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Coletivos usam a criatividade como matéria-prima para novos projetos

As pequenas empresas e os coletivos culturais têm sido uma alternativa àqueles que pretendem realizar projetos próprios que envolvem o desenvolvimento social e cultural da cidade onde vivem. Essas iniciativas se encaixam no conceito de Economia Criativa, um setor que transforma criação em recursos, produtos e serviços e que, de acordo com o Ministério da Cultura, está distribuído em 13 áreas: arquitetura, publicidade, design, artes, artesanato, moda, cinema, televisão, editoração, artes cênicas, rádio, tecnologia e música.
 
“A Economia Criativa não é envolve necessariamente a criação de uma nova dinâmica de geração de capital, mas sim a capacidade de potencializar os processos produtivos e seus capitais”, sintetiza o pesquisador Orlando Lopes. O professor de literatura da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) teve um projeto de pesquisa sobre o tema contemplado pelo Ministério da Cultura e investiga a conceituação e o desenvolvimento desse novo setor no Espirito Santo. 
 
Por não ter formação específica na área de economia, Orlando busca lançar um olhar alternativo a essa produção. Ele escolheu trabalhar com os coletivos que atuam na Grande Vitória, entre eles, o Assédio Coletivo, Casa Libre, Coletivo Expurgação e o Arranjo Produtivo Corredor Criativo Nestor Gomes. “Escolhi esses grupos porque de alguma forma eles atravessam a universidade e um dos meus objetivos é auxiliar nesse contato, gerando assim mais oportunidades para atuação”, explica.  
 
Os coletivos culturais selecionados são formados em sua maioria por jovens ativistas que sentem a necessidade de participar da cidade, da política e da cultura. O professor explica que além de esses grupos pensarem em serviços e eventos que possibilitem criar uma renda para se autogerirem, eles também possuem uma responsabilidade social. “É como se, de alguma forma, escapassem das determinações do 'capitalismo selvagem', pensando de forma mais integral. O objetivo final dessas ações nunca é só dinheiro, e sim gerar uma relação de convivência e bem-estar comunitário e social”, completa. 
 
Esse foi um dos motivos que levou Raphael Gaspar a fundar o Coletivo Expurgação, que nasceu em 2007, da junção de amigos que cursavam Desenho Industrial na Ufes. Desde a universidade, Raphael já via o mercado tradicional como um impedimento para desenvolver seus próprios projetos. “A Economia Criativa  é um trabalho autoconsciente, no qual você não apenas repete tarefas e segue ordens, mas reflete sobre o mundo, sobre a responsabilidade do seu trabalho e o que ele significa para a sociedade”, afirma. 
 
 
O Expurgação já se formalizou como empresa há dois anos e hoje é composto por designers, videomakers, músicos, fotógrafos, artistas plásticos e visuais, produtores e comunicólogos, que atuam em audiovisual, artes visuais, produção musical e ações culturais. Raphael comenta que, às vezes, as pessoas confundem o coletivo com uma organização sem fins lucrativos, mas na verdade eles funcionam como uma empresa.  “O nosso diferencial é uma maior responsabilidade cultural e social. Nós promovemos eventos culturais e de preservação ambiental, mas também trabalhamos com a prestação de serviço para clientes”.
 
 
Balancear esses dois lados é um dos grandes desafios dos coletivos. Além dos serviços que inserem os grupos no mercado, há também os projetos feitos de forma independente ou por meio de editais públicos. Para isso, o Coletivo Expurgação precisou dividir a equipe em quatro núcleos: audiovisual, arte, música e ações culturais. E ainda é necessário pensar na gestão da empresa, que precisa captar recursos para se autogerir. 
 
“Para isso tudo se consolidar, precisamos de estrutura, e uma das nossas demandas é pressionar o poder público para oferecer esses recursos. Temos alguns espaços em Vitória, mas alguns estão funcionando parcialmente ou ainda continuam fechados. como é o caso do Teatro SESC, do Centro Cultura Majestic, do Cais das artes e da Fábrica de ideias”, reivindica Raphael. Ele também acredita que é preciso estimular um ambiente empreendedor e promover cursos e seminários de assessoria jurídica e financeira, umas das principais dúvidas de quem quer montar um coletivo ou investir nos próprios projetos.
 
Marina Côrtes , gerente de projetos da Companhia Desenvolvimento de Vitória (CDV), garante que a gestão pública tem incentivado iniciativas de economia criativa. Há um projeto chamado Vitória Criativa, que vai promover apoio técnico e parcerias com a iniciativa privada, seminários informativos e um site com mapeamento desses coletivos e iniciativas. Um dos objetivos é, também, levar a economia criativa para dentro das escolas, por meio de uma grade multidisciplinar, que contemple todas as suas áreas. “Percebemos uma evasão escolar muito alta e uma falta de identificação dos jovens com o mercado tradicional. Então, mostrar para os jovens essas alternativas de trabalho e incentivar a criatividade deles são imprescindíveis para que eles se sintam valorizados”, ressalta.
 
Uma das ações que a CDV tem apoiado é o Arranjo Produtivo Local (APL), que aprovou o projeto Corredor Criativo Nestor Gomes, do qual o Coletivo Expurgação faz parte junto com o Instituto Goya, Instituto Quorum, Livraria da Cultura Capixaba, Ser Vivo e Folgazões. Os empreendimentos envolvidos também recebem consultorias financeiras, administrativa e de gestão, por meio do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
 
Outra promessa é a implantação de um escritório criativo dentro da Fábrica de Ideias, que vai promover o acompanhamento de projetos e conter um laboratório, uma empresa Júnior e uma incubadora de empreendimentos criativos em três áreas: cultura, tecnologia e empresa.

Primeiros passos

Orlando Lopes lembra que o princípio da Economia Criativa envolve “a ética porque esses projetos acabam tocando outras pessoas e outros movimentos e tudo precisa conviver harmoniosamente, reconhecendo a variedade, a diversidade dos agentes e dos processos econômicos”. Para a criação de um projeto com as características da economia criativa é necessário o acesso à informação, seja de forma autodidata, lendo na internet ou em livros, ou participando de cursos e estágios para se obter uma formação inicial.
 
Depois de definir a sua identidade e o caminho que se pretende seguir, outro ponto importante é criar uma rede de conectividade. É preciso criar processos colaborativos, toda a produção envolve diversas fases que dependem de profissionais diferentes trabalhando de forma articulada.  “Assim, o principal passo para entender o sentido da economia criativa é perceber que o resultado do trabalho não vai retornar única e exclusivamente em termos de lucros financeiros, mas também vai gerar bens imateriais e simbólicos tanto para quem produz quanto para quem consome”, reforça Orlando. 

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