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​Sim, existe resistência!

Protestos no Estado contra Bolsonaro envolvem milhares de pessoas dispostas a lutar contra o autoritarismo

O enfrentamento às ações de um governo comprovadamente irresponsável na condução do combate à pandemia é o maior destaque da visita de Bolsonaro na última sexta-feira (11), demonstração clara da queda livre do presidente na aceitação popular, como mostra pesquisa XP/Ipespe, divulgada no mesmo dia. O Estado onde o então candidato, hoje presidente, recebeu mais de 63% do total de votos em 2018, certamente não registra mais esse percentual, consequência direta de sua gestão, totalmente alheia à dor coletiva gerada por quase 500 mil mortes, mais de 11 mil no Espírito Santo.

A onda de protesto contrária à visita revelou centenas de pessoas dispostas a resistir à investida fascista que marca o atual governo, no uso e abuso de um palavrório autoritário e recheado de sofismas – “Onde vocês estiverem eu estarei no meio”, “Meu Exército vai pras ruas” -, e em decisões cujos resultados são desastrosos ao futuro do Brasil. Ele segue entregando ao capital financeiro ativos como o pré-sal e consolida o país na condição de pária na geopolítica mundial.


No meio de cenas grotescas ainda no desembarque, no aeroporto de Vitória e no palanque armado em São Mateus, circulavam lideranças políticas locais tentando furar a barreira formada por seguranças para conseguir pelo menos uma selfie com o “Mito”. Nesse cenário, não há como não lembrar a cena do comício do filme Terra em Transe, de Glauber Rocha, 1967, uma amostragem do Brasil da ditadura militar, muito semelhante ao país (des)governado por Bolsonaro.
A luta pelo poder, tanto na obra de Glauber como agora, envolve meios de comunicação, empresários, políticos e militares, como o personagem Vieira, que, no filme, lidera um golpe político, da mesma forma como vários oportunistas da atualidade transformados em líderes partidários, que agem de comum acordo com generais, coronéis e outras patentes. Também fazem parte do bloco grupos milicianos, nova denominação para mafiosos ou integrantes do crime organizado, e até o guarda esquina, metáfora criada em plena ditadura para designar qualquer pessoa, aquele fanático que, mesmo sem ter autoridade constituída, pode tomar decisões equivocadas, partir para cima de opositores e provocar tragédias.
Foi o que aconteceu no aeroporto de Vitória e em São Mateus. Para contrapor a massa fanática, é formada uma multidão empenhada na construção de uma hegemonia justa, dentro de preceitos democráticos. É nesse contexto que se explica a presença de Maria Clara Gama, a dona do cartaz que enfrentou a massa bolsonarista, sozinha, denunciando as mortes da Covid no Aeroporto de Vitória.
Mesmo hostilizada e ameaçada de agressões e com xingamentos, ela não retrocedeu. É parte de uma massa formada por milhões de brasileiros anônimos, que contribuem na resistência, como os que doaram recursos para a produção de painéis e cartazes da campanha “Fora Bolsonaro” colocados em avenidas da Grande Vitória e em São Mateus, ponto alto da viagem e onde foi inaugurado um conjunto de casas populares, para justificar a passagem pelo Estado.
Por conta disso, o jogo eleitoral se altera, com desvantagem para os aliados de Bolsonaro, de forma mais intensa junto ao eleitorado do ex-senador Magno Malta (PL), que tenta retornar ao Senado e pode bater de frente com o deputado federal Da Vitória (Cidadania), também interessado na única vaga. A lista inclui os também deputados federais Neucimar Fraga (PSD) e Soraya Manato (PSL), todos de olho na reeleição, e Evair de Melo (PP), que tenta alçar voos mais altos rumo ao Palácio Anchieta, caso ganhe do ex-deputado Carlos Manato (sem partido) na disputa interna do bloco bolsonarista.
O saldo da visita ao Estado, na realidade, são reduzidos dividendos políticos para a eleição de 2022, cujo tom de campanha eleitoral antecipada é dado por Bolsonaro, com dinheiro público, seja aqui ou em São Paulo, como ocorreu nessa sábado (12), com a motociata que custou aos cofres públicos R$ 1,2 milhão. Esse abuso já está nas redes sociais e na mídia independente, por meio de denúncias sobre essas viagens de campanha, cujos reflexos irão impactar o processo eleitoral.
Para agravar a situação, há a omissão das instituições, talvez temerosas diante do risco de um golpe antidemocrático, com apoio de parte das Forças Armadas. Esse movimento já está esboçado se levado em conta o comportamento do comando das três corporações militares e do Supremo Tribunal Federal (STF), que se calam às declarações de Bolsonaro ao referir-se ao pleito de 2022. Prevendo uma derrota para o ex-presidente Lula (PT), ele se antecipa e usa o velho chavão da direita e diz que pode haver fraude, da mesma forma que Aécio Neves (PSDB) ao ser derrotado por Dilma Rousseff (PT), fato que possibilitou o golpe de 2016 e a sua eleição.
Esses métodos, no entanto, não conseguem parar a resistência popular, que sai fortalecida da visita, ampliando a base de uma nova manifestação prevista para o próximo dia 19, ainda no embalo da grande concentração do final de maio, que movimentou o país. Esse quadro é decorrente do crescimento da indignação e a revolta, demonstradas no comportamento de multidões de pessoas que não aceitam nem temem a ingerência de instituições militares, refesteladas em espaços reservados à população civil, ferindo a Constituição.
Outras Marias Claras se espalham pelo Espírito Santo e também país afora e isso fará a diferença na campanha eleitoral de 2022, de forma mais direta junto aos aliados de Bolsonaro.

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