Karlili Trindade aponta que a luta é para ampliar os recursos destinados à cultura

Os cortes no orçamento da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) têm gerado apreensão entre os trabalhadores da cultura. A iniciativa, implementada por meio da Medida Provisória 1.274, gera incertezas quanto à real execução dos projetos de editais em andamento. Além disso, aponta a integrante do Grito da Cultura, Karlili Trindade, acarreta em preocupação em relação às demais políticas do setor. “Que garantia temos de que o Governo Federal vai cumprir com o prometido, que foi o maior investimento na cultura em toda a história?”, questiona.
Os recursos a serem investidos na PNAB seriam de R$ 15 bilhões, sendo R$ 3 bilhões nos anos de 2023, 2024, 2025, 2026 e 2027. A MP, no entanto, diz até R$ 3 bilhões anuais, o que, portanto, não garante o valor total estipulado antes. Somado a isso, tem o fato de que uma tabela feita pelo Ministério da Fazenda sobre a estimativa preliminar de impacto após os cortes anunciados por Fernando Haddad, gestor da pasta, mostra um investimento de R$ 2 bilhões em 2025. Para os demais anos, R$ 1 bilhão.
O argumento para o corte, segundo o ministro, é de que o montante de 2023 não foi totalmente aplicado pelos estados e municípios, por isso, não é necessário repassar o valor antes estipulado, reduzindo o de 2024 e dos anos subsequentes. Karlili aponta que a iniciativa foi tomada sem diálogo com os trabalhadores da cultura e destaca que o Ministério da Cultura (Minc) “parte do pressuposto que nos municípios há uma estrutura e funcionamento pleno do Sistema de Cultura”.
Ela defende que a responsabilidade do Minc é estar junto das gestões municipais e estaduais para impulsionar a aplicação do recurso, e destaca que, no Espírito Santo, de acordo com levantamento feito pelo Grito da Cultura, somente nove municípios têm secretaria de Cultura: Vitória, na região metropolitana; Divino de São Lourenço, no Caparaó; Conceição da Barra, São Mateus, São Gabriel da Palha e Jaguaré, no norte; e Piúma, Mimoso do Sul e Itapemirim, no sul. Anchieta e Iconha, também no sul, têm gerência. “O restante tem cultura junto a outras pastas”, aponta.
“É importante dizer que há uma luta para ampliação dos recursos para a cultura de longa data, e que a PEC [Proposta de Emenda Constitucional] 150 trata dessa ampliação considerando 2% para a União, 1,5% para os estados e 1% para os municípios. Sendo que a União não aplica nem 1%. Ou seja, fazer a redução de um investimento programado, conquistado em lei, nos preocupa por impactar essa força-tarefa de recuperação do setor após a grande crise”, ressalta Karlili, referindo-se à pandemia da Covid-19 e os governos Temer (MDB) e Bolsonaro (PL). A PEC acrescenta o artigo 216 A à Constituição Federal, para destinação de recursos à cultura, e está pronta para ir ao Plenário da Câmara dos Deputados.
O Fórum Nacional de Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura, o Fórum Nacional de Secretários e Gestores de Cultura das Capitais e Municípios Associados e a Rede Nacional de Gestores Municipais de Cultura, por meio de nota, “manifestaram surpresa e profunda preocupação com a publicação da Medida Provisória nº 1.274”.
“As alterações propostas pela MP e apresentadas de forma intempestiva, desconsiderando a prática de construção compartilhada com os entes executores, comprometem o planejamento local, instauram instabilidade e dificultam o repasse de recursos aos seus verdadeiros destinatários: os artistas e agentes culturais – aqueles que coordenam ações e projetos de impacto para a sociedade”, diz a nota.
O texto acrescenta que “os estados e municípios executaram as leis emergenciais em anos anteriores, haja vista os altos índices de execução da Lei Paulo Gustavo em todo o Brasil – dados apresentados pelo MinC. Porém, com a estruturação de um sistema de cultura ainda em processo, o primeiro ciclo da PNAB impôs significativos desafios ao governo federal, estados e municípios. Apesar de boa parte dos recursos ainda estarem nas contas, eles estão comprometidos em editais recém-lançados ou por lançar, conforme compromisso apresentado no Plano Anual de Aplicação de Recursos por cada ente. Construção fruto de amplo processo de escutada sociedade civil previsto na execução da PNAB”.
O documento destaca que “a introdução de novas regras e prazos desalinhados com as realidades locais agravam esse cenário, ainda mais na operação de editais que naturalmente possuem ciclos longos para a sua plena execução”. As entidades concluem: “é imprescindível que o MinC lidere um planejamento de fato integrado, promovendo um diálogo efetivo e garantindo que a execução e destinação dos recursos sejam realizadas de forma qualificada”.
No Espírito Santo, há editais recém-lançados ou por lançar, como destaca a nota. Em Vitória, as inscrições foram encerradas no final de novembro. Cariacica ainda nem lançou edital. O Governo do Estado lançou os editais nessa segunda-feira (2), com um investimento de R$ 33,3 milhões, somado com recursos do Fundo de Cultura do Estado do Espírito Santo (Funcultura).