Na primeira quinzena de junho, o Espírito Santo ganhou um dos primeiros estudos sobre a capoeira do Estado, o livro A Inteligência da Cultura Popular: uma etnografia da capoeira, uma pesquisa de Carlos Henrique Vieira, que também atuava, de forma mais intensa, como mestre de capoeira na época da pesquisa – o autor contou que atualmente está um pouco afastado da arte. A obra se desenvolve em quatro capítulos, sendo três principais que apresentam um apanhado histórico e características das rodas de capoeira, além de uma parte que concentra o discurso de alguns mestres de capoeira do Estado.
De início, principalmente em seus dois primeiros capítulos, o livro mostra-se como um apanhado de teoria, a partir de outras publicações que já lançaram pesquisas sobre culturas populares e capoeira – entre outros temas relacionados. Um livro acadêmico mesmo para quem queira iniciar estudos sobre a capoeira de forma simples.
Dessa forma, para quem quer entender um pouco do caráter histórico, mais resumidamente, A Inteligência da Cultura Popular cumpre com esse papel, apresentando discursos teóricos sobre a origem da capoeira e tratando questões como: a capoeira foi trazida da África ou é uma manifestação originada diretamente no Brasil por meio dos afrodescendentes?; a capoeira é luta, é dança ou é tudo isso junto?; entre outras questões que são bem comuns de se levantar quando se aborda a capoeira. Até então livro não apresenta tanta inovação nessa abordagem.
No segundo capítulo o leitor encontrará uma estrutura mais detalhada de uma roda de capoeira, desde os instrumentos que são tradicionalmente usados até as cantigas de roda – muitas delas estão descritas no livro, acompanhadas das interpretações de suas significações. Nessa parte também é apresentada o jogo dos corpos nas rodas, ou os também chamados “diálogo dos corpos”. É aí que se entende a proposta de ser uma pesquisa sobre a dinâmica da capoeira, seu funcionamento, não necessariamente a capoeira do Estado.
E é no terceiro capítulo que a pesquisa entra em âmbito realmente local, quando alguns grupos de capoeira são apresentados, assim como uma breve exibição da história da capoeira do Espírito Santo, destacada como uma manifestação de escravos trazidos para serem utilizados em lavouras. O capítulo foca, contudo sem muita profundidade, em cinco grupos de capoeira: Grupo Quilombo de Queimados, Grupo Angonal, Grupo Senzala, Grupo Abadá e Grupo Beribazu, do qual o autor faz parte.
A proposta é apresentar a identidade e diferenças de cada um deles – diferenças no sentido de como utilizam suas práticas de capoeira, seja para cultivar a cultura, seja para incrementar projetos sociais, entre outros pontos. Entretanto, a sensação é de que foram poucas páginas para o aprofundamento de tais questões. Os grupos são apresentados mais objetivamente, alguns poucos depoimentos de mestres estão lá e finaliza-se o capítulo na conclusão de que a capoeira na Grande Vitória se caracteriza pela diversidade e visões por vezes bem divergentes dos grupos e seus mestres em relação à prática.
Carlos Henrique optou por instruir alguém a entrevistar esses mestres por meio de perguntas mais diretas e objetivas, talvez o que faz com que a obra se apresente sem tanto aprofundamento em relação a esses depoimentos. Já a escolha das academias de capoeira e os mestres entrevistados se dão pelos seguintes motivos dispostos no livro: tradição, papel de difusão na capoeira e influência sobre os demais grupos.
Em resumo, o livro A Inteligência da Cultura Popular: uma etnografia da capoeira é uma obra que pode ser vista como o início de um profundo trabalho a se desenvolver sobre a capoeira no Estado e seus grupos de atuação. Da realização da pesquisa, por meados do ano de 1991, até então o cenário da capoeira do Estado sofreu algumas modificações, que Carlos Henrique acredita não serem tantas, mas que podem deveras ser mote para um aprofundamento dos estudos sobre a manifestação.
Da realização da pesquisa até o momento atual, alguns mestres entrevistados já morreram, outros estão em outros grupos, como é o caso de Mestre Capixaba, do Grupo A.c.a.p.o.e.i.r.a., além de outras pontuações que mostram-se interessantes para uma nova abordagem – coisa que o autor não descarta, mas também não tem planos tão certos. Uma das estratégias para o aprofundamento da pesquisa seria a liberação do material bruto das entrevistas, além de entrar mais afundo na história da capoeira especificamente no Estado, como destacou também Carlos Henrique.
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