Finalmente a luz no fim do túnel chega ao meu braço – como um abraço
A primeira vacina surgiu em 1912, e até hoje evitou milhões de mortes causadas por 20 doenças. Um histórico respeitável, sem dúvida. Mas nunca foi tão esperada como nos tempos que atravessamos. Finalmente a luz no fim do túnel chega ao meu braço – como um abraço, nessa maratona iniciada em 13 de março de 2020, o ano que pensamos que seria melhor que os outros.
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Local: estádio de futebol onde um dos proprietários é David Beckham. Grandes tendas brancas foram erguidas no estacionamento, e o piso tem marcas de distanciamento a cada dois metros – que poucos estavam respeitando, mas todos de máscara. Tudo parecido com um circuito de competição, com várias etapas a serem superadas. Primeira etapa, ainda no carro: alguém pede para ver a identidade e confere se realmente estou registrada para esse dia e hora. Fato confirmado, o carro é liberado e entro no estacionamento. Fila para chegar na primeira tenda, onde uma pessoa armada com um termômetro aponta para minha testa.
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Aprovada, ando oito marcas no piso e alcanço a terceira etapa – alguém pergunta se é a primeira ou segunda dose. Primeira, e sigo para a quarta etapa. Pessoas atrás de dois computadores me pedem a identidade e outra vez confirmam se estou no lugar e hora certos. Dali sigo para a segunda tenda, quinta etapa, com duas longas filas de computadores. A cada pessoa que se levantava a cadeira era rigorosamente desinfetada. Sento, mostro os mesmos documentos, respondo às mesmas perguntas e recebo um envelope recheado de papéis informativos, mais um questionário onde devo rubricar cada item, e uma declaração jurando saber que: não sou obrigada a vacinar; não receberei indenização caso vire jacaré. Mas me darão um bom lago para morar.
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Finalmente adentro a terceira tenda, dividida em muitas cabines – a sonhada sexta etapa. Mais perguntas, quatro pessoas atendendo cada vacinante, outra cadeira devidamente desinfetada. Um vidrinho minúsculo, uma agulha gigante, e a aguinha milagrosa da Pfizer chega ao meu braço – sem doer. Uma via crucis que durou 11 meses, uma caminhada que durou uma hora. Alguém pergunta se estou bem e me mandam para a terceira tenda, sétima etapa, com mais cadeiras desinfetadas, onde devo esperar 15 minutos antes de partir. Com direito a lanchinho: crackers, garrafinhas de água mineral, suco de laranja e de maçã.
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Recebo o papelzinho indicando a data da segunda dose e me mandam embora, com instruções para continuar com os cuidados anteriores até todo mundo ser vacinado. Aí faço as contas – Se todo esse zelo ocorresse em todos os postos de vacinação mundo afora, com a população mundial alcançando 7.845.458.558 até o momento em que escrevo esse último parágrafo totalmente desnecessário, e que mesmo com tantas mortes, o amor e o destino acrescentam diariamente mais 216.500 indivíduos a esse maltratado planeta, quando finalmente estarão todos vacinados? Sem falar numa possível terceira dose. Em tempo: não havia exército nem polícia no local – todos eram da área de saúde.