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Artistas capixabas são excluídos de editais nacionais

O desabafo veio de Raphael Gaspar, do Expurgação Filmes, pelas redes sociais: mais um edital nacional em que os produtores culturais capixabas não podem participar. O Oi Futuro, que encerrou suas inscrições na semana passada, atende apenas estados que possuem Lei Estadual de Incentivo à Cultura, que não é o caso do Espírito Santo.
 
“Não é o primeiro edital que vejo em que a gente fica sem poder participar. Quem perde é o Espírito Santo, que poderia se mostrar artisticamente, perdemos patrocínios importantes para o trabalho cultural. Percebemos o quão estamos atrasados em relação ao Sudeste, pois somos o único estado da região que não tem a lei de incentivo”, reclama Léo Alves, produtor cultural da Caju Produções.
 
Hoje são 14 estados os que possuem leis vigentes nesse sentido. A Oi informou que seria possível aos capixabas se inscreverem no edital em parceria com alguma empresa ou produtor de um estado que possua lei de incentivo, mas resta saber se tal “gambiarra” seria realmente efetiva, ou seja, se alguma dessas leis permitiria aprovar, por exemplo, um projeto a ser totalmente executado no Espírito Santo, o que parece pouco provável.
 
Histórico
 
Algo interessante a se observar é que o Estado já contou com uma Lei de Incentivo para projetos culturais. De autoria do deputado Enivaldo dos Anjos, a Lei 6.233 foi sancionada em 2000 e previa dedução de até 3% do total do ICMS para as empresas para investimentos em projetos culturais. Isso aparentemente resolveria o problemas de editais como o Oi Futuro e outros. 
 
Porém, os incentivos foram revogados em março de 2003, logo no início do governo de Paulo Hartung, na mesma época em que o Conselho de Cultura foi desarticulado, ficando sem se reunir até 2008. Nesse período de quase cinco anos, o Espírito Santo ficou sem uma política estadual estabelecida para financiamento do setor cultural.
 
Em agosto de 2008, em convênio do programa Compete-ES, o governo passou a permitir isenção fiscal por meio de ICMS para o Instituto Sincades, vinculado ao empresariado do setor atacadista, que logo teve suas práticas e falta de transparência questionadas pela classe artística e seus representantes no Conselho de Cultura então reativado. Tecnicamente, o Instituto Sincades teria se tornado o beneficiário único dos incentivos de ICMS para a cultura.
 
Pouco depois, ainda em 2008, foi criado o Fundo de Cultura do Estado do Espírito Santo (Funcultura), com recursos próprios do Estado, que passa a valer a partir de 2009. Anos depois, alegando falta de recursos, o governo passou a complementar o fundo com recursos do Instituto Sincades, ou seja, dinheiro público por meio de isenção fiscal. 
 
A parceria entre Sincades e governo terminou em 2015 e, desde então, o Funcultura é gerido apenas com recursos próprios do Estado. A Secretaria de Estado da Cultura (Secult) indicou que a forma de acesso de artistas e produtores culturais capixabas a recursos a nível estadual é por meio de concorrência no edital anual do Funcultura e que não tem conhecimento de projetos vigentes de isenção para isenção de ICMS para a cultura.
 
O total de recursos do Funcultura para o ano passado foi de R$ 8 milhões, acrescidos de R$ 2 milhões de recursos do governo federal para o setor audiovisual, fruto da mobilização da própria categoria e suas entidades, conforme relata Igor Pontini, conselheiro de cultura para o setor audiovisual.
 
Há que destacar que o Funcultura também encontra-se praticamente estagnado em termos de valor de investimento desde 2013, num período em que a inflação acumulada chega mais de 30%.
 
Enquanto isso, nos editais públicos nacionais, produtores afirmam que há grande dificuldade de acessar recursos por conta do Espírito Santo concorrer na cota entre os estados mais desenvolvidos, como os da Região Sudeste.
 
Política cultural
 
Muitos produtores consideram que o Funcultura passa muito longe de ser suficiente para atender o setor da cultura. O gestor cultural Pedro Padilha, que integrou o Conselho Estadual de Cultura por dois mandatos, considera o recurso uma “migalha” colocada para os artistas disputarem entre si.
 
Quando conselheiro, ele foi autor junto a outros colegas de uma proposta de lei que estabelecia de forma abrangente um sistema de políticas públicas de cultura para o Espírito Santo, prevendo inclusive a questão do financiamento. O projeto chegou a ser enviado pelo governo para a Procuradoria Geral do Estado (PGE), mas foi retirado depois de algum tempo pela Secretaria de Cultura, apesar de não ter recebido nenhum parecer desfavorável, segundo o relato de Padilha.
 
Depois, em 2013, foi a própria secretaria quem apareceu com um projeto de lei, consultando os conselheiros e encaminhando um projeto para concessão de incentivos fiscais para a cultura. Porém, o projeto teria sido barrado pela PGE.
 
O próprio Pedro Padilha considera que a isenção de ICMS não é o modelo ideal de financiamento, pois coloca nas mãos do setor privado a seleção de projetos. E que o imposto pago pelo empresário poderia ser melhor direcionado por meio de uma política cultural estabelecida. Mas esta não é a realidade nem a nível nacional nem municipal.  
 
Nesse sentido, há um debate de fundo sobre entendimentos dos rumos das políticas culturais. Mas na classe artística capixaba parece haver um descontentamento geral, não só por falta de recursos financeiros, mas também de uma política cultural mais sólida.
 
Segue havendo o vácuo de um Funcultura insuficiente e uma ausência de Lei Estadual de Incentivo à Cultura, que impede outra via de captação de recursos para projetos, inclusive de maior envergadura que os do Funcultura. Pese a Lei de Diretrizes Orçamentárias prever isenções fiscais de mais R$ 1 bilhão em ICMS em 2018, esse recurso passará longe de beneficiar o setor da cultura.
 
Segundo relato de Igor Pontini e outros conselheiros, a última vez que o tema teria sido tocado foi durante o #OcupaSecult, em 2015, quando o governo alegou que juridicamente não era possível fornecer isenção de ICMS para a cultura justamente por conta da existência do Compete-ES.  Desde então está fora da pauta do governo e da classe artística. E enquanto essa greta segue aberta, editais vão passando e o Espírito Santo perde as oportunidades de transbordar a cultura e indetidade capixaba.

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