Ainda restam pelo menos duas a três décadas para o País recuperar o estrago do desastre Bolsonaro
O cenário eleitoral no Espírito Santo, a menos de dois meses da campanha eleitoral, mostra uma tendência, qualquer que seja o resultado nas urnas, em outubro, que não ocorrerão as mudanças reclamadas nas manifestações populares de 2021, em lives, seminários e encontros promovidos pelo campo progressista e os trabalhadores: a pressão da esquerda, meio esfarrapada, não rendeu os frutos esperados. No cenário nacional, mesmo a vitória em primeiro turno do ex-presidente Lula, apontada nas pesquisas, caso se concretize, representará apenas o começo do ajuste nas coisas destruídas – e foram muitas.
Ainda restam pelo menos duas a três décadas para o Brasil recuperar o estrago causado pelo desastre Jair Bolsonaro, assentado na base construída pelo antecessor Michel Temer (MDB), elevado à condição de autor do programa Ponte para o Futuro, rejeitado pela ex-presidente Dilma Rousseff e motivo do seu impeachment em 2016.
Essa mudança, no entanto, depende do crescimento das forças progressistas, a fim de impedir o reforço da esteira de acontecimentos, à frente o capital financeiro internacional e as elites brasileiras, bastantes atrasadas, como assinala o sociólogo Jessé Souza, que possibilitaram a um punhado de militares, pastores evangélicos e outros oportunistas passar a ocupar funções nas casas parlamentares nos estados e municípios.
Um fruto do bolsonarismo, cartilha do autoritarismo, da destruição, do entreguismo e da irresponsabilidade, algoz da nossa soberania enquanto nação, e gerador de pobreza e fome, além de estimular a violência e o banditismo. Quadro em que são dizimados não só pretos e pobres, mas também trabalhadores como o indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips, há quase duas semanas desaparecidos na selva amazônica, região dominada pelo garimpo ilegal, narcotraficantes e grileiros, como resultado da política genocida do governo, que investe contra os povos indígenas e o meio ambiente.
Esse cenário insere, também, o Espírito Santo e, por aqui, nada é diferente. Basta observar as ações de empresas como a Suzano, que há décadas aterroriza áreas de quilombolas e de povos originários em Conceição da Barra de São Mateus, norte do Estado. As denúncias caem no esquecimento e vão se amontoando nos escaninhos dos órgãos públicos, como a mais recente envolvendo o Território Quilombola do Sapê do Norte.
Os discursos de campanha passam ao largo dessas questões e basta observar a relação de pré-candidatos, para ter a certeza de que pouca coisa será alterada. Para o governo, a escolha será, no quadro atual, como se fosse trocar seis por meia dúzia. O comprometimento visa somente a vitória eleitoral, dentro de uma visão curta, sem olhar para o coletivo.
Renato Casagrande (PSB), atual governador, alinhado a grupos empresariais com o mesmo jeitão que seu antecessor, Paulo Hartung (sem partido), lidera a corrida e disputará a reeleição com o grupo mais à direita, a maioria bolsonarista ferrenha, numa salada na qual se misturam todos os temperos, mas de sabor insípido, sem ideologia nem projeto contextualizado com as reais necessidades sociais. Um exemplo é o ex-prefeito da Serra Audifax Barcelos, da Rede, partido federado com o Psol, que se aproxima do bolsonarista Douglas Pinheiro, presidente estadual do Solidariedade.
Outro, o ex-prefeito de Linhares Guerino Zanon (PSD), em busca de votos no terreno bolsonarista dos evangélicos, reduto de Erick Musso (Republicanos) e de Carlos Manato (PL), em vantagem na bolsa de apostas dos sistemas religiosos por contar com o pagodeiro/pastor e ex-senador Magno Malta (PL), que trabalha para retornar ao posto e se vale da desinformação do seu eleitorado, no mesmo patamar do eleitor do presidente da República. Por último, Felipe Rigoni (União), o mais comprometido com as políticas neoliberais, contrário à classe trabalhadora.
Apesar das aparências e do chamamento de mudanças, as alterações só ocorrerão a partir do reagrupamento das forças progressistas, muitas delas cooptadas pelo brilho do capital e vantagens individuais. As alianças políticas estão à vista de todos para comprovar a afirmativa.