Alegando que o trabalho da polícia é apenas investigar e não acusar, o delegado Rodolfo Laterza, que comanda a força-tarefa que apura denúncias de corrupção no Instituto de Atendimento Socioeducaivo do Espírito Santo (Iases), deixou claro que estava respeitando a orientação de não envolver o secretário de Justiça Ângelo Roncalli no caso.
Durante a coletiva da última sexta-feira (17), quando anunciou as prisões de 13 pessoas e deu os detalhes da “Operação Pixote” – como foi batizada a investigação que apura diversos crimes de corrupção no Iases e na Associação Capixaba de Desenvolvimento e Inclusão Social (Acadis) –, o delegado se esquivou das perguntas que questionavam se havia indícios da participação de Roncalli no esquema montado por Silvana Gallina e Gerardo Mondragón – respectivamente diretora-presidente do Iases e presidente da Acadis – na autarquia
Laterza se limitou a dizer que o secretário estava disposto a colaborar com as investigações. As declarações que Roncalli deu aos jornais no dia seguinte (18) à explosão do escândalo, também deixaram claro que o secretário, mais uma vez, estava se fazendo de rogado. Ele chegou a dizer que tomou conhecimento dos fatos com surpresa, já se isentando de qualquer responsabilidade sobre os fatos.
Embora no discurso tente passar para a sociedade que está disposto, se for preciso, a “cortar da própria carne” para punir os culpados, Roncalli sempre acompanhou o que se passava no Iases. Ele também era ligado as pessoas que faziam parte do esquema, todas de sua confiança. Portanto, não justifica o secretário alegar que o Iases é uma autarquia com autonomia técnica, administrativa e financeira, dando a entender que ele não tem nada a ver com isso.
As justificativas de Roncalli são facilmente derrubadas quando analisamos o caso de um dos presos. Antônio Haddad Tápias é servidor efetivo do Iases (técnico de nível superior), mas desde maio de 2011 fora requisitado pelo próprio Roncalli para assumir o cargo em comissão de assessor especial. Por mês o servidor, que permanece preso, recebe R$ 12 mil para assessorar Roncalli.
Qualquer funcionário do Iases sabe que Toninho, como é conhecido entre os servidores, sempre foi o braço de direito de Gallina. Em outras palavras, era Toninho, na função de diretor técnico do Iases, quem botava a mão na massa. Era ele quem controlava as rebeliões, nomeava ou exonerava os diretores e ditava a linha socioeducativa adotada nas unidades.
Foi ele também que, sempre ao lado de Gallina, validou a entrada do colombiano Gerardo Mondragón e seu Método Pedagógico Contextualizado – surrupiado dos freis amigonianos – no sistema Iases. Toninho e Gallina, que recebiam cobertura política de Roncalli, tiveram carta branca para firmar os contratos com a Acadis que resultaram num escandaloso esquema de corrupção dentro da autarquia.
Ainda sobre as justificativas prévias de inocência de Roncalli, não é demais lembrar que o secretário, conforme prevê a “Lei complementar estadual 314/2004, é o responsável pelo Conselho de Administração do Iases, que tem como principal atribuição fiscalizar a autarquia. É da cota de Roncalli também nomear os membros que fazem parte do Conselho.
A obrigação de Roncalli, na época em que Século Diário publicou uma série de reportagens que denunciava o esquema de corrupção no Iases – seja na condição de secretário ou de presidente do Conselho -era, no mínimo, mandar investigar as denúncias.
Mesmo que não quisesse dar credibilidade às matérias publicadas por este jornal, a obrigação do secretário era apurar as denúncias da sociedade civil organizada. Na ocasião das denúncias, Século Diário entregou os documentos que deram emsamento às reportagens, ao Conselho Estadual de Direitos Humanos e Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Criad), que formalizaram denúncia a diversos órgãos, inclusive à própria Secretaria de Justiça.
Se Roncalli recebeu as denúncias e não as apurou, esse crime também tem nome, prevaricação na modalidade omissiva.