inferno de Dante, com as mulheres se atropelando, Chamem a polícia! Grita a mulher de dente de ouro.
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A mulher de cabelo vermelho se revolta, Uma tragédia dessas não pode acontecer em um supermercado desse nível. O melhor da cidade, minha senhora, garante o gerente, tentando se fazer ouvir no caos generalizado. A mulher de camisa amarela abandona o carrinho lotado e desaparece no turbilhão da galeria. Mais um prejuízo. Chamem a polícia! repete a mulher de bandeide no pescoço. O gerente se desespera, Não precisa de polícia, acalmem-se por favor. O que está acontecendo aqui não foi nada. Uma gripezinha à toa.
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A mulher de blusa vermelha: Uma calamidade e o senhor diz que não foi nada? O gerente atarantado é quase atropelado na onda de mulheres histéricas procurando a saída, se atropelando sob as pilhas de mercadorias desmoronando das prateleiras, latas rolando para todo lado. E se alguém quebra uma perna ou tem um ataque cardíaco? Chamem a Rádio Patrulha! se é que ainda existe; o Corpo de Bombeiros! se é que tem gasolina no tanque; a Assistência Social! se é que assiste alguém. As saídas são obstruídas pelas mulheres apavoradas tentando escapar. Por último desmonta também a pilha da massa de tomate, juntando sangue com sangue, terror com pavor.
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Prateleiras inteiras despencam, com as madames pondo lata disso e daquilo dentro das bolsas, maço de cigarro no sutiã, barras de chocolate e pacotes de papel higiênico por baixo da saia, Corre antes que a polícia me pegue. Os policiais entram estupefatos, olhando sem entender a confusão vesuviana. Algum terrorista explodiu uma bomba no recinto? pergunta o Policial Verolio; Identificaram algum agitador da gangue do Trump? pergunta o Sargento Miosótis, assumindo o comando: Baixem as portas, ninguém deixa o recinto, pegaremos o assassino ou assassina. Melhor prender todo mundo.
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O gerente recupera o fôlego, Acalmem-se todos, o perigo passou, ele já está morto. Miosótis: Isso já sei. Falta saber quem matou. O gerente se identifica, Fui eu, quem mais ousaria? No chão, a seus pés, jaz o inimigo de alta periculosidade – um rato.

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