Objetivo é manter a tradição entre crianças e adolescentes, em meio aos impactos do crime da Samarco/Vale-BHP
A Comunidade Remanescente de Quilombo do Degredo, localizada em Linhares, litoral norte do Espírito Santo, sofre até hoje com os impactos do crime da Samarco/Vale-BHP, em 2015, que despejou rejeitos de minério no Rio Doce que desaguaram no mar de Linhares. Um dos enfrentamentos a essa situação tem sido pela cultura, com a realização de oficinas de jongo para crianças e adolescentes.
As oficinas de jongo mirim, que terão duração de, pelo menos, seis meses, foram iniciadas no final de 2023, com mais de 40 participantes, durante as atividades do “Novembro Negro” na comunidade, e serão retomadas neste mês de fevereiro. As crianças e adolescentes são inseridas em todos os processos, desde a fabricação dos instrumentos até a composição das cantigas do jongo – uma tradição afro-brasileira que une batidas de tambor, canto e dança de roda.
“A pesca era uma das principais atividades econômicas da comunidade, e o mar e o rio também eram fonte de lazer. Com o rompimento da barragem, ficou tudo proibido. O Conselho Ancestral vinha reclamando muito da ausência de atividades de lazer para as crianças e adolescentes, e por isso decidimos promover essa oficina”, conta Simony Jesus, coordenadora geral da assessoria técnica independente da Associação dos Pescadores, Extrativistas e Remanescentes de Quilombo de Degredo (ASPERQD).
De acordo com Simony, a oficina serve como um resgate de vivências passadas, uma vez que muitas crianças nasceram depois do crime ambiental e não tiveram experiências comunitárias antes disso, e contribui para preservar a tradição. “Somente no ano passado, tivemos três mestres de jongo que faleceram, então a gente está tentando manter a cultura através das novas gerações”, comenta.
Durante o “Novembro Negro”, também foram feitas oficinas de outras atividades tradicionais que haviam se perdido, como a confecção de redes de pesca e esteira. A programação incluiu diversas atividades alusivas ao Dia da Consciência Negra (25 de novembro), e teve a presença de 32 representantes de outras comunidades quilombolas, além de lideranças indígenas.
Elisa Lucinda
Entre os dias 22 e 26 de janeiro, também foi realizada na comunidade do Degredo a oficina “A poesia do Jongo”, ministrada pelo Instituto Casa Poema, que buscou unir a oralidade do jongo com a poesia escrita. A iniciativa partiu de um acordo em uma ação do Ministério Público do Trabalho no Espírito Santo (MPT-ES) contra o Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Linhares (Saae/Linhares).
No recital de encerramento, a poeta capixaba e atriz Elisa Lucinda, fundadora do instituto, marcou presença. “Foi uma ação que agregou muito valor e motivou a comunidade, principalmente por conta da presença de uma artista reconhecida nacionalmente”, celebra Simony.
Projeto reaviva memórias do Quilombo Monte Alegre
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