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Disciplina X Autoritarismo

A tropa de policiais militares no Espírito Santo está submetida a uma violência governamental sem precedentes. Dentro de uma lógica simplista, Paulo Hartung escolhe as leis que deseja cumprir e as que prefere ignorar. Quando a Constituição Federal determina a revisão anual dos proventos dos militares, o governador ignora. Quando a lei exige obrigações desses mesmos servidores, o governador exige seu cumprimento. Tem sido, desta forma, um péssimo exemplo para seus subordinados.
 
Acostumado com a atitude da política imperial, Hartung indicou, desde o final da greve da PM no ano passado, o coronel Nylton Rodrigues Filho como seu carrasco. A missão é simples: exigir o cumprimento das leis sob o argumento de disciplina. Disciplina que vale apenas para os subordinados, jamais para o Comando. 
 
Ficou claro que aos policiais não são asseguradas munições, armas, veículos e condições sociais e financeiras necessárias para o bom trabalho, estopim para a paralisação de 2017. Chegou-se ao ponto de o militar ser estigmatizado por ficar doente, com problemas psicológicos, como se culpado fosse pelas consequências da pressão sofrida diariamente nas ruas e no próprio meio. A exigência de disciplina dos militares não é correspondida pela indisciplina do seu superior comandante, o governador.
 
Essa estratégia, no entanto, tem seus efeitos colaterais… 
 
Com o intuito de demonstrar a responsabilidade de Paulo Hartung pela má gestão da segurança pública, a Associação de Cabos e Soldados contratou jornalista que expôs à população os problemas enfrentados pelos responsáveis pela defesa e proteção da sociedade. Rapidamente o Comando reagiu, sob o argumento de disciplina, e passou a abrir inquéritos contra os dirigentes da entidade, em verdadeira investigação à Associação. Acionou o Ministério Público, que, por sua vez, também se movimenta para devassar a entidade. 
 
Nessa quarta-feira, mais uma decisão arbitrária: a Corregedoria da Polícia Militar intimou a jornalista Mary Dias, assessora de imprensa da entidade, a prestar esclarecimentos no próximo dia 27, sobre reportagens produzidas para o portal da Associação. Por meio de nota oficial, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Espírito Santo (Sindijornalistas-ES) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) avaliam o ato como “intimidação à profissional e total afronta à liberdade de imprensa”. E de fato, é!
 
A Associação de Cabos e Soldados é uma entidade civil, não submetida à hierarquia militar, e cujas finalidades legais e institucionais são justamente defender os direitos dos servidores militares e combater as injustiças que os afligem. Seus jornalistas são profissionais que fruem da liberdade de imprensa, e devem expor sem medos e censuras a realidade que enxergam. Criticar de forma independente os fatos e a realidade é um dever do jornalista, e também um direito da sociedade.
 
Portanto, é indisfarçável que a perseguição aos diretores da Associação não se trata de um movimento para preservar a disciplina. Trata-se, ao contrário, de um movimento autoritário, cujo objetivo é a mordaça de uma entidade civil que cumpre a lei e seus objetivos institucionais ao criticar de forma contundente o governador e o Comando da Polícia Militar, quando considerar necessário.
 
A própria natureza de uma associação civil de policiais militares é ser indisciplinada. Ou seja, não se submeter à autoridade do comandante ou do governador. É um dever criticar e expor o ponto de vista dos associados, sem qualquer preocupação em agradar ou desagradar quem quer que seja. Ao assim fazer, faz um bem à democracia e à sociedade, pois sem essa liberdade de expressão, viveríamos em uma ditadura. 
 
A sociedade capixaba emite sinais de que sabe distinguir disciplina do autoritarismo, e não será Paulo Hartung ou seus carrascos que irão calar a Associação ou qualquer entidade representativa e, muito menos, a imprensa crítica e independente.
 
Para Focault, disciplina é uma forma de dominação e de exercício de poder nos espaços sociais, que objetiva o controle do comportamento mediante uma relação de docilidade e utilidade. No dizer de Paulo Freire, os executores da disciplina “são legião de profissionais que substituem o antigo carrasco”, cuja tarefa é fazer com que os excluídos assumam a culpa pela situação de inferioridade e exclusão, não se apercebam da situação de violência a que estão submetidos, e, portanto, não reajam”.
 
Teorias que Paulo Hartung tenta implantar, mas que os responsáveis pela segurança pública do Estado não estão mais dispostos a suportar.

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