“Nem água deram para a gente”, relata Rei de Congo sobre abandono da escola Imperatriz do Forte, que desfilou nessa sexta no Sambão do Povo
O que era para ser mais uma das tantas homenagens que o Ticumbi recebe ao longo de sua trajetória no Espírito Santo e outros estados, pelo importante papel que representa, tornou-se um transtorno e grande desrespeito. Um dos destaques do samba-enredo e das alegorias da Imperatriz do Forte no Carnaval de Vitória na noite dessa sexta-feira (10), a manifestação folclórica do norte do Estado, uma das mais emblemáticas da identidade capixaba, sequer conseguiu desfilar, devido ao abandono e falta de estrutura da escola.
“Nem água deram para a gente”, protesta Jonas Balbino, Rei de Congo do Baile de Congo de São Benedito de Conceição da Barra, também conhecido como Ticumbi de São Benedito, e filho do saudoso Mestre Terto, hoje substituído por Mestre Berto Florentino. O próprio mestre e outros idosos, muitos com saúde delicada, se deslocaram de Conceição da Barra para Vitória, aceitando o convite para serem homenageados no carnaval, mas se depararam com um despreparo constrangedor por parte dos organizadores.
Ao desembarcarem do ônibus, cedido pela Secretaria de Cultura de Conceição da Barra, na pessoa do secretário Adilson Vasconcelos, não havia ninguém no Sambão do Povo para recepcionar os mestres da cultura popular. Depois de um longo tempo desamparados, foi com a ajuda dos chamados vassalos do Ticumbi (pessoas que não integram o Baile, mas auxiliam o grupo em questões burocráticas e de ordens diversas) localizaram o carnavalesco que havia feito contato com Jonas Balbino meses atrás, para receberem alguma explicação sobre o abandono e direcionar o grupo para o local do desfile.
“Ele apareceu tentando se justificar sobre a desorganização e destratamento com o Baile de Congo São Benedito. Mas não teve como ir para a avenida, porque por volta de 22h30, a escola já tinha entrado. Foi um descontentamento muito grande por parte de todos os membros. O Baile de Congo de São Benedito de Conceição da Barra é conhecido em nível nacional, faz apresentação em outros estados, mas aqui a gente se sentiu desvalorizado”, relata o Rei de Congo.
“A gente veio porque o enredo da escola trata do Benedito Meia Légua, um herói do Sapê do Norte [território quilombola tradicional, localizado entre Conceição da Barra e São Mateus, onde mais de 30 comunidades quilombolas certificadas aguardam titulação pelo governo federal]. Nos prometeram dar transporte, alimentação, lanche após o desfile e fantasias também para as pessoas que nos acompanhavam. Mas fomos desrespeitados. O descontentamento é muito grande”, reforça.
Em entrevista a Século Diário, o carnavalesco se identificou como Vitor dos Santos – este ano, a escola oficialmente teve dois carnavalescos: Vitor Vasale e Victor Faria – e reconheceu que ele era uma das pessoas que poderiam ter feito o recepcionamento do Ticumbi de São Benedito, mas alegou “que devido ao atribulamento de toda a equipe da escola, não contou com condições necessárias para tal, tampouco soube precisar que outras pessoas erraram”.
“Eu estou muito constrangido. A abertura do desfile, a ‘cabeça da escola’ foi toda em homenagem aos festejos do Ticumbi. Nossa ideia era uma varanda no carro para 18 componentes. Foi uma grande decepção”, argumentou.
O diretor-executivo da Imperatriz, Daniel Gomes Modesto, também faz seu mea-culpa e tenta se redimir. “Não foi porque a gente não quis, tanto que fizemos contatos prévios com o grupo, nos esforçamos para trazê-los de Conceição da Barra. Mas na reta final dos preparativos, muita coisa caminhou errado, houve atraso na entrega das fantasias, muitas coisas, o que gerou um desgaste para todo mundo e a gente acabou deixando outras coisas para trás. Agora é tentar reparar da melhor maneira possível esse erro”, declarou, citando o reembolso com os gastos de alimentação e outros que possam ter havido por parte do Ticumbi.
Sobre o descontentamento dos membros, a falta de respeito com essa importante manifestação folclórica capixaba, o desprestígio principalmente com o mestre e integrantes mais antigos…o que pode ser feito?, questionou Século Diário. “Estou muito triste. Ainda fiquei procurando por eles no desfile, achei que tudo estava certo. A escola assume essa situação”, diz o diretor-executivo.