A Federação Capixaba de Teatro (Fecate) divulgou, nessa terça-feira (6), uma moção de repúdio à política cultural do Espírito Santo. A entidade convoca a sociedade civil a refletir e avaliar as práticas da gestão de Renato Casagrande (PSB) no que diz respeito à cultura e à arte. A iniciativa se deu a partir da divulgação dos resultados dos editais do Fundo Estadual de Cultura 2022 (Funcultura), da Secretaria Estadual de Cultura (Secult), comandada por Fabricio Noronha, mas, conforme afirma o grupo, é necessário um debate mais amplo sobre “o papel e o dever do Estado com os segmentos organizados de nossa área e, sobretudo, com a população de maneira geral”.
A Fecate esclarece não ser contra os editais nem os artistas, grupos e coletivos contemplados, mas que é contrária “ao fato de termos os editais como principal eixo de uma inexistente política pública para a cultura. Isso porque os editais são necessariamente excludentes e geram uma lógica de competição entre os artistas e grupos”.
O texto aponta que o Espírito Santo tem 78 municípios e mais de 60 grupos teatrais, e que o último edital para as artes cênicas contemplou apenas cinco projetos de montagem de novos espetáculos. “Outros 18 projetos deixaram de ser contemplados. Se examinarmos a situação, veremos o seguinte: para 78 municípios, apenas cinco novos espetáculos teatrais serão montados através do edital. De mais de 60 grupos existentes no Estado, apenas 23 projetos foram inscritos”, diz a moção.
Diante disso, os artistas concluem que poucos artistas foram contemplados, mostrando que “os editais não dão conta do nosso tamanho e nossa diversidade” e que poucos artistas se inscreveram, indicando que “provavelmente muitos nem tentam, já sabendo que não serão mesmo contemplados, vide a vertiginosa queda do número de projetos inscritos nos últimos anos”. Contudo, o documento aponta algo que considera mais relevante: “quando o Estado falha no seu papel, quem se prejudica prioritariamente não são os artistas ou fazedores de cultura, mas a população”.
“Quando apenas cinco novas montagens teatrais são garantidas pelos editais, devemos nos questionar, em primeiro lugar, quantas pessoas, no ES, terão acesso aos espetáculos, quantas se verão representadas, quanto da nossa complexa realidade será espelhada, discutida, denunciada, celebrada pela cena teatral capixaba. E quanto o governo Casagrande se importa com isso. E só para que tenhamos certeza de que a informação não escapará a ninguém, o direito à cultura – e o papel do poder público nesse sentido – é assegurado pela Constituição”, diz a Fecate.
No documento também são feitas críticas à Lei de Incentivo à Cultura Capixaba (LICC). De acordo com a Fecate, a Secult trata essa iniciativa como “solução para a ineficiência dos editais”. Entretanto, afirma, a LICC é um “retrocesso”, pois segue o modelo da isenção fiscal. “Que fique explícito: o retrocesso não diz respeito à verba destinada, através da lei, à cultura, mas ao fato de essa verba precisar passar pelo crivo da iniciativa privada. Ou seja: um empresário destinará a um projeto cultural parte do imposto que seria pago ao Estado. Dito assim, parece bom, mas não”, destaca o documento
O texto prossegue esclarecendo que “imposto devido é verba pública”. “E quando um empresário decide que projeto apoiar – ou rejeitar – com essa verba, o que temos é a iniciativa privada decidindo o que fazer com o dinheiro público. E tirando proveito disso, já que terá sua marca associada ao projeto artístico que patrocinar e será divulgada por ele. E, no fim das contas, está lá o empresário – que provavelmente não conhece nada de teatro ou cultura – decidindo quais serão os projetos que deverão receber a verba que não é deles”.
A moção finaliza afirmando se tratar do “início de uma longa conversa”, “um convite à reflexão e ao debate”. “Por enquanto, queremos reafirmar o nosso repúdio a um projeto neoliberal que quer jogar a cultura às garras do mercado, em vez de se preocupar em de fato estimular a produção local em todo o Estado e garantir o acesso da população ao que é seu direito básico. E reiterar que é dever do estado atender às demandas do setor, e não papel dos agentes culturais se adequar ao que o estado nos traz pronto”, reitera.