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​IA chega aos jingles eleitorais

A chegada da IA à criação de jingles eleitorais no Brasil em 2024 está revolucionando a propaganda política, gerando debates sobre a autenticidade e o impacto emocional das músicas geradas por algoritmos.O cenário das campanhas políticas no Brasil passa por uma transformação significativa com o uso de inteligência artificial (IA) na criação de jingles eleitorais. Pela primeira vez, em 2024, candidatos em diferentes partes do país utilizam essa tecnologia para compor músicas de campanha, uma prática que, até então, era dominada por compositores humanos. Este movimento marca um novo capítulo na história da propaganda política, trazendo questões sobre autenticidade, criatividade e até mesmo o impacto emocional das músicas criadas por máquinas.

Em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, candidatos a prefeito de partidos variados já aderiram à IA para compor jingles que ecoam pelas ruas e redes sociais. Essa inovação não se limita ao Brasil. Nos Estados Unidos, a IA já havia sido utilizada em campanhas anteriores, criando jingles que replicavam estilos musicais populares, visando aumentar o engajamento com o público jovem e os eleitores indecisos.

A adoção da IA para a criação de jingles representa uma tentativa de revolucionar a comunicação eleitoral, oferecendo uma produção rápida e barata de conteúdos sonoros, no entanto, essa prática também levanta preocupações quanto à qualidade do material produzido e a possível homogeneização das mensagens políticas. O “slop digital” – termo usado para descrever a produção massiva e de baixa qualidade de conteúdos gerados por IA – é uma ameaça real para a autenticidade e a diversidade musical, que sempre foram marcas registradas das campanhas políticas.

Com o uso de IA, surgem desafios legais e éticos. A resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nº 23.610/2019, por exemplo, exige que o candidato informe, “de maneira explícita, destacada e acessível, que o conteúdo foi fabricado ou manipulado e que tecnologia foi utilizada”.  A questão é se a IA, ao gerar novos jingles, pode inadvertidamente reproduzir melodias ou estilos reconhecíveis, violando essas regras. Além disso, há o risco de plágio, pois as ferramentas de IA baseiam suas criações em vastas bases de dados de músicas existentes.

O conceito de “slop digital” destaca uma consequência preocupante da adoção massiva de IA na produção de conteúdos: a inundação do espaço midiático com materiais de baixa qualidade. Na esfera política, essa prática pode diluir a autenticidade e o impacto dos jingles eleitorais, que historicamente desempenham importante papel na conexão emocional com os eleitores. A saturação de músicas geradas automaticamente pode levar à banalização das mensagens políticas, tornando difícil para os candidatos diferenciarem suas campanhas de forma significativa. O uso indiscriminado de IA, para criar jingles, pode até mesmo reduzir a confiança dos eleitores, que podem passar a questionar a sinceridade e a originalidade das mensagens transmitidas, vendo-as como meros produtos de algoritmos em vez de genuínas expressões de intenção política.

Além do debate sobre autenticidade, há o impacto emocional das músicas criadas por IA. Campanhas políticas dependem fortemente de jingles para criar uma conexão emocional com o eleitorado, evocando nostalgia ou inspirando ação. Resta saber se uma música criada por uma máquina pode realmente tocar o coração dos eleitores da mesma forma que uma composta por um ser humano, imbuída de emoções e intencionalidade.

Curiosamente, enquanto a tecnologia avança, alguns candidatos ainda preferem métodos tradicionais, valorizando o toque humano em suas campanhas. Essa resistência revela um ceticismo em relação à capacidade da IA de substituir a criatividade humana, destacando uma divisão entre inovação e autenticidade. Para muitos, um jingle não é apenas uma ferramenta de marketing, mas uma expressão cultural e identitária.

O que está claro é que a chegada da IA aos jingles políticos anuncia apenas o começo de um debate mais amplo sobre o papel da tecnologia nas campanhas eleitorais. O futuro das músicas de campanha, e possivelmente da própria comunicação política, dependerá de como candidatos, reguladores e eleitores responderão a essa nova onda de inovação. O desafio será equilibrar a eficiência e a inovação tecnológica com a preservação da essência humana.

Flávia Fernandes é jornalista, professora e pós-graduanda em Inteligência Artificial e Tecnologias Educacionais pela PUC-MG.

Instagram: @flaviaconteudo

Emal: [email protected]

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