A intervenção federal no Rio de Janeiro é um inequívoco lance eleitoral de Michel Temer. Sabe-se que não se usa esparadrapo para conter hemorragia, mas o objetivo não é consertar a situação e, sim, fazer malabarismo com armas de fogo.
Ao lançar os militares nessa espécie de aventura, o vice-presidente em exercício corre o risco de autoimolar-se junto com o governador Pezão, do PMDB. Os generais ficaram na defensiva, esperando a aprovação do Congresso.
Quem mais sentiu o drama foi o presidente da Câmara Rodrigo Maia, eleito pelo DEM carioca. Ele pressente que pode ser atingido por uma dessas balas atiradas pela caneta giratória do presidente de plantão no Palácio do Planalto.
Todos eles, militares, políticos e empresários, sabem a situação de violência é histórica, crônica e não se restringe ao Rio.
A violência é parceira da miséria, cuja resolução depende de uma política econômica ajustada às necessidades básicas da população e não, apenas, às exigências do mercado financeiro.
A economia está estagnada. O crescimento econômico alardeado pelo governo é inferior à taxa de crescimento da população. Ou, seja, o Brasil involui, com o agravante de que a desigualdade está aumentando.
Até quando a maioria da população vai aguentar uma situação que beneficia uma minoria?
A medida certa, portanto, seria investir na criação de emprego, geração de renda, ampliação dos serviços de educação e saúde com segurança para que as pessoas, desde crianças, tenham perspectiva de progresso e esperança de felicidade.
O comportamento do governo Temer é exemplar na falta de visão estratégica.
No caso da violência no Rio, repete-se a hipocrisia de Washington Luis, o presidente de 1927-30, que dizia ser a questão social caso de polícia. Agora agrava-se o erro com a convocação do Exército: trata-se a questão carioca como um caso de guerra civil.
Tanto na intervenção no Rio como em outros aspectos da administração federal, sobressai a subserviência absoluta do governo Temer à ideologia neoliberalista pregada pelos EUA através de suas agências de inteligência e de risco.
No campo educacional, tira-se dinheiro do ensino público para favorecer a expansão da iniciativa privada, como se a educação fosse simplesmente um assunto de mercado e não uma questão de Estado.
No campo da saúde, corre-se para conter ferimentos em vez de investir na prevenção das doenças, epidemias e problemas crônicos que vão da desnutrição de uns à obesidade de outros – todos na casa das dezenas de milhões de pessoas.
No meio ambiente, “mitigam-se” acidentes ecológicos quando se sabe que, para garantir os mananciais de água limpa, é preciso investir na restauração dos ecossistemas mediante reflorestamentos das cabeceiras das bacias hidrográficas.
De pouco adianta investir bilhões em canais de transposição das águas do rio São Francisco para regiões áridas se não forem recuperados os afluentes que correm para formar o “rio da integração nacional”.
Temos aí tarefas para todo o século e não apenas para o tempo de um governo ou um ciclo partidário.
Os governos se apagam por decurso de prazos e os partidos se corrompem por excesso de fisiologismo.
LEMBRETE DE OCASIÃO
“A sorte não faz acordos”. Jorge Luis Borges