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O Gabinete do Ódio

A ação do Facebook desarticulou um grupo que envolve assessores e funcionários de gabinetes políticos

Na quarta-feira, 8 de julho, o Facebook publicou nota dizendo que desbaratou o esquema que no Brasil ficou conhecido como “Gabinete do Ódio”. Tal medida derrubou perfis, páginas, grupos e contas da rede social e do Instagram. O Gabinete do Ódio ficou conhecido primeiro por uma matéria do Estado de São Paulo em 2019.

Em seguida, em março de 2019, começou o inquérito das fake news no Supremo Tribunal Federal (STF), que também envolvia a investigação sobre este tal gabinete. Processos foram abertos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), envolvendo a cassação da chapa Jair Bolsonaro-Hamilton Mourão, com suspeitas de disparos de fake news no WhatsApp detratando adversários políticos de Bolsonaro durante as eleições para presidente no fim de 2018.

Em julho de 2019 foi instaurada a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News no Senado, sob a presidência de Angelo Coronel (PSD-BA), e esta também passa a investigar a existência do Gabinete do Ódio, organização que acabou sendo denunciada por recentes dissidentes do governo Bolsonaro, como Alexandre Frota, atualmente no PSDB.

Joice Hasselmann (PSL-SP), ex-líder do governo no Congresso, por sua vez, prestou depoimento em dezembro de 2019, dizendo que existia um gabinete do ódio em que atuavam três assessores da Presidência da República, estes alojados no terceiro andar do Palácio do Planalto, o mesmo que despacha o próprio presidente da República. Tal atuação desses assessores seria coordenada, por fim, por Carlos Bolsonaro, vereador pelo Rio de Janeiro e filho de Jair Bolsonaro.

Este Gabinete do Ódio teria participação de Tercio Arnaud Tomaz, atualmente assessor especial do presidente, que atuou nas redes sociais na campanha de Jair Bolsonaro para a presidência, e que vinha originalmente de um cargo de auxiliar no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro. Tem-se, ainda, os assessores presidenciais José Matheus Salles Gomes e Mateus Matos Diniz.

Esta foi a denúncia inicial de Joice Hasselmann, que dizia, além disso, que havia um financiamento deste gabinete com dinheiro público. E, falando dos processos que correm no TSE sobre disparos de notícias falsas no WhatsApp durante a campanha eleitoral de 2018 para a presidência da República, esta ainda poderia envolver caixa-dois e banco de contatos de terceiros, ambas práticas condenadas pela Justiça Eleitoral.

A ação do Facebook desarticulou um grupo que envolve assessores e funcionários de gabinetes políticos tanto do clã Bolsonaro (filhos e o próprio presidente) como de deputados estaduais do PSL, que incluem os gabinetes de Alana Passos (RJ), com o ex-assessor Leonardo Barros Neto, que comandava o Bolsoneas, página do Facebook de apoio a Bolsonaro de detração de adversários políticos.

Além disso, o gabinete do deputado estadual Anderson Moraes, PSL-RJ, que abriga a funcionária Vanessa Navarro, esta que duplicava perfis e usava nomes parecidos em outros perfis, assim como fazia Leonardo Barros Neto. Temos o caso do Coronel Nishikawa, deputado estadual pelo PSL-SP, que tinha a atuação do assessor Jonathan William Benetti, também do esquema.

Nesta nota do Facebook, a figura de Tercio Arnaud Tomaz aparece como um dos personagens principais, dono de uma página que saiu do ar e que tinha 1 milhão de seguidores no Facebook, o Bolsonaro Oppressor 2.0, e uma página no Facebook, linkada do Instagram, o Bolsonaro News.

Há, ainda, a figura de Paulo Chuchu, o Paulo Eduardo Lopes, que comandava um veículo de notícia que se dizia independente, mas que era na verdade para enaltecer a figura de Jair Bolsonaro. Ele que atualmente coordena a criação do partido Aliança Pelo Brasil de Jair Bolsonaro em São Bernardo do Campo, é assessor do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que tem também como assessor Eduardo Guimarães, que foi investigado na CPMI das Fake News, por atuar politicamente em páginas e contas da internet na difamação de adversários políticos de Jair Bolsonaro.

O Facebook, para fazer tal ação, atuou em conjunto com a DFRLab (Laboratório de Pesquisa Forense Digital), entidade ligada à organização Atlantic Council, dos Estados Unidos que, desde 2018, atua junto com o Facebook para o combate de disseminação de notícias falsas no processo democrático. O objetivo do DFRLab foi identificar as contas e páginas envolvidas neste Gabinete do Ódio, foi feita a divulgação de nomes, perfis e páginas envolvidas no esquema.

Tal movimentação do Facebook não foi espontânea, mas foi despertada pela pressão dos anunciantes, que deixaram a rede social sob o influxo da campanha Stop Hate For Profit, que começou com organizações sem fins lucrativos e que ganharam adesão de grandes empresas, o que não impacta o lado financeiro do Facebook, que se sustenta de forma mais geral com anúncios de médias e pequenas empresas, mas que tem um impacto político e de imagem enormes, o que levou Mark Zuckerberg a se mexer em relação a isto.

Recentemente, em 27 de maio de 2020, ocorreu a operação da Polícia Federal (PF) sob autorização do relator do inquérito das fake news no STF, ministro Alexandre de Moraes, que foi uma operação de busca e apreensão de equipamentos eletrônicos com possível conteúdo de disseminação de notícias falsas e campanhas difamatórias feitas pelo Gabinete do Ódia e a quebra de sigilo fiscal e bancário de empresários como Edgard Corona, dono da academia de ginástica e musculação Smart-Fit, Luciano Hang, dono da empresa Havan, o humorista Reynaldo Bianchi Junior, e o militar Winston Lima.

A operação ainda apreendeu material eletrônico de figuras como o blogueiro do site Terça Livre, Allan dos Santos, Bernardo Kuster, youtuber do Paraná e diretor do site jornalístico do pretenso guru Olavo de Carvalho, o Brasil Sem Medo, e ainda de Sara Winter, líder do movimento “Os 300 do Brasil”, e também atingiu o presidente do PTB, o famigerado denunciador do Mensalão, Roberto Jefferson.

Por fim, esta ação do Facebook ainda não se trata exatamente de combate de fake news, mas foi classificada como combate de “comportamento inautêntico coordenado”, o que quer dizer que a alegação é de uso de perfis falsos que se passam por repórteres e por administradores de veículos de jornalismo inexistentes, feitos para manipular politicamente e criar uma rede de engajamento.

O bolsonarismo, nesta rede do Gabinete do Ódio no Facebook e Instagram, por exemplo, alcança até 2 milhões de usuários destas redes sociais. A ação conjunta do Facebook com o DFRLab não vai atingir a atuação destas redes em seu todo, apenas uma peça foi derrubada, mas é o primeiro sinal concreto da existência deste gabinete, o que era uma suspeita vaga com a primeira reportagem do Estado de São Paulo e a denúncia de Joice Hasselmann em dezembro do ano passado.

Alexandre de Moraes liberou agora, por sua vez, o acesso da Polícia Federal a esta investigação do Facebook, enquanto o inquérito no STF corre em sigilo, no influxo da PL das Fake News do Senado, que vai para a Câmara dos Deputados, com o conhecido Marco Civil da Internet como o regramento vigente, depois do trabalho do deputado federal Alessandro Molon.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog:
http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

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