Os festejos de Folias de Reis, ainda muito presentes em alguns lugares do Brasil, foram se perdendo em muitos outros ao longo das últimas décadas, especialmente nas grandes cidades. No Centro de Vitória, um grupo de moradores está buscando mobilização e parcerias para “reviver” a celebração dentro do próximo ciclo natalino, realizando o festejo em 6 de janeiro, Dia de Reis Magos.
Uma das idealizadoras da proposta, Jaqueline Sanz, explica que foi feito um apanhado histórico da manifestação, com a ideia de que possa ser revivida pelos moradores do Centro. “Estamos trabalhando com o conceito de reviver e não resgatar. Reviver dentro de algo maior que é a tradição e as vivências para fortalecimento da cultura da paz. O Centro é um território sociocultural e histórico do Espírito Santo em que hoje coletivos estão reinventando e vivendo tradições”, explica.
Na tradição da Folia de Reis, um cortejo formado por músicos acompanha pessoas que simbolizam os três Reis Magos que percorreram longo caminho até a manjedoura onde nasceu o Menino Jesus, levando presentes. Simbolizando esse momento, passam por várias casas, onde são recebidos pelas famílias. Toda uma tradição e ritos envolvem o processo, com cantos próprios para cada momento, como por exemplo quando o cortejo chega e canta para a família do lado de fora. De dentro primeiro se acende a luz, logo se abre a porta e convida os caminhantes para entrar. O final da festa termina no presépio, que pela tradição, é desmontado no dia 6 de janeiro.
Tudo isso aconteceu por muitas décadas, mas acabou se perdendo no Centro de Vitória. Um dos guardiões desses rituais e conhecimentos na região é Renato Santos, mestre de Congo e de Folia, que foi preparado pelos mais velhos para seguir com as tradições. Ele explica que antigamente “todo mundo sabia o que fazer”. A organização da festa se dividia entre as famílias envolvidas: uma família tocava, outra preparava a comida ou os adereços, outras recebiam os foliões. “Com o passar do tempo muitas famílias mudaram para outro estado e muitos mestres e organizadores morreram, hoje estariam com 100 ou 120 anos”.
Renato conta que a última grande celebração da Folia de Reis no Centro de Vitória aconteceu nos anos 80, embora algumas festas menores ocorreram nos anos 2000, porém em menor escala, sobretudo nos morros do entorno como Piedade e Fonte Grande. “Agora estamos em um processo de ampliar e levar isso para a cidade, porque a cidade que é dona desses festejos e dessas folias”, diz.
Desta maneira, a Folia deve reviver, mas se adaptando à nova realidade do Centro, que se tornou um polo de coletivos e grupos culturais da nova geração. Uma das entusiastas é agitadora cultural Stael Magesck, da Casa Stael, e também integrante da Comissão de Cultura da Associação de Moradores do Centro de Vitória (Amacentro).
“Sou de família do interior que tem a folia no sangue e na cultura, desejava reviver isso. Por ser esse território com vocação turística, cultural e religiosa, nada mais justo que resgatar a folia no Centro, incorporando também esses grupos e coletivos culturais para fazerem parte do circuito. Não perder a essência, mas valorizar o que temos hoje, e fazer com que esses grupos se sintam responsáveis por isso”.
Sendo assim, será feita uma reconstituição das casas que antigamente recebiam os festejos, que voltarão a receber a visita, assim como esses espaços culturais que serão inseridos no trajeto, que começa após a realização de uma missa e termina na Praça Costa Pereira, onde será montado o presépio desde o dia 25 de novembro.
Nos preparativos para “reviver” a Folia de Reis, tem sido organizado todo um ciclo de oficinas e atividades preparativas, começando no próximo sábado (15), às 14h, com a oficina “O Que é Folia de Reis?”, realizada na sede da Fafi na Praça Ubaldo Ramalhete.
“Será uma oficina com métodos de diagnóstico rápido, com ferramentas que incentivam as pessoas a falar, trazendo moradores que viveram a Folia de Reis, para socializar aquela identidade, aquela memória e história. No momento em que estão contando, com toda carga emotiva e afetiva, cada um passa a reviver a folia”. Posteriormente, outras atividades vão contribuir para a preparação dos festejos, como oficinas de Percussão; Figurino e Alegoria; Cantos e Ladainhas.
“Estou pensando em reproduzir exatamente como vi enquanto criança. O objetivo é reproduzir aquele momento, porém, adaptado a outra configuração que temos hoje. Era um momento tão bonito, tão mágico. Havia uma energia no ar, que fortalecia de uma maneira que durava o ano inteiro. Dava uma força para atravessar o ano bem”, conta o mestre Renato Santos, em forma de suspiro.
A Folia de Reis fará parte do Ciclo Natalino do Centro de Vitória, construído em articulação de diversos grupos como a Amacentro, Associação Cultural Capixaba (Cuca), Irmandade de São Benedito do Rosário e Mestre Renato Santos, com apoio de moradores, igrejas, comerciantes, coletivos culturais e poder público.
AGENDA CULTURAL
Oficina “O que é Folia de Reis?”
Quando: Sábado (15/09), 14h às 17h
Onde: Sede da Fafi na Praça Ubaldo Ramalhete, Centro de Vitória.