A Assembleia tem a obrigação de estimular a análise de questões que afetam toda a sociedade
Chega ao Espírito Santo mais uma articulação com vistas à construção de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para alterar o Pacto Federativo, fruto da Constituição de 1988 – a Constituição Cidadã. Entra no mesmo escopo do chamado Plano Mais Brasil, ou a “PEC da Desigualdade”, cria do ministro da economia, Paulo Guedes, desde 2020 no Congresso Nacional, este com a finalidade de tornar o Estado Brasileiro menor, com favorecimento à área empresarial, o mercado.
O plano é estimulado pelo deputado estadual Fabrício Gandini (Cidadania), presidente da Comissão de Justiça da Assembleia Legislativa, que promoveu uma audiência pública híbrida na noite da última quinta-feira (14). O debate estava lançado, mas, ao que parece, a um círculo restrito. A apresentação ficou a cargo do deputado estadual por Santa Catarina Bruno Souza, do partido Novo, defensor ferrenho da ideologia do liberalismo desde a época em que era vereador em Florianópolis.
No centro do evento, um projeto que busca permitir maior autonomia legislativa, já acolhido nos estados de Alagoas, Ceará, Mato Grosso, Paraíba, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte e Santa Catarina. E está tramitando em outros sete: Bahia, Mato Grosso do Sul, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Tocantins, além do Espírito Santo. Será necessário o parecer favorável de 14 casas legislativas para se transformar em Proposta de Emenda Constitucional (PEC).
O argumento de que o plano trará mais “poder decisório” em determinados assuntos para as unidades da federação, como águas, energia e telecomunicações; trânsito e transporte; e normais gerais de licitação e contratação, entre outros, encanta os incautos. No entanto, se levado em conta o histórico do parlamentar visitante e do seu partido, deve-se ficar de orelha em pé.
O banqueiro e ex-bolsonarista João Amoedo, presidente do Novo, é defensor de propostas que resultaram em perdas de direitos da classe trabalhadora e cortes de recursos financeiros que afetam a pesquisa, saúde, segurança e o meio ambiente, na mesma linha do ministro da Economia, Paulo Guedes, que é dono de uma offshore em paraíso fiscal e comanda uma política que arrasta o Brasil para uma de suas mais profundas crises, afetando principalmente os mais pobres.
Neste momento não pode ser esquecido o pacote de maldades do governo Jair Bolsonaro, do qual fazem parte as reformas da Previdência, já aprovada, e a Administrativa, objetivo de mobilização dos servidores públicos de todo o País. Esse movimento tenta evitar a precarização do serviço público que afeta a sociedade como um todo, com a ampliação de possibilidades de privatização de empresas atuantes em áreas essenciais à sociedade, entre elas saúde, educação, saneamento e segurança.
A Assembleia Legislativa, por, pelo menos em tese, representar o povo, tem a obrigação e o dever democrático de promover a discussão em torno de questões que afetam diretamente a todos, o que, certamente, irá desmascarar as más intenções da gestão Bolsonaro e de seus seguidores país afora. As entidades representativas da sociedade, incluindo os movimentos sociais, da mesma forma, devem cobrar de seus representantes posicionamentos que estão acima de questões meramente identitárias, porque se trata da defesa da Constituição, um conjunto de normas e regras que determina ações para todo o tecido social.
A partir de obrigações do Estado estabelecidas na Constituição de 88, que resgata a proteção à parcela mais vulnerável economicamente da população, qualquer alteração no Pacto Federativo deve merecer um debate aberto a toda sociedade. E a Assembleia Legislativa tem o dever de adotar esse tipo de procedimento não apenas em relação à iniciativa de Gandini, mas, igualmente, em temas importantes, que passam batidos no legislativo estadual, com raras exceções. Mas do que necessário, o debate é imperioso.