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Lords of Chaos – A Sangrenta História do Metal Satânico

No blues, tem a figura lendária de Robert Johnson, que teria vendido a sua alma ao Diabo

Divulgação

A música sempre teve alguns pontos de polêmica e atritos com o status quo, sobretudo na religiosidade institucionalizada, podendo figurar como o principal ator deste embate o cristianismo vigente e cristalizado, com suas interpretações bíblicas e influências no comportamento coletivo e nos costumes.

A música, de outro lado, trazia certas composições que rompiam com esta bolha de conforto e conformismo cristão, apresentando um mundo livre e desafiador para valores engessados e medrosos. E, logo, temas infensos ao conservadorismo cristão, como ocultismo e satanismo, se desenvolveram durante a evolução temática da música, cristalizadas no rock.

Desde o início das músicas folclóricas da Antiguidade, e as reminiscências e heranças do paganismo, de um mundo pré-cristão, com histórias de magia, necromancia e superstição, saudando o vinho, as mulheres e a própria canção, registra-se uma reação da Igreja no campo musical, com iniciativas que levaram à criação de hinos para suplantar tais canções populares, e a tentativa de monopolização da música foi uma das estratégias da Igreja em determinado período.

No século XX, por sua vez, este preconceito musical atingiu diretamente o Jazz, como um estilo perigoso, aqui cito o livro Lords of Chaos escrito sobre os Rolling Stones, no que diz: “Em seu livro sobre os Rolling Stones, Dance With The Devil [Dança com o Diabo], Stanley Booth cita o jornal New Orleans Times-Picayune em 1918: “para pessoas de certas disposições, o som alto e sem sentido possui um efeito excitante, quase intoxicante, como cores toscas e perfumes fortes, a visão da carne ou o prazer sádico do sangue. Para pessoas assim a música jass [sic] é uma delícia”.

No blues, por sua vez, na associação com aspectos nativos negros e o vudu, com canções que já faziam referências ao diabo, demônios e espíritos, temos a figura lendária de Robert Johnson, que teria vendido a sua alma ao Diabo em uma encruzilhada no delta do rio Missisippi, com Satã lhe dando uma habilidade especial e própria de tocar seu instrumento, num tipo de batida rítmica sui generis e misteriosa.

Robert Johnson gravou apenas 29 faixas, em apenas duas sessões diferentes, se destacando canções como Crossroad Blues (Blues da Encruzilhada), Me and the Devil Blues (Blues sobre Eu e o Diabo) e Hellhound on My Trail (Cão Infernal no meu Caminho). Começou sua vida nas plantations, ao que se seguiu as suas apresentações como músico em casas de show de periferia, conhecidas como juke joints. O fim de sua vida foi aos 27 anos, em 1938, envenenado em um bar, provavelmente pelo dono do estabelecimento que estava sendo traído por sua mulher com o músico.

Por sua vez, o trabalho musical de Johnson saiu do esquecimento na década de 1960, por reedições em LPs que saíram nesta época, e os músicos de blues rock receberam esta obra com empolgação. Portanto, destas canções diabólicas do Delta Blues, podemos traçar uma linha direta que leva ao rock satânico.

Cito especialmente o renascimento do blues norte-americano por obra dos jovens ingleses das novas bandas de rock que surgiam por lá, um grupo de jovens músicos bem informados musicalmente, e que deram importância a um universo que tinha sido esquecido pelos próprios norte-americanos.

Por sua vez, do rockabilly de arruaceiros e delinquentes dos anos 1950, da juventude transviada de James Dean, ao uso sistemático de drogas pelas bandas da segunda metade da década de 1960, associado à experimentação musical, tem-se um certo simbolismo satânico que surge com os Rolling Stones, com músicas como Sympathy For The Devil e um álbum intitulado Their Satanic Majesties Request (O Pedido de Suas Majestades Satânicas).

Particularmente, a música Sympathy For The Devil entra num contexto trágico do festival de Altamont, o fim oficial da era hippie, sepultada por violentos Hell’s Angels, em 6 de dezembro de 1969, evento capturado pela filmagem do documentário Gimme Shelter, em que no começo da execução desta música começa uma grande confusão no público, resultando em uma facada fatal em Meredith Hunter.

Para quem não sabe, os Hell’s Angels são uma gangue conhecida de motociclistas, e estes faziam a segurança do evento de Altamont. Meredith era negro e estava armado, era o fim da utopia de paz e amor que tivera seu auge em agosto de 1969 no festival de Woodstock, com seu momento-chave no chamado Verão do Amor de São Francisco em 1967.

A relação com o ocultismo e a magia negra começou a se desenvolver no rock, e dos Rolling Stones, foram registradas evoluções do tema em outras bandas, ainda tendo no Flower Power da era hippie, este flerte com o misticismo oriental, cultos e seitas, numa relação mais próxima com a natureza, rompendo com as tradições dos “pais”, com uma juventude ávida por liberdade, e que culminou nas teses de expansão da mente e abertura das portas da percepção com experimentos com drogas e a ascensão irresistível do LSD na segunda metade da década de 1960.

O ocultismo passa a viver um novo despertar, adormecido desde o início do século XX, e apareceu um tipo de fetiche com o bruxo inglês Aleister Crowley, chamado de “o mais perverso homem do mundo” pela imprensa nos anos 1930. Sua influência a partir deste renascimento do ocultismo já na década de 1960, e se expandindo na década de 1970, se tornou maior da que tivera em vida.

E temos filmes underground de Kenneth Anger, em que Crowley ganha proeminência, Mick Jagger, dos Rolling Stones, e Jimmy Page, do Led Zeppelin, assinaram trilhas sonoras para os filmes de Anger, inspirados na imagem de Crowley, filmes como Invocation of my Demon Brother [Invocação do meu Irmão Demônio] e Lucifer Rising [Ascensão de Lúcifer].

E o interesse e estudo de Jimmy Page sobre Aleister Crowley ganhou uma proporção de fetiche, com o músico guardando uma coleção de livros, e também possuindo manuscritos originais do bruxo inglês, sendo este seu acervo um dos melhores do mundo sobre Crowley.

Page tinha parte das ações da livraria ocultista Equinox (nome que está num periódico de “magicka” editado entre 1909 e 1914 por Crowley), e comprou e morou, num período, em Boleskine, antiga propriedade do bruxo inglês no Lago Ness, na Escócia. Em Lords of Chaos, temos: “O terreno seguiu perpetuando uma reputação sinistra sob seus novos donos, conforme cuidadores foram internados em sanatórios ou, pior, cometeram suicídio durante sua estadia”.

Gustavo Bastos, filósofo e escritor.
Blog
: http://poesiaeconhecimento.blogspot.com

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