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Procrastinação acadêmica

Na pandemia, uma vala comum

Num país em que o abismo social entre a população apresenta como excluído em torno de 84% das pessoas, fica muito difícil ter como prioridade a educação, até por que precedem a vida, a moradia, a alimentação e o sustento.

Durante a pandemia do novo coronavírus, aquilo que estava muito ruim conseguiu ficar ainda pior. A Educação à Distância – EAD estabeleceu-se sem o menor preparo da comunidade acadêmica. Enquanto os órgãos oficiais, muito preocupados em “não perder o ano letivo”, estabeleciam as regras da modalidade, muitos dos alunos e também professores mal conseguiam dominar os equipamentos e a tecnologia, resultando em aulas medíocres e a desmotivação de toda a comunidade acadêmica. Isso sem contar o problema da exclusão digital, que retira a possibilidade de participação em qualquer medida.

Por isso precisamos entender, que relegar a educação a segundos planos não é só uma ação dos estudantes, que estabelecem outras prioridades, embora possamos perceber que, mesmo nesses casos, a procrastinação não é autêntica, porque não acontece por simples negligência ou priorização de atividades mais prazerosas, mas por necessidade imperiosa. É também ação do Estado, dividido entre os interesses do povo que representa e a pressão de grupos econômicos que transformaram a educação em negócio e a missão de educar em “produzir” o educando como “boa peça” para o mercado de trabalho.

A consequência é uma formação muito distante da necessária à vida, ao reconhecimento de si, do outro e do mundo, resultando no enfraquecimento espiritual de todo o povo.
Naturalmente, atitudes procrastinadoras da educação pelo Estado só aumentam as desigualdades e o abismo social, uma vez que as classes sociais privilegiadas têm recursos que as protegem das intempéries oficiais e conseguem se sobressair ainda mais no contexto competitivo da sociedade capitalista em sua pseudo meritocracia.

A educação deveria ser a prioridade do Estado para todos os seus cidadãos, até por que é para a vida em comunidade que se dá a educação ocidental, e os custos de uma educação procrastinada são muito maiores, bastando para isso comparar o custo de um aluno na rede pública com o de um prisioneiro nos cárceres do Estado. A diferença é pelo menos de 10 vezes maior com o prisioneiro e, o nexo da reflexão, está nos dados da escolaridade desses encarcerados, fornecidos pelo Infopen em 2017, mostrando que chega a 51,35% dos que entram no sistema prisional com o ensino fundamental incompleto.

A ação irresponsável do Estado na manutenção desse abismo social, principalmente pela procrastinação da educação, traz grandes danos e prejuízos materiais a sua população, mas muito mais que isso, encurrala uma parcela imensa da população nas favelas e submundos, sem perspectivas de realização e identidade, tornando esses territórios, cada vez mais, uma ameaça à paz social da minoria privilegiada que vive fora deles.

Além de tudo isso, inflaciona as forças de segurança e multiplica os presídios como forma de proteção desses 16% de privilegiados.

Resta saber até quando essa corda pode ser esticada.

Everaldo Barreto é professor de Filosofia

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