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São mais de 400 km a distância de Rancho Queimado, Alcobaça (BA), onde nasceu Marciel Cordeiro, até a Jalan Jalan, no bairro da Praia do Canto em Vitória, onde lançou Caminho para Texas, seu primeiro livro, publicado pela Editora Cousa. Da Bahia ao Espírito Santo, foi uma viagem não de horas, mas de anos. Uma distância percorrida de forma não-linear, passando e buscando se fixar por São Paulo e Rio de Janeiro, onde Marciel tentou uma carreira como jogador de futebol, da qual desistiu aos 21 anos de idade.
No interior da Bahia, conta, é comum que ao completar 18 anos os jovens saiam de casa para buscar trabalho em outros estados ou cidades maiores. Nascido no campo, onde trabalhava na agricultura, na cidade também foi ajudante de pedreiro e embalador de alho. Depois de tanto andar, acabou se estabelecendo no Espírito Santo desde 2015. “O Espírito Santo me abraçou, eu também abracei ele e me deu várias coisas que eu nem pensava”, conta. Trabalhou numa terceirizada da antiga CST, fez Enem, e agora cursa faculdade de Serviço Social.
Encontrou aqui também o movimento hip hop de forma mais efetiva. O rap serviu de inspiração para escrever. Tentou fazer música mas se encontrou nos contos, depois de ter acesso a escritores como Lima Barreto, Charles Bukowski e Pedro Juan Gutiérrez. “Esses caras me deram uma vontade do caralho de escrever sobre as coisas que estão aí, as vivências no mundo, coisas que aconteceram ou poderiam ter acontecido”, conta o jovem escritor. Sua estreia literária foi com o zine Cirrose Hepática, lançado em 2017 com o nobre objetivo de ajudar a financiar sua ida a um encontro estudantil no Rio de Janeiro.
Mas o gosto da escrita vem de muito antes, de sua mãe, que apesar de ter estudado apenas até a quarta série, lia histórias para ele e seus irmãos na infância. Depois vieram os livros de História e Geografia na escola, até chegar o hip hop, os escritores contistas e outras influências ao longo de seus 27 anos de idade.
Todo esse preâmbulo é para nos conduzir de volta ao livro “Caminho para Texas”, que reúne 33 contos curtos, que embora ficcionais trazem muito das vivências e caminhos de Marciel. A Bahia é o ponto de partida de muitas histórias, que também passam pelo Espírito Santo, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Em comum, os personagens trazem o fato de estarem sempre em movimento, buscando algo, viajando, mudando de cidade. O título do livro é o mesmo de um dos contos, que fala sobre um pistoleiro que após cometer um crime segue para a cidade de Teixeira de Freitas, conhecida popularmente também como Texas.
Na linguagem, Marciel traz a informalidade e a fala coloquial dos personagens populares, numa “cartografia cultural das microrrelações do Brasil contemporâneo – ou, pelo menos, d’uma pequena parte do país”, como diz Rafael dos Prazeres, que assina o prefácio da obra. A estética do submundo é presente assim como questões políticas e uma sexualidade bastante pujante nesses corpos em trânsito permanente, tudo permeado por um humor ácido, que aparece com frequência.
Pergunto a Marciel Cordeiro se ele se considera um escritor marginal. “Não, creio que não. Sou escritor e apenas. Parafraseando Lima Barreto”.