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Para Lina, rosa choque era o novo preto

 

Tudo dela era rosa, de preferência em estado de choque. Toda garota que se preza tem o chamado pretinho básico, ou coringa, um vestido preto que serve para toda e qualquer ocasião. É o vai-com-tudo, que tanto pode ser usado no escritório como na happy-hour pós escritório, tanto vai à missa como à festa.  Todas as garotas menos Lina – para quem rosa choque era o novo preto.
 
 
Tudo dele era preto. Não por uma questão de preferência, apenas para simplificar a vida. Nada de cores que precisam demorados cálculos para se encaixarem nos lugares certos. Com ele, nada de pés de meia solteiros, calça que não combina com a camisa, gravatas que não vão bem com esse ou aquele terno, ou não são apropriadas para certos momentos. Tanto faz olhar de cima para baixo, ou de baixo para cima, do sapato ao cabelo, tudo em Lino era preto.
 
 
Quando se casaram os amigos riram, Preto combina  bem com rosa chocante. Não combinou. Seus excessos de rosa agridem a vista, ele alega. Seus excessos de preto tornam a casa – e a vida – lúgubre, ela reclama.  Mas iam se aturando, até o dia em que ela cismou de pintar a casa toda de rosa. Quer dizer, a decoração já era toda em rosa, mas depois da reforma ela decidiu que as paredes também deviam se vestir de sua cor favorita.
 
 
Foi demais. Lino aguentava com paciência o mundo cor de rosa de Lina – todas as roupas, pessoais como de cama, mesa, e banho, os azulejos de cozinha e banheiros,  as cortinas, tapetes, poltronas, os assentos das cadeiras, os pratos, copos, talheres… o que mais aguentasse uma cor, era rosa. Até o carro dela era rosa berrante com assentos rosa bebê. Preto, nessa vida a dois, só era permitido nas roupas dele. O que, convenhamos, era muito pouco.
 
 
Ou eu ou seu mundo de princesa da Disney, ele grita. Jamais abrirei mão de minha cor favorita, ela rebate. Tem c asais se separando por menos ainda, bem sabemos.  Para não virar exceção, Lino e Lina se separam, e cada um segue seu rumo. Com certeza as coisas já não iam bem, disseram os amigos, já todos separados e entendidos do assunto. Até que durou muito, disseram os inimigos.
 
 
Mas Lina aprendeu a lição, como sempre pelo método mais difícil – sofrendo. No relacionamento seguinte reduziu a extravagância de rosa a seus objetos de uso pessoal, apenas.  Mesmo porque, o novo amor a chamava de Loura Legal, filme que ela detestou, apesar da explosão de rosa choque. Além do mais, seu amor ao rosa estava virando piada, tanto entre amigos como no trabalho.
 
 
Lino continua sozinho, pelo menos até o momento em que você lê essa coluna. Depois, não garanto.  Mas a solidão lhe ensinou, também pelo método mais doloroso, que a vida era melhor com Lina, apesar de sua aquarela cor de rosa. E como na partilha dos bens do casal ele ficou com a casa, achou um jeito de mostrar  a ela seu arrependimento: pintou  todo o exterior de rosa gritante, ton sur ton com  portas e janelas em rosa bebê.

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