Haja óleo de peroba para defender essa ideia
A ocupação europeia do território brasileiro se deu em processo extremamente violento aos ocupantes originários da terra. Promoveu massacres, destruição de comunidades inteiras e todo tipo de violência. Dentre as mais maldosas ações, esteve sempre presente a tentativa de destruir suas culturas, impondo-lhes uma nova religião e novos hábitos de vida, de consumo, trabalhos, doenças e etc. Durante muito tempo, o indígena que não se enquadrasse na nova estrutura social poderia ser morto como um animal.
O Brasil se tornou um país e herdou essa cultura de desrespeito, foi encurralando as populações indígenas sob a bandeira do desenvolvimento, derrubando a floresta e adentrando com sua máquina desenvolvimentista até mesmo territórios já demarcados.
Durante os anos de chumbo da ditadura militar, a visão era interligar as regiões e povoar as áreas “até então desabitadas”. Foi construída a Rodovia BR 230 – Transamazônica, cortando o coração da Floresta Amazônica e facilitando, cada vez mais, a aproximação danosa aos indígenas. Também na ditadura, conforme relatório produzido pela Fiocruz, ainda sob o governo Figueiredo, o projeto era colonizar a floresta, pretendendo deslocar em torno de um milhão de pessoas para lá.
Naquele período, aqui no Espírito Santo, a Aracruz Celulose tentou, também a todo custo, negar a existência de indígenas para ocupar suas terras com a fábrica e plantio de eucaliptos. Com o desenvolvimento da área, os indígenas foram encurralados em pequenos e fragmentados territórios e até hoje sofrem as danosas consequências.
As aldeias muito próximas dos aglomerados urbanos trazem grandes problemas para suas populações, principalmente a dificuldade de manutenção de suas culturas tradicionais, tanto pela falta de terra quanto pela contaminação cultural que sofrem. Nas comunidades do entorno das aldeias, vivem os indígenas que aderiram ao modo de vida dos “brancos”, montam negócios, trabalham empregados, seus jovens estudam em escolas públicas, frequentam igrejas das mais diversas, enfim, se sentem cidadãos urbanos e gostam disso.
Às vezes, penso que a forma de operar trazida pelos europeus permanece atual. A sociedade ainda oferece espelhinhos para os indígenas, tentando enganá-los de que a vida em nossa sociedade é justa, boa e única possível. Infelizmente, ainda tem muito indígena que se ilude com isso e se envolve “do lado de cá” passando, como o negro equivocado, a buscar o lugar do branco.
Por outro lado, penso que uma questão deste tamanho, que envolve eminentemente a nossa ética, exige um envolvimento maior e mais esclarecido da sociedade. O tema precisa estar em pauta, formando uma consciência nacional, minimamente decente, para evitar que cada um de nós tenha que ser cúmplice desta hipocrisia chamada Marco Temporal, que efetivamente assina embaixo de toda a barbárie que sofreu a população indígena desde a invasão europeia.
Everaldo Barreto é professor de Filosofia