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‘A educação do município de São Mateus está adoecida’

Vereadora Valdirene cobra pagamento do piso e melhores condições para professores

O descumprimento do piso nacional do magistério por diversas prefeituras capixabas, somado a condições de trabalho precárias, tem levado a um crescente adoecimento da categoria. O alerta foi feito pela vereadora de São Mateus (norte do Estado), Professora Valdirene (PT), na última semana na Câmara Municipal, ao se posicionar sobre a morte de um professor de educação física, conhecido como Brauna, que enfrentava um quadro de depressão. Segundo ela, este é apenas um dos muitos casos de profissionais da educação afetados por condições de trabalho insustentáveis. 

Atualmente, o salário inicial pago aos professores em São Mateus é de R$ 2.403,52 para uma jornada de 25 horas semanais. No entanto, considerando a conversão do piso nacional de 2025 para essa carga horária, o valor deveria ser de R$ 3.042,35. A gestão municipal é liderada por Marcus da Cozivip (Podemos), eleito no ano passado.

Valdirene denuncia ainda que, no caso dos professores contratados em regime de Designação Temporária (DTs), a prefeitura apenas considera o valor estipulado para graduação, não pagando adicionais por especialização ou pós-graduação. Além disso, o município também deveria garantir um terço da jornada para planejamento, conforme estabelecido pela Lei 11.738 de 2008, que regulamenta o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério, o que também não acontece.

“A educação do município de São Mateus está adoecida. É difícil, hoje, não termos um colega que não toma um medicamento controlado. Parece absurdo, né? Mas as condições em que estamos nos nossos setores de trabalho são insuportáveis. Se eu contar colegas que tiveram suicídio comprovado, por exemplo, eu presenciei dois”, desabafou.  

Divulgação

A vereadora criticou a falta de medidas concretas por parte da prefeitura, que ignora as demandas por melhores salários, estrutura e cuidados com a saúde dos funcionários. “Quando pedimos melhorias salariais ou entramos em greve por melhores condições, ainda somos criticados”, enfatiza Valdirene. Ela também destacou a falta de exames periódicos para os professores da rede municipal, um direito básico que não vem sendo cumprido.

O advogado Amarildo Santos, que tem acompanhado a situação, revelou que o descumprimento do piso salarial é uma prática comum no Espírito Santo. Segundo ele, são mais de 20 prefeituras que descumprem a lei federal, incluindo Vila Velha, Vitória e Cariacica, na região metropolitana; Linhares, São Mateus, Mantenópolis, Marilândia e São Roque, no norte do Estado; e Cachoeiro de Itapemirim e Vargem Alta, no sul do Estado.  

“A lei determina que o piso salarial incida sobre o vencimento básico. No entanto, muitos municípios incluem adicionais, como gratificações por qualificação, no valor total do contracheque para mascarar o cumprimento da norma. Isso significa que um professor que deveria receber o piso de R$ 4.867,77, pode acabar recebendo menos, pois seu adicional de pós-graduação, por exemplo, está sendo incorporado ao valor básico”, explicou. 

O Tribunal de Contas do Espírito Santo (TC-ES) emitiu um parecer que reforça a necessidade de aplicação correta do piso salarial nacional aos professores da rede pública em agosto de 2024. Na decisão, resultado de um Incidente de Prejulgado, os conselheiros determinaram que o piso deve ser aplicado ao vencimento inicial da carreira, excluindo adicionais e gratificações, e que o não cumprimento dessa norma pode levar a sanções para os gestores públicos. 

Amarildo destacou a dificuldade de acesso às informações sobre os planos de cargos e salários, muitas vezes “errados”, o que dificulta a fiscalização e a correção dos valores pagos aos professores. Outro problema é a demora na aplicação dos reajustes salariais. “A mudança do valor do piso ocorre em janeiro, mas muitos municípios só pagam o reajuste em junho, mantendo os professores com salários defasados”, denunciou. 

A União destina recursos complementares aos municípios para ajudar no pagamento do piso, por meio do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). No entanto, muitos gestores sequer realizam os trâmites necessários para comprovar a necessidade do repasse federal, agravando ainda mais a crise salarial na educação, critica o advogado.

Em janeiro de 2025, o Ministério da Educação (MEC) reajustou em 6,27% o Piso Salarial Profissional Nacional do magistério, fixando o valor em R$ 4.867,77 para jornada de 40 horas semanais. O reajuste é previsto por lei e deve ser garantido pelos municípios com base nos recursos do Fundeb e nas complementações da União. Diante da inércia dos gestores municipais, muitos professores recorrem à justiça para garantir seus direitos. “Infelizmente, a única solução tem sido a judicialização, pois os municípios não cumprem a lei espontaneamente”, concluiu Amarildo.

Decisão judicial

Em outubro de 2024, o município de Vila Velha foi condenado a pagar a diferença entre o valor recebido pelos professores e o determinado na legislação para os anos de 2021, 2022 e 2023. A juíza Amanda Lourenço Sessa enfatizou que a análise das fichas financeiras comprovou que a remuneração dos professores da rede municipal era inferior ao que prevê anualmente a Lei nº 11.738/08. “É evidente que o município deve realizar o pagamento das diferenças apuradas, em obediência até mesmo ao princípio da legalidade”, apontou, determinando que a diferença entre o valor recebido e o correto, deveria ser paga acrescida de juros.

O professor Murilo Gabrieli, um dos requerentes da ação, afirma que a Prefeitura de Vila Velha pagou os professores abaixo do piso nacional por muitos anos, gerando crescente insatisfação. “Entendo que o pagamento do piso traz dignidade financeira ao professor da rede básica de ensino. Nenhum cidadão gosta de ter seus direitos cerceados, e acredito que uma profissão que está diretamente ligada ao futuro precisa ter seus direitos resguardados e se sentir valorizado”, ressaltou. 



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