Novas configurações do trabalho e economia exigem diagnósticos e debates
Buscando informações sobre o fortalecimento da democracia e a construção de um projeto democrático e popular que consiga valorizar a classe trabalhadora, gerando empregos, renda e condições dignas, que entendo ser o melhor meio de promover a igualdade social, encontrei boas reflexões e análises.
Segundo o Centro de Análise da Sociedade Brasileira (CASB), com o objetivo de aprofundar o entendimento sobre as mudanças na sociedade brasileira para produzir diagnósticos e auxiliar nosso povo trabalhador na tarefa de despolarização da sociedade e das instituições; e com o compromisso dos trabalhadores na unificação e organização do campo democrático popular, foi organizado um Grupo de Trabalho (GT) para ampliar a escuta em direção aos especialistas e pesquisadores (da academia, de movimentos sociais); e também levantar dados da opinião pública.
No mês de abril de 2023, o GT promoveu um debate sobre como as mudanças na configuração da classe trabalhadora brasileira impactam na cultura política de milhões de brasileiros e brasileiras. Entre as expositoras, estavam Adriana Marcolino, técnica do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócios Econômicos (Dieese), e Rosana Pinheiro Machado, antropóloga e professora titular da University College Dublin.
Segundo Adriana Marcolino:
No País, há 175,1 milhões de pessoas em idade ativa (PIA -pessoas com 14 anos ou mais). Cerca de um quinto da população (19%) está subutilizada.
Os trabalhadores por conta própria (com ou sem CNPJ) somam 21,8 milhões.
Entre setor público e privado, somam-se 30,6 milhões de brasileiros com carteira assinada, apenas 31%.
Sindicalizados não somam11% da classe trabalhadora brasileira.
A reforma Trabalhista de 2017 estabelece mecanismos de negociação individual e procura enfraquecer a negociação coletiva.
41,8% dos trabalhadores informais estão totalmente expostos e descobertos de proteções legais.
As formas de trabalho que mais crescem no mundo são os trabalhos temporários, em tempo parcial, intermediados (subcontratados ou terceirizados) ou o trabalho por conta própria precário e subordinado.
O número de trabalhadores por conta própria cresceu 5 milhões entre 2012 e 2022 (de 20,5 para 25,3 milhões).
O trabalho por conta própria é mais sensível à condição da economia e registrou movimentos bruscos de desengajamento de trabalhadores ao longo dos 10 anos (“acompanhando” os momentos econômicos do país).
Nestes dez anos houve redução do seu rendimento mensal médio: de R$ 2.013,00 para R$ 1.991,00. Além disso, a renda média revela que a experiência da precarização articula elementos de gênero e raça.
O trabalhador por conta própria, em geral, não tem uma ocupação única. Ele transita entre a formalidade e a informalidade, podendo ter mais de uma ocupação.
Pesquisas qualitativas mostram que o trabalhador autônomo/por conta própria pode tender a uma defesa do trabalho informal sem, necessariamente, almejar o vínculo CLT.
As razões giram em torno de:
Percepção de cumprir um horário mais flexível que no regime CLT “aqui, não tem que bater ponto”.
Percepção de renda mais elevada que o valor do salário-mínimo.
Percepção de ausência de figura hierárquica, “chefe”, controlando horários, hábitos e comportamento.
Os relatos encontrados em campo apontando as “vantagens” do trabalho por conta própria são, muitas vezes, associados a relatos de assédio por parte do superior hierárquico no ambiente de trabalho. O que mostra que a negação não é em direção ao trabalho em si, mas às condições em que o trabalho formal se dá. Além disso, entre o público investigado – trabalhadores de baixa e média renda das periferias, ser autônomo e/ou empreendedor confere status, conferindo a estes trabalhadores (mesmo que precarizados) uma sensação de autoestima.
A antropóloga Rosana Pinheiro Machado alerta:
O “trabalhador em busca de uma vida melhor” é impulsionado pelo algoritmo a uma rede de influenciadores motivacionais (dão dicas sobre “como ser empreendedores”, “como chegar ao primeiro milhão”); e de religiosos divulgando a teologia da prosperidade; entre outros perfis que estão alinhados ao conservadorismo de direita – estima-se que 88% dos influenciadores brasileiros são alinhados ao conservadorismo de direita. Quanto mais inseridos no mundo digital, mais inclinados ficam a aderir a projetos autoritários.
Neste contexto, a desinformação atua no “medo” desses trabalhadores por aplicativo perderem sua fonte de renda. Notícias como “Lula vai expulsar Uber do Brasil” repercutem muito entre os motoristas e entregadores.
Mesmo que se sintam frustrados e desassistidos, organizam e canalizam a revolta no sentido inverso ao problema inicial. Num processo de “Revolta Ambígua”, o problema não é a exploração da plataforma e a perda de direitos, mas a “esquerda como politicamente correto e contra a família”.
Com essas informações, se faz necessário realizar mais debates, estudos e pesquisas sobre a classe trabalhadora e suas diversas categorias no Brasil, buscando identificar as brechas dentro dessa nova realidade para a construção de um diálogo amplo, que considere além das questões de classe trabalhadora, também as de etnia e gênero nesta busca de igualdade. sendo exemplo de lutas e conquistas para todo o mundo.
Uma sociedade que se propõe a ser democrática e popular precisa ouvir os diversos setores para construirmos um projeto de vida que inclua todos os cidadãos e cidadãs no seu orçamento, na sua economia, pois só assim construiremos uma sociedade de iguais, sem preconceitos e discriminação de qualquer natureza.
Unir, organizar e mobilizar, para construirmos a sociedade que merecemos.