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Crimes e castigos

Identificar o crime e estabelecer o castigo bastam?

A sociedade vive um verdadeiro conflito na contenção da violência urbana e, ao invés de buscar as raízes do problema, alimenta cada vez mais a opinião de que é preciso aumentar o castigo ao criminoso – que não resolve – e, na identificação dele, prefere a superficialidade.

A polícia se sente enxugando gelo, e a sociedade desguarnecida vê a solução no encarceramento, que no Brasil já se aproxima de 1 milhão de pessoas, enquanto “o mundo do crime” segue em franco crescimento.

Os vícios de nossa sociedade se expandem em todos os setores, mas a percepção está sempre voltada para a violência explícita, o que acaba mascarando a realidade ao trazê-la como um espetáculo, capaz de produzir a comoção pública como uma cortina de fumaça, a esconder os problemas causadores, centrais e maiores.

O problema da relação da sociedade com a circulação das drogas se torna um elemento gerador de uma violência e criminalidade que funciona em retroalimentação – a sociedade consome drogas e condena quem lhe abastece – simples assim.

Uma outra face do problema está na consideração dos crimes frente a sua gravidade, em que não pesa verdadeiramente, a gravidade real, mas a explícita, essa mesma transformada em espetáculo.

Vou tomar por exemplo a corrupção no serviço público, diretamente responsável pela desigualdade e precariedade da oferta de serviços para as periferias e das condições de possibilidades de vida à população em geral. Embora tenha dimensões muito maiores que a ação do tráfico, sua repercussão sempre deixa a desejar e a punição não é comum nem explícita, por envolver pessoas de projeção na sociedade.

Naturalmente, quando me refiro à corrupção, também não quero me prender a exemplos superlativos, como o do Ministro da Economia lucrando com sua própria má gestão ao investir no dólar enquanto protagoniza a derrocada do Real, ou ainda a de juízes punidos com a manutenção do salário, sem precisar trabalhar, quando cometem crimes. Quero atingir a corrupção sistêmica, aquela que acontece “aqui embaixo” e que se torna aceitável, chegando a passar despercebida.

A profundidade é tamanha que se torna ontologia, fazendo parte dos livros de história, justificando crimes e estabelecendo realidades completamente anômalas, como por exemplo, a invasão da terra brasileira com o chamado “descobrimento”, mesmo já tendo mais de 5 milhões de pessoas vivendo nela. Essa farsa, estabelecida como verdade, passa a ser ensinada nas escolas e absolvida pela população, mesmo a mais esclarecida, como uma verdade, que, no fundo, é muito conveniente ao criminoso, seja ele a própria sociedade.

Outro exemplo gritante vem das políticas públicas, tomarei somente o salário mínimo como exemplo. Considerado como o valor suficiente para moradia, alimentação, saúde, transporte, educação, vestuário, higiene e lazer – segundo a última pesquisa do Dieese atinge a cifra de R$ 5.657,66 – é estabelecido em R$ 1.100,00.

Perceber essa corrupção, oficializada em nosso ethos, deveria levar à reflexão do processo educativo nacional como uma “fábrica de justificação do crime”.

O que ocorre é o estabelecimento de uma competição da prática criminosa entre os chamados “cidadãos de bem” e os componentes do também chamado “mundo do crime”, para ver quem melhor disfarça sua prática.

Se posicionando à margem deste fato, a sociedade se alimenta do pragmático espetáculo do “combate ao crime”, com chavões estabelecidos como a redução da maioridade penal, aumento de penas e justificação dos castigos aos “criminosos”, desde que sejam reconhecidos por essa sociedade, que acaba gostando de ser enganada.

A verdadeira educação se dá por exemplos e coerência, e não por enganação. Todos somos responsáveis por esse processo!

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