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Dez minutos e 40 Nikes

A teclinha do arrependimento não vem embutida no nosso mapa genético

Ligo o celular e ele me oferece uma cascata de opções tentadoras. A que mais uso é REDO – Faz outra vez, repete, apaga, refaz. Bom seria se a vida fosse tão gentil com nossos erros e descuidos, pondo na telinha um botão para os arrependimentos – faz outra vez, repete, apaga, desfaz-refaz. Grandes erros e pequenos pecados poderiam ser eliminados sem deixarem vestígios: desmancha e faz do jeito certo. Errar é humano, já foi dito e repetido, e abusamos desta condescendência.

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A teclinha do arrependimento não vem embutida no nosso mapa genético. O dito-e-feito já nasce com um ponto final: é definitivo, não tem borracha que dê jeito. Algumas coisas a gente pode apagar, refazer, repor ou pedir desculpas, mas nada será como antes – não é a mesma coisa. A cicatriz dilui com o tempo, mas nunca desaparece de todo. Uma jarra quebrada, a foto queimada, o rasgão remendado, o buraco encoberto – nunca serão como eram, como o rosto enrugado de um idoso – não tem plástica que restaure.

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Se mando uma mensagem com erro social, funcional ou emocional, posso voltar atrás – o Zap nos concede dez minutos para refazer ou apagar a mensagem já enviada – com sorte nem foi lida ainda. Na vida real o traçado é diferente: quanto tempo é preciso para cobrir um cheque sem fundo? Se é que ainda passam cheques, com ou sem fundo, pra ontem ou a perder de vista. Era o chamado cheque atleta, quando o ousado pagava o devido e tinha dez minutos para correr, enfrentar trânsito engafarrado, arranjar o dinheiro com a mãe ou o tio rico-porém-sovina (ou calejado), e chegar no banco antes do cheque. Dez minutos? Maratona pra fazer inveja aos gregos.

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O mesmo acontecia com a palavra empenhada – no tempo em que palavra empenhada valia como documento registrado em cartório: Prometeu tá prometido e sacramentado. Mas em dez minutos tudo pode acontecer – o planeta que habitamos não estanca de repente, esperando os humanos tomarem jeito: um tsunami pode destruir um país, uma vida pode se apagar com a leveza de uma vela acesa. O que foi encomendado virou sucata, a roupa já não serve, o jantar esfriou. O que levou anos para construir – um edifício ou um relacionamento – deixa de ser necessário. Em dez minutos.

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Pode-se entrar para a história com dez passos ou correndo 40 quilômetros, dependendo do tênis. Como na Batalha de Maratona, quando os gregos venceram os persas apesar da imensa desvantagem numérica e de armamento. O general grego ordenou ao soldado Filipidis, “Corra até Atenas para contar que vencemos. Corra muito, antes que nossas esposas coloquem em prática o plano em caso de derrota”. Exausto após a batalha, Filipides correu os 40 quilômetros até Atenas, gritou Nike! (Vitória!) e caiu morto. Portanto, cuide bem do seu Nike.

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