Foi em dezembro de 2016, quando a Orquestra Sinfônica do Espírito Santo (Oses) realizou um encontro marcante com uma das manifestações populares mais tradicionais do Estado, o Congo. As apresentações aconteceram por cerca de uma semana, também com a colaboração do Coro Sinfônico da Fames e realizando homenagens a dois grandes nomes responsáveis por ajudar a preservar e reconhecer as manifestações folclóricas Estado, o compositor, maestro e poeta, Jaceguay Lins; e o pesquisador Hermógenes Lima – lembrado também pelo centenário de nascimento.
A aproximação da Oses com o congo partiu de uma nova busca da orquestra: o diálogo da música clássica com a vertente popular. Nas apresentações do final de ano, músicos clássicos dividiram os palcos de teatros do Centro de Vitória, com os mestres de bandas de congo de Vitória, Cariacica, Serra e Vila Velha (foto abaixo).
“A ideia foi valorizar o congo e seus mestres com eles atuando como se fossem solistas da Oses”, conta Helder Trefzger, maestro da Oses, que se encantou com as apresentações e a aproximação com as bandas de congo. Ele recordou um momento significante, quando as bandas resolveram fazer apresentação em frente ao Theatro Carlos Gomes, chamando a intenção de publico nas ruas do Centro.
Agora, a partir dessa provocação, a Oses partiu para uma nova etapa dessa aproximação com o folclore capixaba. Dessa vez com o ticumbi de Itaúnas, Conceição da Barra. E o Maestro Helder já fez uma incursão pelo Norte do Estado para assistir as apresentações de ticumbi, alardo, jongo e reis de bois. Um convite do secretário de cultura do Estado, João Gualberto.
“Encantei-me muito em ir às apresentações. Vi diferentes bandas e tentei perceber as diferentes nuances de uma banda para outra, desde o ticumbi até o jongo, que tem uma rítmica muito peculiar e interessante. Para mim foi uma experiência muito rica, ver o alardo foi muito bonito e curioso. Conversei um pouco com as pessoas que assistem e que fazem toda aquela festa, pude também acompanhar a chegada de barco com a imagem de São Benedito, tive contato com o Jonas Balbino e Mestre Terto, um momento fantástico. Enfim, minha experiência foi de total admiração por um universo que até então eu desconhecia e que é uma riqueza do nosso Estado”, detalhou o maestro.
(Foto acerca da chegada do barco com a imagem de São Benedito – Norte do Espírito Santo)
Jonas Balbino, a quem Helder faz referência, é da Associação de Folclore de Conceição da Barra, uma das pessoas que ajuda na organização das festas folclóricas do norte do Estado. Já Mestre Terto é guardião da tradição que rege o Ticumbi, uma figura importantíssima para o folclore do norte. E todos esses contatos continuarão a serem feitos no intuito de 'desvendar' melhor esse universo.
Contudo, é importante frisar que essa aproximação da música clássica do Estado com o folclore não é de todo recente. Trefzger lembra que o músico Maurício de Oliveira já tinha uma proximidade muito forte com a cultura popular; além do maestro Jaceguay Lins. O que é inédito tem sido o projeto de apresentações integradas entre Oses e mestres da cultura no norte.
A proposta da Oses e da Secretaria de Cultura do Estado (Secult) é visitar as outras manifestações de folclore do Estado e, a partir disso, promover apresentações integrando mestres, músicos, o clássico e o folclore, além das encenações tão ricas de alardo e ticumbi. “Estamos na fase de pesquisa, de conhecer e ter os primeiros contatos, mas a ideia é continuar evoluindo nessa aproximação. Temos esse ideal de chegar a fazer alguma apresentação com o jongo, o alardo e o ticumbi. A gente já começa a imaginar que aquilo tudo num palco de um teatro será tão extraordinário quanto nas ruas do interior”, conclui o maestro.
E para Gualberto, que acompanha o folclore do Estado há anos – e a pessoa responsável por instigar Helder Trefzger nessa aproximação – lidar com a cultura popular do interior demanda uma coisa é “pegar com a mão”, como ele explica.
“Do ponto de vista das políticas públicas e da aproximação com esse povo é preciso ir até lá conversar pessoalmente. Não adianta só ter uma política pública administrada à distância, porque essas pessoas estão nas relações presenciais. Não adianta só lançarmos editais e as pessoas se inscreverem, é preciso ir lá conversar e criar relações. Tem muitas questões que você pode ir lá ajudá-los a partir dessa presença, até para entender a realidade de cada um. É preciso estar perto, saber do que eles precisam. Por isso convidei o maestro Helder e estamos juntos nessas incursões”.
A proposta é de que nesses primeiros meses do ano a Oses já consiga promover essas apresentações com os mestres de folclore. Enquanto isso, a próxima apresentação com a cultura popular será na quadra da escola de samba Piedade, uma das primeiras escolas de Vitória e que, de acordo com Trefzger, se mostrou muito receptiva nessa troca musical que ainda não tem data marcada, mas acontecerá em breve.