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Se tudo der errado, poupe o mensageiro

Outro dia assisti a uma cena revoltante no shopping: a moça bem vestida sai do toalete arrastando um longo fio de papel higiênico grudado no sapato, branco como véu de noiva. Algumas lojas depois, uma funcionária limpando o chão vê o vexame e a chama, “Ei, moça, seu sapato.” A moça olha pra baixo e envergonhada limpa o sapato. O que você faria na mesma situação? Agradecer com um sorriso, espero. A moça bem vestida sai pisando duro, não agradece e ainda fulmina a humilde funcionária com um olhar arrasador. Como se fosse a culpada!

*

Nos tempos antigos isso se chamava matar o mensageiro, e tinha muitas conotações. Aliás, ainda tem. O rei sentado em seu desconfortável trono passa o dia inteiro aguardando ansiosamente o resultado de uma batalha que poderá mudar seu destino: morrer no trono com problemas na coluna ou no cadafalso, sem a cabeça. Lá vem o mensageiro, o cavalo bufando de cansaço, o cavaleiro bufando de alegria… ou de pavor. Se disser que ganharam a batalha, será presenteado e promovido; se disser que perderam, morre pela honra do reino.*

Se você avisar sua amiga que viu o noivo dela agarrado com outra numa boate, a amiga vai lhe abraçar e vocês vão chorar juntas? Duvido! O primeiro ataque de raiva cairá sobre sua pobre cabeça bem intencionada. ‘Você sempre foi invejosa!’ Já vi muitas amizades acabarem assim, e mais das vezes, o noivo é perdoado, caso ele queira ser perdoado. Às vezes o incauto mensageiro é o telefone: a vítima ouve a arrasadora notícia e joga o receptor na parede. O que o coitado tem a ver com isso? “Maldito!” O noivo ou o receptor?

*

Hoje em dia o mensageiro será provavelmente o celular, mas como custa caro ganha apenas uma violenta sacudileta, que dói do mesmo jeito. O mesmo acontece com o médico: Infelizmente os resultados dos seus exames… ‘Quero ouvir uma segunda opinião!’ Uma ofensa à capacidade do profissional! Se o resultado for negativo o paciente sai sorrindo, ‘O senhor é o melhor médico do mundo!’ Se perguntar ao especialista que tirou sua radiografia o que ele vê no RX, ele vai dizer, ‘O doutor é que entende disto.” Uma simples radiografia com a mancha do tamanho do buraco negro no universo!

*

A história tende a ignorar as figuras menores da História, mas vejamos a situação pelo lado do mensageiro. A batalha está perdida e o reino cairá nas mãos dos bárbaros. Final inglório, mas Dona História não perde tempo com os perdedores. Então por que o mensageiro, tendo um bom cavalo, não foge ao invés de ir dar o recado? Eu, no caso, gritaria para o cara que aguarda ansioso lá no alto dos portões do império: “Vai lá e conta pro rei…” E pernas pra que ‘te’ quero! O guardião atrás das muralhas não tem cavalo, portanto chama a sogra, que sempre diz que ele não tem iniciativa, “Vai lá…”

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Outro detalhe histórico ainda pouco esclarecido: a expressão pejorativa ‘povos bárbaros’ não se referia aos que comiam sem talheres: tudo que não fosse romano era bárbaro, ou seja, os povos do norte da Europa. Mesmo depois dos bárbaros invadirem o ex-poderoso império a profissão de mensageiro continuou sendo muito arriscada. “Senhora, seu marido manda avisar que parte para a guerra dos 100 anos. Portanto, mandou lhe entregar o novo cinto de castidade…” Morreu ali mesmo, e o cinto foi trancado no cofre real, até que o marido volte, vivo ou morto.

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