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No trem da meia-noite

O bilheteiro, e não o trajeto, mudou a minha vida

Com tantas locomotivas recortando o mapa-mundi, dormi na estação e peguei o trem errado. A velha maria-fumaça era um dragão enlouquecido, soltando fogo pelas ventas, queimando florestas para se manter rodando. Essa caldeira do diabo conectou o mundo dos vivos, interligando os lugares mais distantes e diversos, mesmo limitada a duas linhas paralelas. Que contrariando a geometria, sempre se encontravam.

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Amores nasceram e morreram entre um trajeto e outro. Perdi o trem das 11…Não tem problema, vem comigo no trem das 12. Mas meu trajeto é outro. Minha vida também era outra, mudei o rumo. Peguei um trem para lugar nenhum, o bilheteiro pediu o bilhete. Expliquei que não sabia para onde ia – quando decidisse, pagaria. Me pôs pra fora na primeira estação – portanto, o bilheteiro, e não o trajeto, mudou minha vida. Na próxima curva o trem descarrilhou.

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Minha primeira viagem ao Rio de Janeiro, então capital federal, então cidade maravilhosa, foi num trem de ferro – como eram chamados – com baldeação em Campos dos Goytacazes para um confortável carro-leito. Há quanto tempo…Riscando o chão e abrindo horizontes, a velha maria-fumaça foi substituída pelo diesel, que foi substituído pelo gás natural liquefeito. Mais rápidos e com menos poluição, mas não têm o encanto das velhas locomotivas do passado.

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Os trens modernos, de aço e não de ferro, levitam sobre trilhos contínuos. Sem emendas e sem curvas, essas máquinas futurísticas flutuam a velocidades de até 500 km/h, na chamada levitação magnética – sem a fumaça do vapor e faíscas da lenha brincando no ar. No futuro, teremos carros com LM – trilhos cortando as ruas, como nos bondes de outrora.

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Outubro se encerra com o Halloween, mais sinistro impossível. Ando pelo condomínio apreciando a decoração – caveiras e abóboras, fiapos de tecido preto esvoaçando ao vento, adornando portas e janelas. Monstros de plástico inflado, um vizinho montou um imenso navio fantasma. O trem fantasma avança no túnel do tempo – correndo em contagem regressiva, sem saber em qual estação desceremos.

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Peguei um trem para o fim da linha, parei na Espanha. No tempo em que Portugal era a face obscura da Europa, entre as cidades superlotadas de turistas ansiosos para queimar os dólares – Paris, Amsterdã, Londres, Roma – Lisboa era ignorada. No entanto, naquela pontinha a oeste do continente europeu, o país se preparava para encantar o mundo. Com muito bacalhau regado ao bom vinho do Porto. Perdi o trem para Lisboa. O primeiro trem do Brasil, em 1854 corria 14 km entre a Baía de Guanabara e a Raiz da Serra, em Petrópolis.

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