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Filme usa arquivos históricos para contar história do Rio Doce

Com narração de Ailton Krenak, Amargo Rio Doce, dirigido por Ricardo Sá, está em cartaz no Cine.Ema

Acervo do Arquivo Público do Espírito Santo 

Uma história do Rio Doce a partir dos relatos de documentos históricos conduz a narrativa de Amargo Rio Doce, junto com a contraposição da fala de Ailton Krenak, uma das mais importantes lideranças indígenas do Brasil, que cresceu às margens do rio que percorre mais de 850 quilômetros de Minas Gerais até o mar do Espírito Santo.

Inspirado numa longa reportagem de mesmo nome (leia aqui) publicada em 1977 no Jornal do Brasil por Rogério Medeiros, jornalista e fundador do Século Diário, o diretor Ricardo Sá realizou junto a Mônica Nitz uma longa pesquisa por bibliotecas, museus e arquivos públicos, por documentos que registrem a história do rio, assim como sua relação com o desenvolvimento do país desde a colônia até os tempos modernos.

O filme foi selecionado para a Mostra Foco Capixaba do Festival de Cinema de Vitória, que acontece entre 24 e 29 novembro, mas já pode ser assistida até o dia 9 de novembro no site do Cine.Ema, mostra de cinema ambiental da qual também participa junto com outras obras.
Montagem/Lucas Bonini

Mônica Nitz classifica o filme como um trabalho robusto de etnografia e arqueologia digital, na busca de reunir 500 anos de registros históricos, desde a chegada dos portugueses ao Brasil até a tragédia do rompimento da barragem da Samarco/ Vale-BHP, em 2015, que derramou no rio uma quantidade absurda de lama tóxica, no maior crimes ambiental do país. “Não me lembro ao certo o tempo que levou essa pesquisa, mas acredito que foi algo próximo de um ano, até nos últimos dias de edição ainda estávamos pesquisando. Mesmo depois que um filme desses acaba, nosso instinto de pesquisa ainda está lá ativo e indo além”, conta Mônica, que assina roteiro e produção em conjunto com Ricardo Sá.

Os textos selecionados de exploradores, desbravadores e viajantes estrangeiros são lidos em suas línguas originais, inglês, francês, alemão ou o português lusitano, permeados pelas imagens retiradas de mapas, livros, decretos, gravuras, pinturas, desenhos, fotografias e vídeos. As imagens em alta qualidade permitiram fazer um trabalho de montagem e animação, realizado por Lucas Bonini, que imprimem a narrativa visual da obra em meio às palavras.

Nos vídeos aparece a propaganda oficial que evidencia o desenvolvimentismo e a ideia de assimilação dos indígenas à chamada “civilização” naquele território que era ocupado tradicionalmente pelos bravos povos de várias etnias que foram classificados pelos colonizadores de forma uniformizante como “botocudos”, pelo uso de botoques nos lábios e orelhas.

Gravura de Jean Baptiste Debret

A primeira versão da obra com os aspectos históricos foi então entregue a Ailton Krenak, que teceu seus comentários que trazem a visão dos povos originários após assistir a prévia, contribuindo para desconstruir a visão oficial e colonial.

Como parte da produção, a equipe do filme foi de carro margeando boa parte do percurso do Rio Doce, desde a foz em Linhares até Minas Gerais, também para observar a atual situação e as formas de vida que ali se desenvolvem apesar das tragédias que se sucedem pelas décadas de mineração, extrativismo e exploração. “Havia partes em que a memória das pessoas do rio era da época das barcas. Alguns trechos do rio eram tranquilos, calmos, e as pessoas faziam piqueniques ou tinham o hábito de tomar banho no fim do dia. Em outros lugares o rio é muito forte, violento, tem histórico de afogamentos. E há partes em que rio é muito profundo, com passeios de barco a outros lugares. Então é muito diverso e longo o Rio Doce”, relata Mônica Nitz.

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